Entrevista:O Estado inteligente

sábado, abril 29, 2006

José Mentor se enrola em mais uma acusação

VEJA
Escapará ele de mais essa?

Mensaleiro absolvido, o petista Mentor
é acusado de negociar por 300 000 reais
texto do relatório de CPI


Camila Pereira

Roosewelt Pinheiro/ABR
Mentor bem que tenta escapar, mas as denúncias o perseguem


Das duas uma: ou o deputado José Mentor (PT-SP) é o perseguido preferencial de nove entre dez acusadores surgidos no cenário político recente (e, nesse caso, todos os delitos que lhe são imputados não passam de calúnia) ou tem-se saído muito bem nas tentativas de driblar a lei (hipótese em que passa a ser um caso exemplar de corrupto impune). Breve retrospectiva: no ano passado, o deputado foi acusado de ter sido o operador do "mensalinho" que a gestão de Marta Suplicy é suspeita de ter distribuído a vereadores de São Paulo em troca de apoio a projetos da prefeitura. A investigação, a cargo do Ministério Público Estadual, continua em curso. Também em 2005, quando veio a público o escândalo do mensalão, o nome de Mentor surgiu, reluzente, na lista dos políticos beneficiados pelo valerioduto. Processado pelo Conselho de Ética da Câmara, foi absolvido em plenário há duas semanas. Na semana passada, outra denúncia desabou sobre o petista: Mentor foi formalmente acusado de ter recebido suborno para beneficiar envolvidos nas investigações da tristemente famosa CPI do Banestado, da qual foi relator entre 2003 e 2004 (veja o quadro). Em depoimento ao Ministério Público Estadual de São Paulo, o doleiro Richard van Otterloo afirmou ter pago 300.000 reais ao petista para não ter seu nome mencionado no relatório final da comissão.

As revelações de Otterloo foram feitas ao promotor Silvio Marques e ao procurador da República Rodrigo de Grandis, responsáveis pelas investigações das contas mantidas no exterior pelo ex-prefeito Paulo Maluf e seu filho, Flávio. Otterloo trabalhou para os Maluf por pelo menos seis anos. Por meio do doleiro Vivaldo Alves, ele recebia dinheiro da conta Chanani (atribuída ao ex-prefeito, em Nova York) em duas contas próprias, a Jazz e a Campari, também em Nova York. Em seguida, repassava o dinheiro aos Maluf no Brasil ("em espécie e acondicionado em malotes", conforme afirmou em depoimento). Quando, no fim de 2003, as relações entre Maluf e a conta Campari vieram a público, Otterloo preocupou-se com a possibilidade de ter sua participação no esquema investigada pela CPI. Decidiu, então, aceitar a sugestão que, segundo contou ao MP, partiu de Flávio Maluf: a de que procurasse uma determinada pessoa, ligada ao deputado Mentor, que poderia intermediar uma "negociação" para excluí-lo do relatório final da CPI. O Ministério Público deverá ouvir em breve essa pessoa. Otterloo diz ter entregado ao intermediário de Mentor 300.000 reais em dinheiro. Em troca, recebeu o disquete com o relatório final da CPI dias antes de o documento ser divulgado – para ter certeza de que seu nome não estava lá. Os Maluf também foram poupados no relatório de Mentor. O deputado-relator alegou falta de tempo para analisar os documentos relativos à família.

 

João Sal/Folha Imagem
Marta Suplicy (com o marido, Luiz Favre): Mentor era seu homem de confiança

Mentor ganhou a relatoria da CPI do Banestado graças ao ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, de quem sempre foi próximo. A indicação era uma forma de o Planalto controlar a comissão, depois de tentativas frustradas de sufocá-la. Antes de eleger-se deputado federal, Mentor era o homem de confiança da ex-prefeita de São Paulo Marta Suplicy. Como líder de seu governo na Câmara, atraiu desde o PMDB até malufistas históricos para a base da prefeita. Durante o tempo em que permaneceu no cargo, Marta conseguiu maioria para aprovar tudo o que quis. Em julho do ano passado, o ex-tesoureiro do PPS Evaldo Rui Vicentini, em depoimento ao MP, acusou Mentor de ser o "homem da mala" no esquema do mensalinho municipal da petista. A existência do esquema havia sido revelada por VEJA dois meses antes. Mentor, é claro, nega ter participado da compra de vereadores em São Paulo, assim como nega ter sido agraciado com dinheiro do valerioduto. Na semana passada, negou também, é lógico, ter negociado a exclusão de nomes do texto da CPI. Mensalinho, mensalão, compra de votos, venda de relatório: é espantoso como a corrupção teima em perseguir Mentor.

 

A CPI DA DISCÓRDIA

Allan Marques/Folha Imagem
O senador Antero (sentado): o PT queria usar CPI contra inimigos

Criada a partir de uma operação da Polícia Federal, que investigou remessas ilegais de dinheiro para o exterior por meio do Banco do Estado do Paraná (Banestado), a CPI do Banestado tinha por objetivo investigar a evasão de divisas do Brasil para paraísos fiscais. As brigas entre o seu presidente, o senador Antero Paes de Barros (PSDB), e o relator, o deputado José Mentor (PT), no entanto, praticamente inviabilizaram as investigações. Durante o período em que a comissão funcionou, de junho de 2003 a dezembro de 2004, Paes de Barros e Mentor acusaram-se mutuamente de usar a CPI para destruir a reputação de adversários. O volume recorde de documentos solicitados – mais de 1 000 quebras de sigilo bancário e fiscal, de pessoas muitas vezes sem relação direta com as investigações – suscitou desconfianças. A oposição acusou Mentor de, a mando do ex-ministro José Dirceu, tentar formar um banco de dados para ser usado contra inimigos do governo. As sessões tumultuadas não permitiram sequer que todos os documentos solicitados fossem analisados. Ao final, nenhum dos dois relatórios produzidos – o oficial, de Mentor, e o paralelo, de Paes de Barros – foi votado. Para evitar que o trabalho dos parlamentares fosse para o lixo, Paes de Barros juntou as quarenta caixas de documentos reunidos pela CPI e enviou-as ao Ministério Público Federal, que já tinha uma investigação em curso. Até agora, a investigação do MP gerou, só no Paraná, a denúncia de mais de 400 pessoas envolvidas em crime de evasão de divisas relacionadas ao Banestado e a condenação de vinte delas à prisão.

Renato Piccinin


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