- EDITORIAL OESP
Pelo menos três ambiciosos objetivos motivaram o II Fórum Social Brasileiro (FSB), realizado no Recife, do qual participaram cerca de 300 "movimentos sociais", liderados pelo principal deles, o Movimento dos Sem-Terra (MST). O primeiro foi o de aumentar substancialmente o número de militantes emessetistas, que hoje ainda é "pequeno", não chegando a "1 milhão de agricultores sem-terra no País", segundo seu líder em Pernambuco, Jaime Amorim. Aí a modéstia de Amorim talvez se deva ao critério de qualificação dos militantes, pois, com certeza, o número de participantes de invasões, acampamentos e múltiplos esbulhos praticados sob a bandeira do MST é algumas vezes maior do que o daqueles que têm alguma noção de trabalho na terra. De qualquer forma, ao pensar na não pouca ousada meta de arregimentar 17 milhões para seu movimento - com base em estatísticas do IBGE, que indicam 18 milhões de sem-terra e 60 milhões "que passam fome e necessidade" -, Amorim dá uma amostra de suas ambições a longo prazo. Os métodos com que pretende chegar lá, no entanto, é que parecem curiosos. Senão, vejamos os outros objetivos.
Os movimentos que participam do FSB recifense esperam obter do presidente e candidato a presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, um compromisso de fidelidade e confiança, semelhante ao que Lula e seus adeptos firmaram, para acalmar o setor empresarial - e, especialmente, o mercado financeiro -, durante sua campanha eleitoral de 2002. "A Carta ao Povo Brasileiro foi para acalmar o mercado, agora o governo deve acalmar os movimentos sociais" - resumiu Antonio Carlos Spis, da direção nacional da Central Única dos Trabalhadores (CUT). Além de exigir esse compromisso do presidente/candidato e respectivo partido, com os quais sempre estiveram alinhados - embora não se possa dizer que sempre os tenham eleitoralmente ajudado, com seu sistemático desrespeito às leis e á ordem pública do País - , os movimentos que se autodenominam sociais agora se propõem a uma efetiva participação eleitoral - e este seria o terceiro objetivo.
Ao contrário da última eleição, em que estiveram afastados do debate eleitoral, neste ano os movimentos sociais irão para as ruas dispostos a conseguir mais do que programas assistencialistas, num reforço à tese de que eleição deve ser conjugada com mobilização popular, sob o risco de não se conseguir transformações sociais. Há de se duvidar, entretanto, da eficiência "eleitoral" dos métodos que o MST e assemelhados pretendem utilizar para arregimentar apoios e obter votos para a reeleição do presidente Lula, a julgar pelo emblemático discurso, pronunciado na plenária do FSB, pelo coordenador nacional do MST em Pernambuco, Jaime Amorim, para quem "não haverá trégua" na luta contra o agronegócio e pela reforma agrária, nos seguintes termos: "Vamos garantir que nenhum latifundiário fique em paz. Ele pode estar na sua casa de praia, mas não vai dormir sossegado, sempre ligando para o caseiro para ver se o cadeado da porteira ainda não foi quebrado."
É assim que pretendem que o povo seja acalmado! Na verdade, se há uma coerência que os movimentos dos sem-terra e respectivos agregados têm mantido desde o início de sua organização é o que chamaríamos de fidelidade à violência, mesmo que, às vezes, esta se camufle com disfarces que, de tão óbvios, mais parecem a expressão de intencional deboche. Foi o caso, por exemplo, do ato de distribuição de rosas, soltura de 10 pombas ao som de cânticos pela paz - na manhã de quinta-feira, no centro do Recife - quando emessetistas entregaram, a um grupo de deputados e representantes dos direitos humanos, a pistola do capitão Dimerson Mendes, da Polícia Militar pernambucana, que tinha sido espancado e despojado de sua arma durante o conflito entre policiais e militantes, ocorrido por ocasião da marcha de encerramento do II Fórum Social Brasileiro - em que uma bala atingiu de raspão o dedo polegar de Amorim.
Será que tais encenações pacifistas, de cânticos, rosas e pombas, haverão de ter mais peso eleitoral do que os propostos cadeados quebrados?
Eis mais um problema sobre o qual os candidatos à Presidência da República, inclusive o que busca a reeleição, precisam se definir