Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, novembro 14, 2007

Terceira via petista



editorial
O Estado de S. Paulo
14/11/2007

O desfecho mais provável do pleito no PT marcado para 2 de dezembro ainda é a reeleição do atual presidente, o deputado e ex-ministro Ricardo Berzoini. Na reta final do primeiro turno de 2006, a turma de “aloprados” que ele chefiava no comitê central da campanha de Lula foi apanhada com a boca na botija armando uma baixaria contra o candidato tucano ao governo paulista, José Serra, mediante o infame dossiê Vedoin. O único ou principal resultado prático da tosca manobra, graças à sua revelação, foi o efeito bumerangue que adiou a reeleição do companheiro-presidente para a rodada final. À época, Lula cobrou de Berzoini, publicamente, que esclarecesse o imbróglio. Ele nunca fez isso e o cobrador, como era de prever, deixou por isso mesmo também esse “erro” de sua gente.

Depois de fingir que não queria continuar no posto a que ascendeu quando o mensalão fez cair em desgraça o antecessor José Genoino, mais o secretário e o tesoureiro da sigla, Berzoini foi à luta como o candidato de Lula e do “centrão” petista, o antigo Campo Majoritário rebatizado de Construindo um Novo Brasil. É o PT-governo por excelência, o appart do lulismo. Antes de virem a público os “desvios éticos” dos majoritários, o seu campo tinha o apoio de cerca de 60% dos filiados petistas. Atualmente deve reunir a metade da companheirada. Em 2005, no pós-mensalão, os autodenominados construtores do novo Brasil demoliram os ensaios do ministro Tarso Genro de construir um novo partido - ou, nas suas palavras, de promover a sua “refundação”.

Agora, ainda que se confirme a vitória de Berzoini sobre o seu adversário, o deputado José Eduardo Martins Cardozo, do movimento Mensagem ao Partido, integrado por Genro, o discurso oposicionista - por exemplo, “o PT desistiu da utopia”, como ele deplora - põe a opinião pública em contato com uma forma sui generis de pensamento petista. Distingue-se tanto da linha predominante, segundo a qual os fins justificam os meios, quanto daquela, que deu no PSOL, progressista na ética e retrógrada em tudo mais (o radicalismo de mãos limpas que jamais deixou de repelir o aggiornamento configurado na Carta ao Povo Brasileiro, de junho de 2002). Essa terceira via parece ter no governador baiano Jaques Wagner um dos seus mais insistentes porta-vozes.

Ao menos é a impressão que fica da sua entrevista ao Estado (9/11). Ele não vacila em admitir que “o bom momento que vivemos começou há 13 anos, com o Plano Real, não começou com o governo do PT” - uma heresia para uma parcela dos petistas e uma inconveniência para outra, que sabe disso, mas não gosta que se diga. Quando a eleição que mobiliza Wagner se trava dentro e não fora do partido, é preciso coragem para fazer uma afirmação como aquela, que pode ser tudo menos eleitoreira. E no contexto de duas outras manifestações heterodoxas: a defesa da troca de comando na presidência do partido e a admissão de que “essas coisas (o mensalão) não se apagarão mais da nossa história”.

Wagner retoma, na entrevista, uma idéia sugestiva ultimamente pouco mencionada. Ele e Genro estiveram entre os primeiros a chamar a atenção para os benefícios potenciais da troca de papéis entre PSDB e PT ao longo dos últimos 12 anos, um e outro experimentando as servidões do poder e os confortos da oposição (ou vice-versa). “Depois que você governa e conhece as dificuldades, terá passado por um processo de aprendizado para quando estiver de novo na oposição”, raciocina o governador. “Uma vez no governo você vê que as coisas não são fáceis. E a oposição tem um olhar mais crítico e clínico sobre o que você faz no governo.” A moral da história, para ele, é que esse dado da realidade pode tornar menos maniqueísta o debate político, se houver ânimo e boa-fé de parte a parte.

Essa expectativa não o impede de reconhecer que o caminho é longo - “nós ainda funcionamos muito na dicotomia”, lamenta. Cita, a propósito, companheiros que o aconselharam a “botar para quebrar em cima dos caras”, depois que derrotou o carlismo na Bahia. Ele preferiu dizer, numa inauguração, que “os outros trabalharam e eu estou vindo cortar o bolo”.

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