Jorge J. Okubaro*
Se examinassem com um pouco mais de atenção e um pouco menos de preconceito ideológico o comportamento dos preços nos últimos meses, poderiam chegar, para o bem de todos, a conclusão muito diferente da que costumam ter quando se fala de inflação. A inflação é sempre ruim, para toda a economia, para pobres e para ricos. Mas é sempre pior para quem ganha menos. E, quanto mais alta, mais nociva.
No ano passado, a inflação se acelerou. E a aceleração inflacionária teve algumas características que a tornaram particularmente aguda para os mais pobres. Foram eles que mais perderam em 2007. Isso foi dito de maneira explícita pelos economistas do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-Econômicos (Dieese) - que mensalmente calcula a evolução do custo de vida dos trabalhadores -, mas pode ser constatado nos demais índices de inflação divulgados nos últimos dias. É simples entender esse fato: subiram mais os preços dos itens que têm peso maior no orçamento das famílias mais pobres do que nos gastos das demais famílias.
O IPCA, que baliza a política de metas inflacionárias do Banco Central, subiu 4,46%, bem mais do que a alta de 3,14% em 2006. A aceleração foi impulsionada pelo preço dos alimentos. Em média, os alimentos subiram 10,8% em 2007 e, por causa de seu peso na composição do IPCA, foram responsáveis por quase metade (2,21 pontos porcentuais) da inflação de 2007.
Como os pobres gastam com alimentos proporcionalmente mais do que as famílias de renda mais alta, a inflação deles foi maior no ano passado. É o que mostra o INPC (calculado pelo IBGE para as famílias com renda de 1 a 6 salários mínimos e cujo chefe é assalariado), com alta de 5,16%, maior do que a do IPCA (calculado para famílias com renda de 1 a 40 salários mínimos, qualquer que seja a fonte de rendimentos).
Esses dados talvez pareçam um tanto abstratos para quem não se incomoda muito com inflação ou não está acostumado a lidar com índices. Mas estão vinculados a aumentos reais. Eles resultam de algumas altas que as donas de casa notaram muito bem nos últimos meses.
Só no mês passado, o feijão carioca ficou 38,61% mais caro, de acordo com o IBGE. O aumento não foi exatamente esse para todos os consumidores, mas quem comprou feijão carioca (e de outros tipos, que também subiram muito) nos últimos meses sabe que ele ficou muito mais caro.
A carne-seca subiu 9%; o óleo de soja, 7,6%; as carnes em geral, 8,2%; a cebola, 6,7%; só para citar alguns itens que estão diariamente na mesa das famílias brasileiras e que tiveram altas assustadoras no mês passado.
Mesmo quem não consegue ou não quer - como no casos dos militantes petistas obnubilados pela idéia de desenvolvimento a qualquer preço - entender como os mecanismos da inflação agem de maneira perversa sobre a renda das pessoas, com certeza terá notado a mudança, para melhor, nas condições de vida das famílias, em particular as que ganham menos, depois que os preços pararam de subir exponencialmente.
Mas é provável que muitos petistas descartem esse efeito da estabilidade da moeda e atribuam a melhora da situação das famílias de baixa renda exclusivamente às políticas sociais do governo Lula. Pesquisas têm mostrado que, de fato, políticas distributivistas aliviam os problemas dessas famílias, retiram muitas delas da condição de pobreza extrema, garante-lhes a sobrevivência. Apesar da importância dessas políticas, porém, na essência, elas não eliminam as causas da pobreza - ameniza seus efeitos, e temporariamente.
De eficiência notória e indiscutível para a melhoria das condições de vida dos mais pobres é a estabilidade dos preços. O combate à inflação, por isso, é a verdadeira política social do governo Lula. Pena que muitos de seus companheiros de partido não consigam perceber isso.
*Jorge J. Okubaro, jornalista, é autor de O Súdito (Banzai, Massateru!), Editora Terceiro Nome. E-mail: jorge.okubaro@grupoestado.com.br. Suely Caldas excepcionalmente não escreve hoje.