Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, novembro 22, 2005

AUGUSTO NUNES O PSDB se reduz a refém de Azeredo

JB
O PSDB se reduz a refém de Azeredo

Deputado desde 1989, o piauiense Átila Lira estagiou no baixo clero da Câmara durante 16 anos e cinco mandatos até conhecer, neste novembro, seus dez minutos de notoriedade. O filho ilustre de Piripiri virou notícia por ter sido o único parlamentar do PSDB alistado na tropa que, depois de apoiar formalmente a prorrogação dos trabalhos da CPI dos Correios, retirou a assinatura do requerimento.

Que moeda fora usada para incorporar Átila Lira ao bando de 66 desertores? Entre os feirantes recrutados por Lula para gerenciar as barracas do Mercadão do Congresso, a quem creditar a conquista daquele troféu de guerra? Quanto custara a proeza?

Nada, informou o balanço de lucros e perdas divulgado no fim da feira. Dos muitos milhões de reais subtraídos ao Orçamento da União, nenhum centavo fora destinado à região de Piripiri. O desertor tucano se juntara de graça ao lote de fugitivos. Nem sequer pedira que o som de uma sirene anunciasse ao sertão a chegada da ambulância nova.

A cúpula do PSDB reagiu ao episódio com estranha indiferença: todos os grão-tucanos mantiveram semicerrados os olhos e o bico. Seria insensato, alegaram, dizer algo sobre o gesto de Lira antes de apurar os detalhes do caso. O comando do partido negou-se, sobretudo, a examinar eventuais punições. Ficou evidente que a história seria arquivada no baú das irrelevâncias. O que teria determinado a decisão?

Dias depois, já devolvido à penumbra do baixo clero, o próprio Átila Lira desvendou o mistério. Com a candura de um coroinha, contou que apenas atendera ao pedido formulado por telefone pelo senador mineiro Eduardo Azeredo. Apeado da presidência do PSDB pela descoberta das relações perigosas estabelecidas com Marcos Valério nas eleições de 1998, Azeredo anda rondando a zona da cassação. Para escapar do rebaixamento, topa qualquer negócio. É o que reafirma o drible aplicado no deputado do Piauí.

Azeredo garantiu-lhe que outros seis tucanos desertariam também. Constatado o engodo, Lira ouviu o senador queixar-se de gente que não cumpre promessa. O deputado foi cuidar da vida. Os grão-tucanos fingiram ignorar a manobra desonrosa.

Naquele dia, Azeredo montara, nas cercanias do Mercadão da Câmara, uma barraca concebida para seduzir deputados do PSDB e repassá-los aos feirantes federais. Apesar da silenciosa cumplicidade dos chefes, o senador administrou um fiasco: só conseguiu atrair Átila Lira. Graças à incompetência do comerciante mineiro, a CPI dos Correios escapou de um sepultamento tão melancólico quanto o imposto à CPI do Mensalão. E o antigo parceiro de Valério não se livrou do risco de engordar a fila da guilhotina.

Desde a drenagem da margem mineira do pântano, o PSDB se transformou no partido oposicionista com que sonham todos os governos. Para salvar a pele de Azeredo, o tucanato primeiro barganhou cabeças: mandarins petistas foram afastados da linha de tiro. Depois, renunciou ao discurso correto: permitiu que o PT se agarrasse à falácia segundo a qual nenhuma irregularidade ultrapassou a fronteira do caixa 2. Neutralizado o xerife, o bandido passou a falar grosso.

Azeredo não vale - e o Brasil decente não merece - um recuo de tais dimensões. Se tivesse atirado ao mar essa carga, o PSDB estaria à vontade para afirmar que o criminoso caixa 2 foi só o prelúdio do infame projeto de eternização no poder tramado pelo governo do PT. A primeira etapa do plano previa a captura do Estado e o aparelhamento da máquina federal. Os tucanos sabem disso. Se não tivessem optado por Azeredo, hoje estariam contando o caso como o caso foi.

[22/NOV/2005]


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