Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, novembro 15, 2005

AUGUSTO NUNES O medo vence o pudor

JB

A localização das cabeceiras ocultas do valerioduto assustou o governo federal. A descoberta de que boiava nas águas um logotipo em frangalhos em Banco do Brasil ampliou a inquietação. O pânico chegou com a suspeita de que logo serão devassados afluentes subterrâneos nos terrenos dos fundos de pensão e da fábrica de verbas Secom. E então o medo venceu o pudor.

A turma do Planalto resolveu impedir que as atividades da CPI dos Correios fossem prorrogadas até abril. Deputados oposicionistas haviam conseguido bem mais que as 171 assinaturas necessárias para a aprovação do requerimento destinado a adiar o desfecho dos trabalhos da CPI. Tranqüilos no início da guerra, estavam perplexos no fim.

"O jogo foi mais pesado que no dia da vitória do Aldo", confessou um aliado do governo. Muitíssimo mais pesado, atestariam depoimentos colhidos nas duas trincheiras. O comandante Lula decidira ganhar a qualquer preço. Mandou às favas o que o presidente José Sarney chamava de "liturgia do cargo". Perdeu a vergonha. Perderia a guerra.

Acampado na barraca principal, Lula administrou pessoalmente a feira criada pela dupla Valério e Delúbio para a aquisição de parlamentares. Ali ficam expostos deputados e senadores sempre à venda. O que muda é a moeda. Alguns querem receber em espécie. Outros preferem a liberação de verbas do Orçamento.

Há os que negociam empregos, os que sucumbem a ameaças apenas insinuadas ou os que se contentam com afagos. Para lidar com os diferentes blocos, o chefe do mercadão recrutou só especialistas em cada ramo.

Nas barracas do corredor presidencial, agiram os ministros Antônio Palocci, Ciro Gomes, Márcio Thomaz Bastos e Dilma Rousseff. Um garantia verbas, outro prometia obras, aquele sussurrava conselhos, aquela agendava audiências. Aldo Rabelo mostrou-se um feirante mais competente que o ministro e o presidente da Câmara.

Em barracas mais afastadas, protegidas por cortinas escuras e equipadas com celulares, trabalharam duramente dois craques: Severino Cavalcanti e Paulo Maluf. "Não pode ser!", haverão de exclamar muitos leitores. Repito: Severino e Maluf. "Mentira!", reagirão outros tantos. Pois acreditem: Maluf e Severino. Um foi expelido há pouco da presidência da Câmara. Outro acaba de sair da cadeia. A pedido de Lula, entraram na briga com o entusiasmo dos comerciantes congênitos.

Terminada a feira, 66 parlamentares haviam topado desertar do requerimento. Os articuladores oposicionistas mantiveram as assinaturas de 168 deputados . Somados a três fugitivos que o deputado Alberto Goldeman, líder do PSDB, algemou com truques regimentais, a cota mínima foi alcançada.

Embora derrotados, os feirantes fizeram bonito. A movimentação nas barracas somou R$ 13,9 milhões. Mas não será paga tão cedo, e a certas aquisições devem ser adicionados valores intangíveis. É o caso de dois deputados do PTB paulista. Ricardo Izar é o presidente do Conselho de Ética. Luiz Antônio Fleury, ex-governador e promotor público, é o Marechal do Carandiru. Valente com prisioneiros indefesos (mandou liquidar 111 naquele massacre), sabe ser piedoso com ladrões federais.

O governo não quer apurar coisa alguma. Conta com a maioria da Câmara, ministros do Supremo Tribunal Federal, delegados da Polícia Federal. Mas o Ministério Público e a imprensa não admitem acertos: seguirão perseguindo a verdade exigida pelos il decentes.

Os criminosos não passarão.

[15/NOV/2005]

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