Aquele bispo de Santo André que em abril de 1980 carregava pelas ruas a cruz de uma greve perdida poderá ser eleito papa. Pelo que se entende, o franciscano Cláudio, cardeal Hummes, está na lista dos prováveis sucessores de João Paulo 2º, caso o novo pontífice não seja italiano.
Já que não se pode saber o que sucederá em Roma no futuro, vale revisitar o que sucedeu em Santo André no passado. D. Cláudio substituiu naquela diocese uma das grandes figuras do clero brasileiro do século 20. Chamava-se Jorge Marcos de Oliveira. Foi o primeiro bispo da cidade e morreu em 1989, aos 73 anos. Hoje sua lembrança está embaçada, mas, se o ABC paulista produziu bispos como Hummes e políticos como Lula, isso se deveu em boa parte ao descortino, à iniciativa e à coragem de d. Jorge Marcos.
O "Bispo dos Operários", como viria a ser chamado, chegou a Santo André em 1954, antes da indústria automobilística. Foi ele quem abençoou a primeira fábrica de motores a gasolina do Brasil, a da Willys, diante de JK. Tinha 38 anos e vinha da incubadora de lideranças da arquidiocese do Rio, comandada pelo regalista Jaime Câmara.
D. Jorge Marcos foi um estimulador da Juventude Operária Católica, a JOC. Seu objetivo era criar uma liderança cristã no chão das fábricas. Nessa época, Lula, com nove anos, ainda morava em Santos. D. Cláudio Hummes, com 20, estava no seminário. Como ensinou o professor José de Souza Martins: "Lula não sabia, porque ainda não era senão o anônimo, mas essa opção da igreja começava o movimento de constituição de uma força partidária católica de esquerda, anticomunista".
O bispo de Santo André ia conseguindo criar essa nova militância, até que em 1964 veio a ditadura. D. Jorge Marcos desentendeu-se com o cardeal de São Paulo, Agnello Rossi (que se entendia bem demais com os generais). Em 1966 foi proibido de falar na PUC e acabou abrigado pelos dominicanos. A Central Intelligence Agency americana descreveu-o dizendo que "até os comunistas o olham como um fanático".
Ele não era um fanático. Batalhava nos anos 60 por coisas que pareceriam maluquice nos 70 para tornarem-se audaciosas nos 80 e banais nos 90. O desgosto com a política levou-o à bebida e à debilidade física. Renunciou à diocese em dezembro de 1975, aos 60 anos. Desde abril daquele ano o sindicato dos metalúrgicos de São Bernardo era presidido por Luiz Inácio da Silva. Em dezembro, d. Cláudio Hummes tornou-se bispo de Santo André.
D. Jorge Marcos está sepultado na igreja em cuja nave se realizaram algumas das reuniões dos trabalhadores. Na hora em que o cardeal Hummes e Lula voam para Roma levando esperanças, algumas palavras de d. Jorge Marcos merecem eco.
Em abril de 1980, durante a greve dos metalúrgicos, dois dias depois da prisão de Lula e da mobilização de centenas de PMs, d. Jorge Marcos mandou uma carta manuscrita ao presidente João Figueiredo. Ele perguntava:
"Por que, Exmo. Sr., os milhões gastos no aparato de guerra que se viu no ABC não foram usados contra os corruptos, contra a violência que grassa no Brasil ou pela salvação dos menores carenciados e dos favelados do próprio ABC?".
Passou o tempo e mudaram os aparatos nos quais se queima o dinheiro da Viúva. Lula, por exemplo, comprou um avião. A agenda de d. Jorge Marcos está intacta.
Entrevista:O Estado inteligente
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