Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, janeiro 17, 2007

Clóvis Rossi - Quixotes, vitória e desânimo



Folha de S. Paulo
17/1/2007

Sobre o "pensar e sonhar pequeno", tema tratado ontem neste espaço, recebi uma batelada de correspondência eletrônica que indica ser o problema ainda mais complexo do que o apontado por João Paulo dos Reis Velloso ("O Brasil se conforma com pouco") e por Contardo Calligaris (os jovens de hoje sonham pequeno).
Carlos Alberto Pessoa Rosa relata que faz parte do Conselho de Mortalidade Materno-Infantil de sua cidade, que "apresenta, como tantas outras, índices muito tristes". Trabalho voluntário, o que mostra engajamento e sonhar mais alto. Mas, depõe o leitor, só um terço dos membros do conselho participa das reuniões. Causa das ausências? "A mais citada é a descrença total de conseguir algum resultado concreto", diz.
Daniel Seda, que trabalha com vídeo, cinema e internet (multimídia, supostamente o que há de mais moderno no mercado), reclama que está há dois anos sem trabalho estável. Confessa: todos os sonhos (leia-se, livros e filmes que têm na cabeça) seriam facilmente arquivados se lhe oferecerem um emprego "que pague as contas".
Sonhos, portanto, há, mas minguam ante a catatonia em que o país mergulhou há tantos anos.
Falta uma utopia, mesmo que não seja A utopia. Na França, por exemplo, o governo apresenta hoje projeto que torna habitação decente um direito legal, equiparável à educação e saúde públicas. A habitação já é, aliás, direito social desde 1946. O que se pretende agora é dar a quem não a tem o direito de recorrer à Justiça para obtê-la.
O projeto é reação aos "Filhos de Quixote", um grupo de cidadãos liderado por um ator que montou acampamento (literalmente) em Paris para sentir como vivem os SDFs (sem domicílio fixo) e apoiá-los. É a versão bem-sucedida do Conselho de Mortalidade Materno-Infantil que faz desanimar quixotes brasileiros.

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