Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, janeiro 18, 2008

Luiz Garcia Dieta arquitetônica

Dieta arquitetônica
Ninguém discute que 2008 tem de ser ano de cinto apertado e mão fechada no governo brasileiro. Nos três poderes da República, todos estão de acordo: quem mais tem gorduras para queimar é o vizinho.

Uma briga de foice talvez já se esboce entre Executivo e Judiciário. Esta semana, em reunião de presidentes de tribunais superiores no Supremo Tribunal Federal, foi anunciado que eles mesmos e mais ninguém escolherão obras e outros investimentos do Judiciário que poderão sofrer cortes para compensar a perda da CPMF.

A posição se apóia na autonomia do poder, que realmente existe. Mas foi defendida com argumento extraordinário: o de que os tribunais geram mais lucro do que despesa para os cofres públicos. Pode até ser verdade, exceto pelo detalhe de que esse suposto lucro é acidental. Que se saiba, as sentenças se apóiam na determinação do que é estritamente justo e legal — e não no desejo de ajudar o Estado a fechar suas contas.

Os juízes, no entanto, acharam pertinente lembrar que os tribunais em 2006 deram à União ganhos em ações de R$ 13 bilhões, e a sua folha de pagamentos do Judiciário não passou de R$ 12,9 bilhões. É uma relação custo/benefício totalmente artificial, absolutamente estapafúrdia.

Quem usa esse argumento deixa no ar uma expectativa injusta, impensável: a de que, caso os recursos disponíveis acabem sendo menores do que se espera —o que parece inevitável com a perda da CPMF — as sentenças poderão ser mais generosas com o Tesouro.

Numa expectativa mais lógica — e mais justa em relação ao espírito público dos juízes brasileiros — não é absurdo algum, nem humilhação para o Judiciário, imaginar que o cinto pode ser apertado em outras áreas.

Como a dos custos imobiliários. Raro prédio público de Brasília nascido na prancheta de Niemeyer, talvez nenhum, tem o luxo e o custo das novas sedes de tribunais federais. E este ano devem começar a ser gastos R$ 1,23 bilhão na construção de mais três luxuosas sedes de tribunais.

A do Tribunal Regional Federal tem custo previsto de R$ 489,8 milhões, com previsão de área construída maior do que a do Superior Tribunal de Justiça. Um dado talvez melhor defina o projeto: o presidente do tribunal e seus assessores terão um gabinete quatro vezes maior do que o do presidente da República.

Nada é definitivo, porque os custos previstos da obra estão sendo contestados pelo Ministério Público. O qual também pediu a anulação da licitação para a nova sede do Tribunal Superior Eleitoral, orçada em R$ 336,7 milhões.

Num quadro como esse, em vez de argumentar com o suposto lucro que suas decisões podem dar à União — o que inevitavelmente levará cidadãos maliciosos a imaginar que alguma preocupação com isso possa influir nas sentenças — o Judiciário bem poderia começar a pensar nas virtudes de uma dieta arquitetônica para a beleza íntima de sua imagem.

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