Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, novembro 14, 2007

Um leilão sem atrativos


editorial
O Estado de S. Paulo
14/11/2007

O governo retirou do 9º leilão da Agência Nacional do Petróleo (ANP), marcado para os dias 27 e 28 de novembro, 41 blocos de exploração localizados na Bacia de Santos, entre Santa Catarina e o Espírito Santo - chamados de golden blocks, por estarem onde é maior a probabilidade de se encontrar petróleo em águas profundíssimas, nas jazidas abaixo da camada de sal do leito oceânico -, próximos ao Campo de Tupi, cuja descoberta foi anunciada quarta-feira. A exploração desses blocos seria reservada à Petrobrás. A decisão torna menos atraente o próximo leilão de blocos e emite um sinal desfavorável aos investidores estrangeiros dos quais o País não pode prescindir.

A decisão foi anunciada pelo diretor-geral da ANP, Haroldo Lima, um ex-deputado do PC do B, que na ocasião se jactou de tê-la sugerido. Resolveu-se com açodamento uma questão levantada pela descoberta, que deveria ser tratada cuidadosamente, por sua relevância estratégica.

Seria admissível que a Petrobrás adiasse o próximo leilão por medida de prudência, pois se está diante de novos e importantes fatos. A descoberta da reserva de Tupi autoriza a expectativa de novas descobertas que poderão alçar o Brasil ao bloco dos dez maiores produtores de petróleo do mundo. Dependendo dessa avaliação, o governo poderá até concluir que o modelo atual dos contratos de exploração não atende aos interesses nacionais, quando aplicado às jazidas abaixo da camada de sal da Bacia de Santos, e deve ser mudado no futuro. Mas, de forma alguma poderia ter alterado as regras estabelecidas para os próximos leilões, nos termos das quais todos os interessados, inclusive a Petrobrás, concorreriam em igualdade de condições.

As empresas estrangeiras que se preparavam para o próximo leilão sabiam da existência de grandes jazidas que ainda não haviam sido cubadas e fizeram grandes investimentos para aumentar suas chances. Mas, não satisfeito com a exclusão dos 41 blocos do leilão, o diretor da ANP fala agora numa nova Lei do Petróleo, que teria de ser votada às pressas pelo Congresso - idéia recebida com apreensão por parlamentares. “Não tem por que mexer (na lei em vigor)”, disse o deputado João Maia (PR-RN). “A discussão sobre mudanças na Lei do Petróleo é perigosa e desestimula investimentos”, disse o deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA).

O centro da questão é a reserva de mercado que a retirada de 41 blocos do leilão conferiria à Petrobrás. Isso significaria a ampliação do monopólio do setor de petróleo, sobre o qual a Petrobrás nunca deixou de ter uma posição quase monopolista. As áreas de risco poderiam ser disputadas por outras empresas; aquelas onde a existência de petróleo é praticamente certa ficariam com a Petrobrás. Como observou o ex-diretor-geral da ANP David Zylbersztajn, as áreas da Bacia de Santos “não podem ser repassadas dessa forma para a Petrobrás”, com uma ressalva: “A não ser que você mude a Lei do Petróleo, que regulamentou a quebra do monopólio da Petrobrás na exploração do petróleo. Repassar para a Petrobrás, sem mudar a lei, não pode, é ponto pacífico.” Sob pena do restabelecimento do monopólio total.

“A retirada dos blocos não contribui para a credibilidade que defendemos”, observou o presidente do Instituto Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustíveis, João Carlos de Luca.

O argumento do atual diretor-geral da ANP, Haroldo Lima, é insustentável: “Não podemos estar engessados. Temos que ser mais flexíveis com o marco regulatório. Os atuais contratos estão garantidos.” Essa alegação transmite aos investidores estrangeiros a impressão de que o Brasil está ignorando regras, e põe em estado de alerta não apenas as multinacionais interessadas na exploração de petróleo, mas outras companhias que desejam fazer investimentos de risco na infra-estrutura - energia elétrica, saneamento básico, rodovias, ferrovias, portos -, sem os quais o País não ganha competitividade.

A descoberta das enormes jazidas abaixo da camada de sal é mais um motivo para a manutenção das regras que nos últimos dez anos atraíram investimentos privados para a área de petróleo. Afinal, a exploração dessas jazidas custará muitíssimo mais do que a das jazidas cuja exploração já estamos partilhando com empresas estrangeiras. Se partilhamos a escassez, por que não partilhamos a abundância para torná-la cada vez maior e mais rapidamente?

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