O Irã anuncia que já começou a enriquecer urânio, a matéria-prima das armas nucleares. O que os Estados Unidos vão fazer agora? Ruth Costas Raheb Homavandi/Reuters | Processamento de urânio em usina iraniana, e, abaixo, à esquerda, George W. Bush e o apocalíptico Ahmadinejad, presidente do Irã: "Quem estiver com raiva, que morra de raiva", diz Ahmadinejad | Mandel Ngawa/AFP | Reuters | A queda-de-braço entre os Estados Unidos e o Irã está chegando a um ponto assustadoramente semelhante àquele que precedeu a invasão do Iraque, em 2003. O presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, contrariando um ultimato do Conselho de Segurança das Nações Unidas, insiste em avançar em um programa nuclear com fins obscuros e mantê-lo longe dos olhos dos inspetores internacionais. Já o governo de George W. Bush vê minguar suas tentativas diplomáticas de fazer o Irã colaborar e, ao menos nos corredores da Casa Branca e do Pentágono, já começa a discutir seriamente a possibilidade de uma ação militar. Na semana passada, o presidente iraniano fez um anúncio que deixa a situação ainda mais tensa: o Irã conseguiu enriquecer urânio pela primeira vez, em sua usina de Natanz, entrando para o clube dos países que dominam uma tecnologia essencial tanto para gerar energia nuclear quanto para construir bombas atômicas. Nos próximos anos, os iranianos planejam aumentar o número de centrífugas do país de 164 para 54.000, dando início à produção de combustível nuclear em escala industrial. O urânio iraniano foi enriquecido a 3,5%, potência suficiente para alimentar apenas usinas elétricas, muito abaixo dos 90% necessários para fabricar armas atômicas. Há poucos motivos para acreditar que o Irã ficará nisso. O país escondeu suas pesquisas nucleares por duas décadas, comprou secretamente tecnologia nuclear do cientista que criou a bomba atômica do Paquistão e hoje colabora com a Coréia do Norte no desenvolvimento de mísseis para carregar ogivas nucleares. Não seria tão grave se o país não fosse governado por uma claque de fanáticos religiosos – o presidente Ahmadinejad é conhecido como "o maluco do apocalipse". Por essas e outras, o Irã não hesitará em montar sua bomba atômica – e isso pode ocorrer dentro de pouco mais de quatro anos. A constatação de que os aiatolás estão mais perto de ter armas nucleares atingiu Washington como um míssil teleguiado. Hoje, as pretensões nucleares da república islâmica são a principal preocupação da política externa do governo americano. A pergunta é: o que os Estados Unidos podem fazer para impedir que isso aconteça? Por várias fontes, o que circulou na semana passada foi que o Pentágono já formulou planos de um ataque aéreo às usinas iranianas. A reportagem mais contundente, escrita pelo repórter Seymour Hersh – o mesmo que denunciou a tortura de presos iraquianos na prisão de Abu Ghraib –, afirma que estão de tal forma avançados que já há militares americanos infiltrados no Irã para fazer contato com grupos dissidentes e reunir informações sobre os possíveis alvos de um bombardeio. A estratégia para destruir as instalações iranianas incluiria o uso de armas nucleares táticas – bombas com potência muito inferior à dos artefatos que destruíram Hiroshima e Nagasaki na II Guerra. Há uma grande diferença entre elaborar planos militares e iniciar uma guerra. "É natural que o governo americano pense em todas as possibilidades e se prepare para o pior, mas isso não quer dizer que um ataque ao Irã seja iminente", disse a VEJA a cientista política iraniana Sanam Vakil, da Universidade Johns Hopkins, em Washington. O americano Barry Posen, especialista em segurança do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), nos Estados Unidos, enumera três razões que inviabilizam uma ofensiva militar no Irã. A primeira é que uma guerra contra os iranianos seria ainda mais complexa e dispendiosa que o conflito iraquiano. O Irã tem um território quatro vezes maior que o do Iraque e nos últimos anos conseguiu incrementar seu arsenal militar. Já Saddam Hussein estava enfraquecido por um bloqueio comercial. Além disso, as ligações de Teerã com grupos xiitas que hoje dominam o governo no Iraque poderiam obrigar os americanos a travar uma guerra em duas frentes. A segunda razão é o fato de o Irã ser o quarto maior produtor de petróleo do planeta, o que representa quase um décimo das reservas globais. Desorganizar as exportações do país levaria os preços do petróleo a um patamar insustentável. A terceira e última razão é a falta de apoio da opinião pública americana. Se em 2003 a comoção causada pelos atentados de 11 de setembro garantia a adesão a uma campanha militar, hoje quase 60% dos americanos reprovam a permanência de tropas no Oriente Médio. Por enquanto, o caso iraniano está em discussão no Conselho de Segurança da ONU. Os Estados Unidos tentarão aprovar sanções econômicas e diplomáticas contra os iranianos. Devem, no entanto, enfrentar a resistência da Rússia e da China, dois membros do conselho que mantêm estreitas relações comerciais com o Irã. Esgotada essa última alternativa, ainda assim a probabilidade de um novo conflito no Oriente Médio será menor que há três anos. Estará mais perto, infelizmente, o dia em que o "maluco do apocalipse" terá a bomba. | | |