Entrevista:O Estado inteligente

domingo, novembro 04, 2007

Alberto Tamer

Petróleo a US$ 96 é desafio


Os Estados Unidos, a União Européia e a China pressionaram a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), na semana passada, para aumentar a oferta de petróleo. O preço do barril passou de US$ 96, recuou para US$ 95,93 na sexta-feira em Nova York, mas continua apontando para US$ 100. A resposta foi não. O ministro do Petróleo de Qatar, Abdullah al-Attiah, afirmou que "não há escassez de petróleo no mercado". Ele atribui a alta à desvalorização do dólar, moeda em que a commodity é negociada, e à especulação.

A Agência Internacional de Energia (AIE) refuta. "Os estoques estão caindo, em média, 360 mil barris por dia, a maior queda em dez anos." Na próxima semana, ela divulga o seu novo relatório em que deverá apresentar um quadro ainda mais sério. "Estamos consumindo estoques de petróleo que deveríamos aumentar", dirá a agência que acompanha o mercado para os países consumidores.

Guy Caruso, analista sênior do Departamento de Energia dos EUA, acrescentou que "a não ser que a Opep aumente sua produção, haverá falta de petróleo no primeiro trimestre de 2008''''.

MAIS 500 MIL

A Opep responde que desde o dia 1º está colocando no mercado mais 500 mil barris por dia. A decisão foi tomada há mais de um mês, mas isso é praticamente nada num mercado que consome 85 milhões de barris por dia. E mesmo assim, informa a AIE, 10 milhões a menos, em média, do que em 1999.

MODELO SUPERADO

É impressão geral que o Brasil não seria afetado por essa explosão dos preços internacionais por produzir internamente quase todo o petróleo que consome. Mas não é bem isso. A Petrobrás produz em reais mas vende em dólares. Segue, portanto, as variações do preço internacional, ou seja, interna os US$ 95 da semana passada. Por enquanto, afirma o seu presidente, a empresa não está repassando, para o consumidor, essa alta de 50%, em um ano, do preço do petróleo no mercado internacional. Motivo: vem sendo compensada pela valorização do real ante o dólar. Mas isso tem um limite. A manter-se esta nítida tendência de alta, a empresa forçosamente tenderá a aumentar o preço da gasolina, do óleo diesel e dos outros derivados do petróleo, pressionando a inflação. E, quando isso ocorrer, será vez do Banco Central (BC) justificar a parada na queda dos juros e até mesmo fazer um aumento da taxa para conter a inflação. É decididamente o pior que poderia acontecer, pois só agora a economia está absorvendo o choque do juro e começa a crescer.

A Petrobrás pode argumentar que o aumento dos preços dos derivados de petróleo - a exemplo do que pretende agora com o gás - tenderia a reduzir o consumo interno e permitir um maior volume da exportação. Mas isso fica anulado pela nova pressão inflacionária somando-se às que a economia já vem registrando. Não há como acrescentar, impunemente, qualquer fator novo de alta sobre os preços, já distendidos. A China e a Índia já aumentaram os preços dos derivados, mas enfrentam inflações de mais de 6% e 7%, respectivamente.

O caso brasileiro é especial e contrasta com o que acontece nos EUA e na Europa. Praticamente toda a produção nacional, principalmente a agrícola, cujos preços pesam muito na inflação, é feita por caminhões movidos a óleo diesel. Por mais que se queira, não se poderá contar muito com o biodiesel e o etanol para reduzir a dependência do petróleo. Ainda por alguns anos, suas participações serão marginais diante do consumo que aumenta com o crescimento da safra agrícola e da economia.

Ao optar há muito tempo pelas rodovias, o Brasil abandonou e esqueceu que o transporte ferroviário pode ser imensamente mais econômico. Hoje transportamos até gás, além de gasolina e diesel por caminhões. É a queima de combustível sob combustível. Uma aberração de economia elementar.

Diante do novo cenário externo, é hora de repensar a estrutura de preços da Petrobrás. Se não quiser enfrentar maior alta dos preços, o governo precisa rever a parcela de lucros que fica com a Petrobrás - é enorme - e o que a empresa lhe repassa na qualidade de maior acionista. Mas não é só isso. O governo não se contenta com a sua parcela de lucro, como maior acionista; aplica também impostos e taxas de toda ordem sobre os derivados de petróleo, principalmente a gasolina. É a famosa "conta petróleo" entre a Petrobrás e o governo, que poucos entendem. Um ex-presidente do BC passou uma manhã com diretores da Petrobrás, tentando entender como as coisas funcionavam, mas era tudo tão obscuro que, ao sair, quando os repórteres lhe perguntaram, "então, entendeu?", ele disse um "não" desanimado.

Na verdade, a gasolina e o óleo diesel, sem contar os outros derivados, são uma verdadeira mina de ouro que os consumidores oferecem para os cofres do Tesouro. Todo esse esquema deve ser revisto se o preço do petróleo aproxima-se de US$ 100.

BCE ALERTA

Na sexta-feira, dois membros do conselho do Banco Central Europeu (BCE) alertaram para as pressões do preço do petróleo. Nicholas Garga e Alex Weber deixaram a entender que o banco já está preocupado com a inflação de 2,6% em outubro - a meta máxima é de 2% - o que poderia levar o BCE a elevar o juro ou pelo menos mantê-lo ; nunca reduzi-lo, como todos os governos europeus desejam para fazer frente à crise imobiliária e reanimar o crescimento, que recuou em outubro.

É um sinal de alerta que já deveria estar ressoando no Brasil. Resumindo: com ou sem Petrobrás, o petróleo a US$ 100 o barril é um novo desafio para o Brasil.

*E mail: at@attglobal.net

Arquivo do blog