FSP
O ministro Palocci se destaca por seu profissionalismo e senso de missão. Cercou-se de técnicos competentes. Não adotou doutrinas exóticas. Impressionante, porém, como nenhuma dessas importantes qualidades afastou o erro fundamental da sua política econômica. Sendo o ministro responsável pela coordenação dos aspectos fiscais e monetários, Palocci não quis ousar nenhuma originalidade nesse campo. Palocci foi "ortodoxo" e colheu os resultados convencionais: a inflação ficou controlada, a moeda apreciou-se, o risco-país baixou bastante, a economia cresceu, mas devagar.
Como julgar um comportamento tão prudente? À primeira vista, nada a questionar, menos ainda a reprovar. A ministra Dilma Rousseff, encarregada da chamada "visão estratégica" dentro do governo Lula, resolveu, entretanto, debater a percepção dominante. Não conhecendo a ministra pessoalmente, não posso fazer juízo de suas motivações. Sei, porém, que sua intuição está tecnicamente correta. Em suma, Dilma tem razão.
O prof. Delfim Netto chamou atenção para a aritmética do debate Dilma/Palocci em sua coluna da Folha do último dia 16. A matemática, em resumo, é a seguinte: para o Brasil equacionar suas finanças, a razão entre a dívida pública e o PIB tem que começar a cair rapidamente. Um endividamento alto se reduz quando o juro fica baixo, o déficit fiscal está controlado e a economia cresce bastante. É bom botar que tudo depende, no final, do crescimento do PIB: quanto maior o PIB, menor será o grau de endividamento, qualquer que seja o juro praticado. Mas como fazer o PIB andar mais rápido?
No Brasil, há mais de uma década, trocou-se inflação por juro alto. É a herança maldita, que o Plano Real não corrigiu e ainda agravou. Com juro alto, reduzir o endividamento fica muito difícil. Por dois motivos: primeiro, porque aumenta o esforço fiscal para cobrir a despesa com juros, o que exige superávits primários mais altos, menor investimento público, mais taxação. Em segundo lugar, maiores juros invocam menor crescimento do PIB, retardando a queda do endividamento relativo. Foi essa a conta que o prof. Delfim mostrou outro dia: com juro real muito alto (cerca de 14%) e crescimento do PIB lento (cerca de 3%), o esforço fiscal, via superávit primário, tem que ser da ordem de 5,5% -por cima da meta oficial- apenas para manter o endividamento como está. É o que a Fazenda vem perseguindo: superávits em torno de 5,5% a 6%. Estaria certa a Fazenda?
Há dez anos, pratica-se a lógica fazendária. Mas o endividamento só aumentou e o crescimento só murchou. Esse é o enigma de Dilma. Que tanto esforço é esse, que resulta em tão pouco? Como numa miragem, o final feliz se afasta à medida que dele nos aproximamos. Estaria errada a Fazenda?
Há duas ou três razões para o erro. A primeira é essencial: Palocci e assessores usam a teoria certa para o problema errado. A teoria manda subir juros para baixar inflação. O problema é que a dívida pública do Brasil é "errada", no sentido de ser quase toda pós-fixada, atrelada ao juro do dia. É caso para o dr. Drauzio Varella. Ela engorda muito mais rápido, com juro alto, do que a dívida de outros países. As células da nossa dívida são hipersensíveis a juros.
A segunda razão se segue à primeira: o hiper-juro fortalece demais o real, enfraquecendo o PIB. Terceiro: ao tentar cobrir a despesa de juro com corte de investimento e aumento de taxação, corta-se o crescimento pela jugular.
A ministra Dilma intui que algo está ou estaria errado. Afirma que o juro alto demais "compra" o próprio insucesso do objetivo pretendido, que seria estabilizar os preços, mas com crescimento. Um modelo matemático dinâmico mostraria que ela está certa: faz grande diferença cortar investimento ou passar a tesoura em gastos correntes. Um choque contra gastos, sim, mas não sobre investimentos. É um outro ingrediente que confirmaria o discurso da ministra Dilma. O superávit fiscal terá um efeito sempre melhor se houver ousadia (o que não houve) nas finanças públicas. Exemplos: 1) o encontro de contas entre ativos e passivos fiscais do governo; 2) a equação previdenciária de longo prazo; 3) a negociação das dívidas de Estados e municípios, em mercado; 4) a redefinição do papel do BNDES e dos fundos sociais (FAT, FGTS, PIS).
Longe de representar um atentado à sacrificada estabilidade palocciana, o contraditório ensejado pela ministra Dilma é um saudável exercício de contestação à sab
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