Entrevista:O Estado inteligente
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quinta-feira, abril 14, 2005
José Paulo Kupfer:Só para sair na foto
14.04.2005 | É grande a semelhança entre o novo projeto de governo do chamado “campo majoritário” do PT (aquele que está no poder), divulgado no fim de semana, e aquelas fotos protocolares que, por ocasião de algum encontro, colocam lado a lado autoridades que não se bicam. Ambos servem para registro do momento, mas são imprestáveis como verdadeira expressão da vida real e inúteis como indicativo do futuro. As 15 mil palavras do documento “Bases de um projeto para o Brasil”, bem espremidas, vertem um caldo excessivamente adocicado e puramente eleitoral
Produzido para ser levado como “tese” ao próximo encontro nacional partidário, o texto “disputará” com formulações de outras correntes partidárias a definição da linha de ação do PT, nos próximos tempos. É carta marcada num baralho viciado pela inevitável decisão de concorrer à reeleição com Lula. Por isso mesmo, suas 44 páginas não estão aí para serem realmente lidas por seres de carne e osso, a não ser os jornalistas encarregados de divulgá-las.
A prova disso é que o documento, autodefinido como “um texto aberto e não conclusivo, que será reelaborado pelo processo de debate democrático no interior do PT e do PT para com a sociedade”, só foi liberado para a imprensa e não está, pelos menos por enquanto, à disposição do público, coisa muito estranha em tempos de internet – e de “debate democrático”. Qualquer semelhança com uma tradicional “photo-op” não é mera coincidência.
Difícil encontrar num único texto tantas platitudes e tautologias. No capítulo quatro, que trata da economia, por exemplo, lê-se que o “objetivo central do governo do PT é construir uma economia sólida, capaz de sustentar uma sociedade progressivamente mais justa para todos”. Ufa! Vai que o objetivo fosse construir uma economia frágil e progressivamente mais injusta para todos!
De todo modo, se a idéia dos autores do show era passar para o mundo a fabulação de que Zé Dirceu e Antonio Palocci finalmente se entenderam, a operação foi um sucesso. Nada como um documento-ônibus como esse, em que cabe todo mundo, para processar o milagre. Nele, por exemplo, se reconhece uma música mais conservadora quando se lê “que o partido soube aprender que o descontrole da economia e das finanças públicas é sempre mais cruel com os pobres”. Mas também se ouve um tambor mais esquerdista quando o texto destaca a existência de “imensas e abundantes” falhas de mercado a exigir a ação do Estado, sublinha “as desilusões proporcionadas pelo neoliberalismo” e aponta a capacidade desestabilizadora dos “interesses do mercado”.
Analistas mais ranzinzas ficaram incomodados com tom de refundação do mundo que envolve o documento. Não sem uma certa razão. Pelo que está no papel, a origem de tudo de bom que ocorreu no País, principalmente na economia, tem data posterior à ascensão do PT ao Planalto. Mas, de resto, foi uma louvação só ao “aprendizado” pelo qual passaram os barbudinhos irados de outros tempos – os mesmos que denunciaram o Plano Real, desprezavam os defensores do equilíbrio fiscal e se engalfinhavam com aqueles que defendiam, como prioridade número um, não o crescimento, mas a estabilidade monetária. Pena tais análises não passarem de uma espécie de “sabedoria convencional” interessada na imposição de um ponto de vista único.
Isso de forçar uma interpretação interessada não é de hoje. Peço licença para contar uma história antiga, da qual fui um involuntário protagonista, que ilustra a coisa. Em fins dos anos 70, embora seu ministro da Fazenda fosse o ultraliberal Mário Henrique Simonsen, o governo Geisel exibia um vigoroso ímpeto estatizante, com a criação em série de empresas estatais nos mais diferentes campos da atividade econômica. Com restrições na área política, era no lado da economia que o debate se fazia de forma mais aberta. Qualquer suspiro governamental era pretexto para críticas ao viés estatizante do governo.
Havia também escândalos e casos de corrupção. Um de grande repercussão na época envolvia as empresas Lutfalla, de parentes do já famoso Paulo Maluf, às quais o BNDE (ainda não havia o “s”, de “social”, agregado à sigla) socorrera, numa nebulosa operação-hospital. A gritaria obrigou o então ministro do Planejamento, Reis Velloso, a fazer um pronunciamento no Congresso. Com seu texto rebuscado, num longo discurso em defesa do governo, Velloso anunciava, já no fim do pronunciamento, estudos para a criação “do instituto de reestruturação de empresas em situação pré-falimentar”.
Este que aqui escreve era subeditor de Economia do “Jornal do Brasil”, no Rio, e deve ter sido um dos pouquíssimos brasileiros a ler a íntegra do discurso, numa longa tripa de telex, enviada de Brasília. Como nesse atual documento petista, nada de novo havia sob o céu no pronunciamento de Reis Velloso. Só aquela última frase, a dos estudos para criar um mecanismo jurídico para recuperar decentemente empresas quebradas – o que, aliás, só se deu agora, com a nova lei de falências – merecia algum destaque. Para quê?
A notícia, publicada no dia seguinte, estava correta: o governo estudava uma nova lei de recuperação de empresas quebradas, o tal “instituto de reestruturação”, como saiu no jornal, entre aspas. Mas os editorialistas, sedentos do sangue estatizante, não pensaram duas vezes. No outro dia, a página de editoriais abria com uma violenta diatribe contra “o polvo estatizante”, que planeja criar mais um Instituto (com I maiúsculo), como os tantos da Previdência então existentes.
Foi um vexame, que, de um jeito diferente e aggiornato, de certo modo, volta e meia, como agora, se repete.
no mínimo
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