Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, abril 08, 2005

JB-VILLAS-BÔAS CORRÊA: O nevoeiro do silêncio


O badalado jato de US$ 56,7 milhões, mais conhecido pelo apelido de Aerolula, levantou vôo da Base Aérea de Brasília - seguido pelo desprezado Sucatão para os que sobraram e a garantia da volta, por cortesia da corte - com todas as cadeiras ocupadas pela comitiva ecumênica, montada pelo presidente Lula, em jogada política de inegável competência e habilidade.

Se não havia lugar para todos na numerosa comitiva brasileira para acompanhar o enterro do Papa João Paulo II, na Basílica de São Pedro, a seleção obedeceu aos cuidados presidenciais. E marca um gol de placa para a equipe palaciana, com tão modesto desempenho ao longo dos dois anos e três meses do primeiro mandato.

Nesta, Lula não errou uma. Superou a tosca astúcia texana do presidente George Bush que, além da mulher, a primeira dama Laura e do papai, apenas recrutou o ex-presidente Bill Clinton para enfeitar a comitiva americana. No Aerolula, só ficou de fora dos ex-presidentes vivos o incômodo Fernando Collor de Mello, que registrou o protesto pelo esquecimento intencional. Os demais que usaram a faixa presidencial abrem a lista dos convidados especiais: Fernando Henrique Cardoso e o senador José Sarney. No aeroporto de Roma, incorporou-se ao seleto grupo o ex-presidente Itamar Franco, atual embaixador do Brasil na Itália.

Nas fofas cadeiras seguintes acomodaram-se os convidados abençoados pelo protocolo: o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Nelson Jobim e os presidentes das duas Casas do Congresso, senador Renan Calheiros e o encrenqueiro deputado Severino Cavalcanti.

Do meio para a cauda, a novidade inspirada na homenagem ao Papa João Paulo II, que fortaleceu o espírito ecumênico com uma das prioridades do seu longo pontificado, com os convites ao rabino Henry Sobel; ao pastor da igreja luterana Rolf Schuenemann; ao sheik Aramando Houssein Salek, da Mesquita do Brasil, representando a religião islâmica e - na tacada de mestre - a mãe-de-santo, Aeronithes da Conceição Chagas, da Casa Branca de Engenho Velho, de Salvador, na deslumbrante riqueza dos seus trajes rituais - e que como boa baiana, perdeu o avião.

De Roma, o presidente viaja para o giro em quatro paises da África, cumprindo oportuníssima agenda montada com a protocolar antecedência.

Afortunada coincidência. Um sumiço de uma semana no preciso momento em que interessa ao governo esticar o manto de silêncio que abafa a série de crises e constrangimento que atormentam o governo. Como se não bastasse a insistência dos sinais, estridentes como o canto da araponga que imita as batidas no ferro na bigorna, agrava-se e raspa no limite do insuportável a situação do novo ministro da Previdência, Romero Jucá, flor do PMDB transplantada para o canteiro da minireforma ministerial, diretamente envolvido na trapalhada, muito mal explicada, da grave denúncia de que deu duas fazendas inexistentes como garantia para o empréstimo do Banco da Amazônia (Basa) à Frangonorte, empresa da qual era sócio.

As desculpas do novo ministro, que assumiu com discurso moralizador prometendo reduzir o astronômico déficit das contas da Previdência, não convenceram nem aos aliados do governo. O deputado João Paulo Cunha (PT-SP) desabafou os seus ressentimentos com a turma palaciana cobrando duro do ministro acuado ''explicações de forma peremptória, porque não é bom para o governo, o PMDB e o Ministério que alguém sob suspeita continue na Previdência''.

O PMDB, que não cultiva tais melindres, defendeu a permanência do ministro com os argumentos de sempre. Mas, o presidente acusou a cutucada e terá que enfrentar o problema quando voltar à Brasília.

Se o caso do Jucá é mais uma conta no rosário de tormentos oficiais, a relação é longa e aumenta a cada dia. Com o fiasco da reforma agrária, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) multiplicou as invasões de fazendas e cobra do governo as promessas não cumpridas do assentamento de famílias acampadas às margens de estradas.

O cobertor da cumplicidade aquece o esquecimento da ameaça do presidente da Câmara, deputado Severino Cavalcanti, de divulgar a lista dos parentes de jornalistas credenciados no Congresso, nomeados, sem concurso, para as mordomias e sinecuras parlamentares.

Os órgãos representativos da categoria, como a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e os sindicatos estão no dever moral de cobrar do presidente da Câmara que cumpra a bravata.

Ou, então, que justifique as razões do recuo da tentativa de intimidação dos que o incomodam com as críticas aos seus destemperos.

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