Os constituintes de 87, entre os serviços bem-feitos ao descontaminar a Carta das heranças do autoritarismo, deram poderes ao Ministério Público para defender a sociedade e a ordem jurídica, imune às pressões dos governantes. A denúncia encaminhada ao Supremo pelo procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza, contra os mensaleiros e sócios do esquema espúrio montado pela cúpula do PT e o financista, traficante de interesses e publicitário mineiro Marcos Valério é, desde a promulgação da Constituição, em 1988, uma das maiores demonstrações do acerto do trabalho dos constituintes.
Apesar dos excessos volta e meia cometidos por promotores e procuradores, a denúncia despachada na terça-feira para o ministro do STF Joaquim Barbosa contra 40 pessoas justifica, por si só, a existência do Ministério Público.
Os poderes do MP permitiram que, mesmo nomeado pelo presidente Lula, fundador do PT, o procurador-geral assinasse um parecer avassalador para a cúpula petista associada a Marcos Valério e às legendas que tiveram parlamentares cooptados em troca dos cifrões distribuídos de forma generosa pelo valerioduto. A denúncia confirma a linha do relatório final da CPI dos Correios — e avança, por se tratar de uma peça com valor jurídico. Não é mais possível tentar explicar as passagens mais cáusticas do relatório da CPI contra petistas e aliados como manobras oposicionistas e eleitoreiras.
Agora, é o Ministério Público que pede a punição de José Dirceu — tratado de chefe de uma “organização criminosa” — José Genoino, Delúbio Soares e Sílvio Pereira por corrupção ativa e formação de quadrilha, crimes de que Marcos Valério também é acusado. Das personalidades petistas, o único arrolado a continuar no governo é Luiz Gushiken, enquadrado por peculato.
O procurador-geral da República redime, ainda, a opinião pública, desprezada por congressistas, ao não deixar escapar aqueles cujo mandato foi salvo no plenário da Câmara pelo compadrio e o fisiologismo. João Paulo Cunha, por exemplo. Nem os que se valeram da renúncia esperta para fugir do julgamento político. Caso de Valdemar Costa Neto, do PL. As 136 páginas da denúncia do MP garantem de vez ao mensalão um lugar de destaque na galeria dos escândalos nacionais.