Além de impróprios, presentes como
as roupas oferecidas a Lúcia Alckmin
voltam para assombrar os presenteados
Sandra Brasil
Foto arquivo pessoal |
Figueiredo, com o casal Alckmin: ela usa modelo dele |
Bonita e excepcionalmente conservada para seus 54 anos, Maria Lúcia Alckmin passou os dois mandatos do marido, Geraldo Alckmin, do PSDB de São Paulo, envolvida pelo clima provincianamente bajulatório que em geral cerca as esposas de prefeitos ou governadores. Ora era elogiada pelo trabalho social, ora pelo guarda-roupa variado. Projetada ao cenário nacional, na esteira da candidatura presidencial do marido, constatou que o crivo é mais rigoroso. E começou escorregando diante da revelação, feita pelo jornal Folha de S. Paulo, de que uma parte considerável do elogiado guarda-roupa foi recebida a custo zero. Entre 2001 e 2003, o estilista Rogério Figueiredo contabiliza ter confeccionado para ela 200 modelos completos, o que, nas suas contas, dá umas 400 peças no total. Lúcia negou a quantidade, mas não o fato em si. "É mentira que tenha recebido 400 vestidos ou 400 peças de roupa. A afirmação é falsa, absurda, descabida", disse ela a VEJA. "Todos os objetos enviados como presentes – a maioria sem anuência ou conhecimento prévio –, usados ou não, foram doados a entidades assistenciais."
Aceitar roupas de graça é uma tentação que já fisgou muitas mulheres de governantes, escudadas na alegação de que precisam de figurinos variados para compromissos oficiais, mas não recebem verba para isso. Nada elimina o fato de que esse comportamento soa impróprio. Também carece de lógica a desculpa de que as roupas foram doadas: tudo o que é aceito conta como benesse. Pior ainda o fato de que a única doação comprovada – dez vestidos de festa à Fraternidade Irmã Clara – chegou à instituição dois dias depois que a notícia original foi publicada. Figueiredo, que começou como desenhista de vestidos de noiva e bordador, ficou conhecido como "o estilista da primeira-dama" e ganhou projeção. No ano passado, com uma sócia, abriu um ateliê chique em São Paulo. A relação mutuamente benéfica teve início quando foram apresentados numa festa. Dona Lu fez então uma encomenda. "Pouco depois, uma assessora me procurou para dizer que dona Lu não teria condições de pagar pela peça. Eu falei que não precisava. Sabia quanto seria importante vestir uma primeira-dama", diz Figueiredo. Afastaram-se porque, segundo ele, Lúcia passou a preferir a butique de luxo Daslu, onde trabalhava sua filha Sophia. Além de perder a cliente, seus brios profissionais saíram feridos: "Fiquei chateado quando ela mandou roupas de grifes estrangeiras para eu ajustar, como se fosse um costureiro de bairro".
A Comissão de Ética da Presidência da República fixou em 100 reais o valor permitido para brindes a funcionários públicos federais. O advogado Diamantino Silva Filho, especialista em direito público, observa que Lúcia, não sendo uma, não cometeu ilegalidade ao aceitar as roupas. Mas o custo político, debitado na conta do candidato tucano, comprova que nessa esfera não existe presente que saia de graça.