Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, novembro 15, 2005

Duas divergências e uma incerteza Eduardo Graeff



(15/11/05 12:08)

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Minha divergência básica com o Augusto é a seguinte: ele acha um erro a oposição não questionar Lula mais intensa e frontalmente, eu acho isso um acerto. Acho que subir o tom do discurso contra Lula sem ter um caso sólido contra ele só iria facilitar a defesa dele, que é partidarizar tudo, reduzir tudo a uma guerra política entre ele e o PT de um lado e o PSDB e PFL do outro.

Quem desde o começo andou na frente nesta crise foi a mídia – as revistas e jornais, o rádio e a televisão, nesta ordem. Aos partidos de oposição cabe um papel de assistente da promotoria, e um assistente discreto para não atrapalhar. Porque é mais fácil para as pessoas se convencerem dos malfeitos de Lula e sua turma pela mídia do que pelos políticos de oposição.

Não é fácil para as pessoas se convencerem de que aqueles bons moços em quem elas acreditaram são na verdade uns malfeitores. Para muitas é mais cômodo acreditar agora que tudo não passa de intriga da oposição. Outras preferem confirmar a velha crença de que político é tudo igual (é só ler alguns comentários aqui mesmo no site). Quem nunca acreditou nos bons moços ou viu logo que tinha caído num conto do vigário se impacienta. Mas a verdade é que a maioria, pelo que indicam as pesquisas, tem digerido as informações da crise com bastante acuidade e numa velocidade bem razoável.

O papel da oposição congressual nesse processo é secundário mas importante. Ela tem que ir atrás das pistas que os jornalistas levantam mas não conseguem seguir até o fim. Principalmente as pistas sobre os caminhos do dinheiro, dos cofres estatais até os bolsos do PT e aliados. Para isso servem as CPIs. Por isso o governo tem feito de tudo para impedí-las, retardar suas apurações e desmoralizá-las. Apesar disso elas vão apresentando resultados, graças ao trabalho discreto mas competente de alguns representantes da oposição.

Quanto mais avançam as investigações, quanto mais expõem os homens-chave do Presidente, tanto mais forte fica o libelo acusatório contra o próprio Lula. E mais ele tem que se expor, como se expôs na semana passada, fazendo de tudo para abortar a CPMI dos Correios e no final fracassando, graças à teimosia e competência do líder do PSDB na Câmara, Alberto Goldman.

Como é que isso vai terminar, eu não sei. Quem vai julgar Lula é o povo, nas urnas ou antes, se se convencer que não dá para esperar um ano.

Até aqui, acho que a estratégia das oposições está certinha. O que não impede de acontecerem erros táticos. Só que a análise desses erros precisa dar nome aos bois, como eu pedi outro dia.

Quando digo que as oposições são o que são, não me refiro basicamente à qualidade das pessoas, que em geral é boa. Penso no fato de que os partidos de oposição, diferentemente do PT, são partidos "normais" para os parâmetros históricos do Brasil. Quer dizer, são uma mistura de clube parlamentar com federação de lideranças regionais e locais. Não há quem os "convença" a ser outra coisa – não pelo menos no prazo de alguns meses.

Uma decorrência disso é que os partidos de oposição têm, na melhor hipótese, alguma unidade estratégica, baseada em valores e numa certa visão do mundo e do Brasil. O PSDB até que tem bastante disso – mais do que a média dos partidos e muito mais do que o PT, que, ao contrário da imagem que vendia, é um lamentável saco de gatos em matéria de visão estratégica. Mas não se espere do PSDB muita unidade tática operacional. Isso ele teve com FHC na Presidência da República e poderá voltar a ter com um outro tucano lá. No momento, para fins táticos, cada governador, cada líder no Congresso, enfim, cada cabeça do partido é uma sentença. Ou duas.

Então, na hora de analisar os erros táticos – aí está outra divergência minha com Augusto, – não adiante endereçar a crítica às "oposições", ao "tucanato" ou coisa que o valha. Se a crítica é para alertar e corrigir o erro, precisa ter endereço certo: o governador, o senador, o deputado, o assessor tal ou qual pisou no tomate assim ou assado.

Reconheço que destrinchar os fatos e boatos nesse nível é mais trabalhoso, além de ser às vezes humanamente embaraçoso. Os jornalistas, um pouco por falta de tempo ou apetite, um pouco para não queimar suas benditas fontes em "off", não se aventuram muito por aí. Os analistas geralmente trabalham sobre a informação dos jornalistas – com a vantagem de que têm tempo e foram treinados, ou deveriam ter sido, para cotejar as fontes e ler nas entrelinhas.

Vejam essa história de "acordão" ou acordinhos, por exemplo. Ontem, enquanto Kennedy Alencar, na Folha, especulava, sem identificar a fonte, sobre um acordo para poupar familiares de Lula e de tucanos, Josias de Souza, também da Folha, no blog dele anunciava que um senador do PSDB iria requerer a convocação do irmão de Lula para a CPMI dos bingos. A quem endereçar a crítica neste caso? Ao tucano anônimo de uma notícia ou ao senador identificado da outra notícia?

Acho que essas são nossas divergências básicas. Para terminar, uma incerteza. Augusto garante que as oposições podem ir com tudo para cima do Lula, que não tem perigo de rachar o país à la Venezuela de Chávez. Eu, mesmo sem conhecer bem a situação da Venezuela, reconheço algumas diferenças óbvias em relação ao Brasil. Mencionei essas diferenças faz uns meses nesta nota. Ainda assim, não tenho a mesma certeza do Augusto de que nada parecido pode acontecer por aqui. E prefiro, francamente, não tirar isso a limpo.

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