Entrevista:O Estado inteligente

segunda-feira, abril 04, 2005

Folha de S.Paulo - Editoriais: ERRO DIPLOMÁTICO - 04/04/2005


O Itamaraty e a lógica nem sempre andam de mãos dadas. Embora o Brasil diga ser favorável a que suspeitos de crimes de guerra na região de Darfur, no Sudão, sejam julgados pelo TPI (Tribunal Penal Internacional), o país se absteve na votação do Conselho de Segurança que determinou tal julgamento. Ao contrário de outras resoluções contra Estados que violam direitos humanos, nas quais o Brasil se absteve, a objeção levantada pelo Itamaraty nesse caso ao menos faz sentido.
O texto aprovado pela ONU de fato contém um problema ao embutir dispositivo que garante que cidadãos dos EUA e de outros países contrários ao TPI não sejam por ele julgados. Trata-se de uma exceção injustificável, que tende a enfraquecer o tribunal. O problema é que essa tecnicalidade torna a lógica de nossa diplomacia um tanto trôpega.
A isenção dada aos norte-americanos foi o preço pago para que Washington não vetasse a resolução no CS. Se o Brasil é a favor do julgamento e contra o casuísmo que beneficia os EUA, que votasse a favor do TPI para Darfur e protestasse por outros meios contra o que considera uma exceção indefensável. O tamanho do equívoco do Itamaraty pode ser entrevisto na companhia em que o país ficou. Abstiveram-se na votação, além do Brasil, EUA, China e Argélia. A favor da resolução manifestaram-se, entre outros, Dinamarca, França, Japão, Reino Unido e Argentina.
Está em curso em Darfur um genocídio. Uma milícia de sudaneses arabizados, a Janjaweed, com o apoio do governo de Cartum, promove uma verdadeira campanha de limpeza étnica contra populações civis de negros não-árabes. A perseguição já produziu pelo menos 70 mil mortos (há quem mencione 300 mil) e 1,8 milhão de refugiados. Diante de tal atrocidade, nenhuma tecnicalidade é forte o bastante para justificar a inação da comunidade internacional.
A sensação que fica é a de que o Brasil, em sua campanha por uma vaga permanente no CS, está levando longe demais sua política de não contrariar ninguém, nem ditaduras.

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