Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, abril 13, 2006

Carlos Alberto Sardenberg Procura-se uma agenda

O GLOBO

A inflação está em queda e a atividade (produção e consumo), em alta. Há mais empregos, alguma recuperação da renda, crédito em expansão e, muito importante, os preços de alimentos estão baixos. Chocolate e bacalhau ficaram mais baratos em plena semana da Páscoa. O dólar muito barato atrapalha setores industriais, mas joga a inflação no chão, o que representa ganho de poder aquisitivo. Sem contar que facilita as viagens da classe média (o pessoal tem achado Buenos Aires “baratíssima”). Sondagem da FGV divulgada ontem mostra empresários mais otimistas.

Acrescente aí as diversas Bolsas e o salário mínimo — e se entende por que o presidente Lula mantém a dianteira na corrida eleitoral, mesmo diante de um ambiente político arrasador para seu governo, seu partido e seus aliados. A economia tem tanta força assim?

Pode ter. Tome-se o caso Bill Clinton. Enredado no episódio Mônica Lewinsky, à beira do impeachment, ele era amplamente condenado pelos eleitores quando se perguntava se Clinton era uma pessoa confiável. Mas quando se perguntava sobre seu desempenho como presidente, seus índices de aprovação batiam nos 70%.

Fazia muito sentido. Na era Clinton, os EUA tiveram o mais baixo índice de desemprego do período moderno, a mais baixa inflação em três décadas, ritmo de crescimento sempre acima do padrão e o maior volume de aquisição da casa própria da história do país.

Aqui, hoje, não temos nada parecido com esses recordes. Entretanto, comparando-se com momentos recentes, o desempenho econômico é mais que razoável. Se o país crescer 4% neste ano — chance boa — teremos uma média de 3,7% para este triênio, o que não é brilhante, mas melhor que a média de 2,5% das últimas décadas.

O que vai mal no governo Lula só aparecerá na vida dos cidadãos mais à frente. Os investimentos em infra-estrutura — que aumentam a capacidade de produção — estão mais do que atrasados. O governo não investe porque gasta demais em custeio, pessoal e Previdência. O setor privado não investe porque o governo e o Congresso não definem as regras (ou definem mal) para setores tão importantes quanto rodovias, portos, saneamento e energia.

O gasto público federal está em forte expansão, o que vai exigir mais impostos ou mais dívida à frente. E se as metas para a contas públicas deixarem de ser cumpridas, o ganho de credibilidade — que se mede em risco Brasil e juros externos menores — estará comprometido. Mas, de novo, isso aparece depois das eleições.

E então, essa blindagem econômica basta a Lula? Aí vai depender da capacidade da oposição. Há momentos em que a oposição não tem o que fazer. Ou porque o governo é muito bom — e o jeito é esperar a próxima eleição — ou é muito ruim, quando basta se dizer do contra para ganhar. Não é a atual situação brasileira.

Também já não há um quadro semelhante à eleição de Lula em 2002, quando o eleitor resolveu finalmente experimentar a terceira força pós-regime militar. Primeiro, foi o MDB, com sua Nova República. Depois, o interessante intervalo de Collor, eleito com uma inédita plataforma liberal mas derrubado pela grossa bandalheira. Em seguida, a vez do PSDB, que introduziu o real e iniciou as grandes reformas que viriam produzir efeito maior no governo Lula, mas não geraram crescimento por causa das crises internacionais e do próprio fato de estar o país em reformas. Finalmente, veio Lula, a terceira onda, com a promessa de mudança disso tudo que está aí. E que deu em assistencialismo, tipo pai dos pobres, e numa economia em ritmo moderado, surfando numa forte onda internacional. Mas agora, sob a grave denúncia do procurador-geral.

No balanço, a blindagem econômica não será suficiente para dar a vitória a Lula. Mas parece que o desastre no departamento de política e corrupção, por si, também não convence o eleitor a votar contra. Em boa medida, há um sentimento de que é tudo a mesma coisa nesse quesito.

Assim, sabendo-se que Lula vai com o que tem — assistencialismo e economia razoável — a questão em aberto é: a oposição tucana conseguirá construir uma agenda que convença o país? Desconfio que seria hora de uma agenda liberal, mas isso é outra história.

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