Entrevista:O Estado inteligente

sábado, abril 29, 2006

Miriam Leitão Maioria mexicana

O GLOBO


   paneco@oglobo.com.br



As eleições no México estão indefinidas. Por mais de um ano, o candidato da esquerda, Andrés Manuel López Obrador, esteve isolado na frente. Agora, há dois meses da eleição de 2 de julho, o candidato do partido do presidente Fox, Felipe Calderón, passou à frente. Segundo analistas mexicanos, a mudança se deve a alguns erros de Obrador e uma campanha mais agressiva de Calderón. Esta semana, a ausência do candidato de esquerda num debate acabou reforçando a mudança do quadro.

López Obrador disse o tempo todo que não participaria de debates na televisão. Em cima da hora, voltou a ser convidado, mas manteve a negativa. Decidiu também não aparecer em qualquer ato empresarial. Convidado para a convenção dos bancos, disse que não iria porque os banqueiros são "ladrões" do povo. Não assinou a lista de compromissos proposta pelos empresários. O que se pedia era mais ou menos o que estava na Carta aos Brasileiros assinada por Lula em 2002: disciplina fiscal, respeito aos contratos e investimentos em áreas básicas, como educação.

López Obrador, ou simplesmente AMLO, com seu marketing, acabou cultivando a imagem de radical. Como prefeito da capital mexicana, entendeu-se perfeitamente com o empresariado. Mas ele cometeu o erro de atacar diretamente o presidente Fox, que tem alta popularidade. Os mexicanos acharam o tom ofensivo. AMLO disse mais ou menos assim: "Cala a boca, seu babaca." Como o insulto coincidiu com o ataque de Hugo Chávez a Fox, ele teve um ônus dobrado.

Fox tentou fazer candidato o chefe da Casa Civil, Santiago Creel. A candidatura morreu antes de nascer. Foi quando Felipe Calderón se lançou candidato, desafiando Fox. Calderón é de uma ala nova, muito querido do partido e mais moderno que a média do PAN: ainda bastante dominado por famílias tradicionais e um pensamento meio carola. No início, ele se aproximou muito da direita do partido e não deslanchou, mas recentemente passou a fazer uma campanha mais agressiva contra López Obrador. Segundo um analista, "agressiva demais e perigosa". A estratégia de acusação ideológica e pessoal a AMLO pode acabar trazendo problemas de governabilidade ao México, se Calderón ganhar. Nenhum partido fará maioria e o novo presidente precisará construir uma aliança.

O que tem de interessante nesta eleição é que Roberto Madrazo, do PRI, partido que governou o México por 71 anos, está amargando um decepcionante terceiro lugar. Porém, como o partido tem o voto garantido de pelo menos 25% dos eleitores, não está descartada a hipótese de que o PRI, mesmo perdendo a corrida presidencial, faça a maior bancada. Como não há segundo turno que incentive a construção de alianças, o país pode ter dificuldade de governabilidade. De qualquer forma, no debate desta semana, enquanto Madrazo atacava Calderón, este parecia tentar um discurso de boa vizinhança com os candidatos com menos votos.

A popularidade de Fox advém de alguns bons resultados econômicos; emprego crescendo, inflação baixa e um vasto programa social parecido com o do Bolsa Família que, segundo o Banco Mundial, tirou da pobreza oito milhões de mexicanos. Fox, no entanto, perdeu o apoio dos formadores de opinião.

No debate na TV esta semana, as discussões se centraram em cinco temas: política econômica, política energética (o México é grande produtor de petróleo e está com problemas nesta área), emprego, combate à pobreza e desenvolvimento sustentável. A questão da emigração permeou alguns dos temas. O Nafta não foi um ponto discutido simplesmente porque ele hoje é aceito por todos, apenas com algumas diferenças nos detalhes.

Apesar de hostilizar o mercado em suas declarações, AMLO mandou recentemente a Nova York, para falar com banqueiros, Rogélio Ramirez de la O, que formulou seu programa econômico. Ao falar do Nafta, o economista disse que a principal promessa do acordo era criar empregos com alto valor agregado. O que, segundo ele, não aconteceu. Por isso disse que, se eleito, López Obrador vai discutir com os Estados Unidos incentivos a empregos de qualidade no país. Uma mudança fundamental, notada pelos bancos que o ouviram em Nova York: De la O disse que Obrador respeitará a independência do Banco Central. Anos atrás, este era o alvo principal das críticas do candidato. De la O também admitiu que AMLO passou a se encontrar com os empresários, mas ele quer chegar ao poder sem compromissos com os homens de negócios.

A eleição ainda está bastante indefinida, mas López Obrador tem perdido força. O decisivo no México não é quem vai ganhar a eleição, mas como vai construir a maioria estável para governar. Um dilema que nos aflige também.

O GOVERNADOR Aécio Neves comemorou ontem o fechamento do primeiro empréstimo do Banco Mundial sem contrapartida. O Bird só empresta se o tomador coloca também o mesmo valor no projeto. Com Minas, aceitou como contrapartida os avanços na gestão pública.

O PRESIDENTE Nestor Kirchner não aceita aumento de tarifa pública. Isso descapitalizou as empresas privatizadas e elas não podem investir. Agora aprovou uma lei aumentando os impostos sobre as tarifas. Para o consumidor dá na mesma; ele vai pagar mais, mas o governo usará o dinheiro para investir nos serviços públicos e o Estado ficar dono do investimento. É a América do Sul em marcha batida para o passado.

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