Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, abril 06, 2005

Jornal O Globo -Merval Pereira: Contra a impunidade



“A única maneira de conter a violência no Brasil é fazer polícia com inteligência, informação, planejamento e tecnologia”. A definição é do ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, para quem o Sistema Único de Segurança Pública (Susp), implantado pelo governo federal para combater o crime em conjunto com os governos estaduais, “não está parado não, e funciona bem”.

O comentário do ministro deveu-se à coluna de ontem, em que, comentando a chacina da Baixada Fluminense, eu reconhecia o papel pioneiro do programa, mas criticava a falta de recursos e as disputas políticas em torno dele. O ministro diz que os gabinetes de gestão integrada (GGI), unindo todas as forças policiais — estaduais, municipais e federais — na discussão da segurança pública, estão implantados em 21 estados da Federação, “mais adiantado em uns, menos em outros”.

Com relação à falta de recursos, ele admite que houve “um corte forte” no orçamento do Ministério da Justiça, como mostrou reportagem do GLOBO ontem. Mas garante que já conversou com o presidente Lula e com o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, que prometeram liberar as verbas necessárias até maio.

Márcio Thomaz Bastos está claramente satisfeito com o trabalho em conjunto que vem sendo realizado dentro do Susp: “Hoje mesmo foi feita a prisão de um coronel da Polícia Militar do Paraná, que já foi comandante-geral da PM do Paraná, que comandava um grupo de bandidos para desalojar sem-terra”, ressaltou ele, referindo-se à prisão de oito pessoas envolvidas na formação de milícias no campo.

Entre os presos estão três ex-integrantes de um grupo de elite da PM do Paraná, o Grupo Águia, inclusive o tenente-coronel Valdir Coppetti Neves, que era comandante do grupo e também é acusado de tráfico de armas. Thomaz Bastos ressaltou que esse é um trabalho “que não está sendo feito contra o governador; o Requião (o governador do Paraná, Roberto Requião) estava lá acompanhando tudo”.

No Rio, segundo o ministro da Justiça, a presença de Marcelo Itagiba na Secretaria de Segurança “ajudou muito a operação”. Ele diz que a própria governadora do estado, Rosinha Garotinho, “está muito cooperativa”. Na verdade, diz o ministro, o atraso na implantação do programa de segurança unificado foi devido à incompatibilidade do ex-secretário nacional de Segurança Luiz Eduardo Soares com o ex- governador Garotinho, e vice-versa. Ele lembra que, no caso da chacina da Baixada Fluminense, a Polícia Federal está trabalhando desde o início. Segundo o ministro Thomaz Bastos, foi a Polícia Federal que descobriu um dos culpados, através de uma testemunha, o que resultou na prisão temporária de quatro PMs, “mas sempre trabalhando junto com a polícia do Rio”.

Em alguns estados, como o Ceará e o Pará, o Sistema Único de Segurança Pública está funcionando muito bem, na avaliação do ministro. Ele cita a solução de “quatro casos emblemáticos” que aconteceram recentemente no país, incluído o da chacina da Baixada Fluminense, como exemplo de que o trabalho vem sendo bem-sucedido. O caso da irmã Dorothy Stang foi desvendado em 12 dias “por uma atuação conjunta das polícias federal, estadual, militar, civil, rodoviária, Exército, inteligência”.

O caso de Unaí, em que mataram fiscais do Ministério do Trabalho, segundo Márcio Thomaz Bastos, era um crime “dificílimo de ser desvendado porque os criminosos eram profissionais, mataram e não deixaram pista”. Ele lembra que houve “um trabalho paciente das polícias de Minas Gerais e federal”, que grampearam dezenas de telefones, seguiram várias pistas, até chegar a decifrar, “não só quem matou, mas também quem mandou. Hoje está denunciado até um prefeito”.

O caso dos sem-terra em Felisburgo, também em Minas, é considerado pelo ministro da Justiça “outro exemplo de trabalho conjunto”. Ressaltando a tese inicial de que a violência só será combatida com “inteligência e tecnologia”, Márcio Thomaz Bastos lembra que inaugurou semana passada em Brasília “um laboratório de criminalística que seguramente é um dos maiores e mais bem equipados do mundo”. O ministro chama a atenção para o fato de que, no Brasil, em geral apenas 3%,4% dos homicídios são desvendados, os outros ficam sem autoria conhecida. Por isso o Susp privilegia a utilização de novas tecnologias para a investigação criminal.

Segundo o ministro, “o que está funcionando muito bem é o sistema que interliga todos os estados com informações criminais, e já estamos incluindo as judiciais”. Para ele, a instalação, em cada região do Brasil, de laboratórios de DNA “vai mudar os paradigmas da investigação”. Está também em implantação um sistema de datiloscopia que será integrado nacionalmente.

Tudo isso, evidentemente, se os cortes de orçamento permitirem transformar em realidade esses projetos ambiciosos. Apesar de ter sido o ministério que menos cortes sofreu, o Ministério da Justiça está se empenhando para que essa verba em contingenciamento seja liberada o quanto antes. Mas, de qualquer maneira, o ministro garante que “o Rio não vai ser afetado: a Força Especial está indo para ajudar no combate ao crime organizado e o laboratório de DNA do estado já foi comprado”.

Márcio Thomaz Bastos diz que com os novos procedimentos, dando prioridade à investigação com inteligência, “estamos estabelecendo um padrão, um padrão até triste, para que quando aconteça um crime desses, exista a certeza da punição”.

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