Entrevista:O Estado inteligente

sábado, junho 17, 2006

Novos capítulos Por José Alan Dias

PRIMEIRA LEITURA

Nem faria falta o comentário do consultor Marcelo Gomes, da Alvarez & Marsal,
de que a Varig precisa da liberação de US$ 75 milhões referentes à primeira
parcela do pagamento da compra da companhia aérea pelo TGV (Trabalhadores
do Grupo Varig). Os sucessivos cancelamentos de vôos desde o início da semana
e a contagem regressiva do novo prazo de proteção judicial contra arresto
de aeronaves concedida pela Justiça norte-americana ? que se esgota na quarta-feira
que vem ? mostram que, se o juiz Luiz Roberto Ayoub, da 8ª Vara Empresarial
do Rio, o TGV e os declarados novos investidores não se entenderem, nem será
necessário que o magistrado gaste tinta de caneta para assinar (a contragosto,
diga-se) a falência da empresa: ela deixará de voar antes.

Suponhamos que se feche um acordo com os novos investidores, liderados pelo
ex-presidente da VarigLog, José Carlos da Rocha Lima, hoje dono da Syn, empresa
especializada em transportar produtos entre a Amazônia e o Sudeste, mas por
via terrestre, ou com outros investidores. O executivo, aliás, prestou depoimento,
no fim do ano passado, à CPI dos Correios, defendendo-se de acusações de
ter recebido R$ 50 mil, em 2002, da Skymaster (empresa suspeita de ter sido
beneficiada em licitação da ECT). Voltando à Varig: os novos investidores
terão de provar que têm condições de capitalizar a Varig e transformá-la
em uma companhia rentável, porque, afinal de contas, a empresa carrega um
passivo monstruoso, que um dia terá de ser pago ? isso, claro, se a Varig
continuar operando.

Desde o início do processo, estava claro que o TGV, um entre os vários grupos
de empregados da Varig, não tinha potencial financeiro para assumir uma responsabilidade
desse tipo. Daí sua busca frenética por novos investidores. Ainda que continue
a operar, restarão dúvidas se, por exemplo, o Carlyle, o bilionário administrador
de private equity dos EUA, estaria disposto a ser esse capitalizador da Varig.

No meio desta semana, o DAC (Departamento de Aviação Civil) divulgou as estatísticas
sobre o transporte de passageiros no mês de maio. O volume de passageiros
transportados cresceu 24,3% em relação a maio do ano passado. Entre as três
majors, a Gol teve expansão de 53% na comparação anual, de volume de passageiros.
A TAM, mesmo sendo uma empresa consolidada, transportou 33% a mais de passageiros.
Em contrapartida, a Varig transportou 32,6% menos passageiros. Não é muito
diferente a situação no mercado externo, uma área que até poucos anos atrás
parecia reserva de mercado da Varig e representava seus vôos mais rentáveis:
mês a mês perde passageiros e, se não tiver dinheiro para pagar empresas
de leasing, pode encontrar o golpe derradeiro se a Justiça dos EUA permitir
o arresto de sete aeronaves da Boeing usadas em rotas internacionais.

Como não está à altura nem de preparar um razoável plano de contingência
para o caso de a companhia deixar de voar, o governo trata, silenciosamente,
de evitar que Infraero e BR Distribuidora pressionem a Varig pelo pagamento
de dívidas. Enquanto isso, nos bastidores estimula uma saída negociada para
a empresa, porque não quer ter de assumir um passivo político de 9.800 desempregados,
apenas do grupo Varig, às vésperas de uma eleição presidencial ? esqueçamos,
por enquanto, os mais de R$ 7 bilhões de dívidas da empresa. É até possível
que o TGV, com os novos investidores, encontre uma forma de manter a Varig
voando. Essa é a parte fácil da história. O difícil será provar que a Varig
ainda é viável. E, claro, convencer os milhares de passageiros que ficaram
em terra nos últimos dias a voltar a comprar um bilhete da companhia.

[alan@primeiraleitura.com.br]
Publicado em 15 de junho de 2006.

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