Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, agosto 15, 2006

MIRIAM LEITÃO Temas e batalhas

Míriam Leitão - O Globo

Dez minutos e meio dos 12 minutos da entrevista do Jornal Nacional com o presidente Lula foram dedicados à corrupção, mas o principal adversário dele ainda tem dúvida sobre qual é o ponto fraco do candidato oficial. Lula já percebeu onde mora o perigo e, por isso, no fim de semana, foi para o ataque jogando a culpa sobre um ser incorpóreo: "a imunidade parlamentar", que, como disse, é "uma safadeza".

O erro da comunicação de Lula durante o governo foi recusar entrevistas livres e democráticas. Seus assessores o cercaram e ele se negou a enfrentar o contraditório que os jornalistas sempre representam. Foi o presidente que menos falou com a imprensa. Só deu uma coletiva, sem direito à réplica. Encheu o ouvido do público com longos monólogos, nos quais se convencia de que estava se saindo muito bem. Deixou contradições no ar, habilmente exploradas por William Bonner e Fátima Bernardes. Menos de 12 minutos do Jornal Nacional foram suficientes para mostrar um presidente hesitante, contraditório e despreparado para enfrentar uma entrevista inquisitiva.

Hoje, na estréia do horário eleitoral, Lula voltará a parecer seguro do que diz, porque estará em um ambiente sob seu controle: o do monólogo assistido pelos marqueteiros e áulicos. Lula tem duas vantagens: ele mesmo e seu principal adversário. Lula é comunicativo e tem um adversário que fala um idioma descarnado de significado, como mostraram os especialistas ouvidos pela revista "Época". Fala por clichês burocráticos, que, mesmo para quem conhece os termos, nada significam.

A idéia do PSDB, de atacar em emprego, é um equívoco. O desemprego é alto e esse é o terreno das aspirações das pessoas. Mas a memória da população em relação ao governo passado não é boa, e no governo Lula houve aumento da criação de emprego. Se escolher esse tema, Alckmin continuará patinando.

Geraldo Alckmin tinha um ponto forte, na área da segurança, mas ele foi detonado pelos ataques do PCC. Os dados mostram avanços nas estatísticas de violência e o Jornal Nacional até se referiu a isso. Mas a resposta dele não ressaltou os números. Disse que as mortes desde 1999 caíram "de 12 mil e oitocentos para onze, para dez, nove, oito e sete mil e duzentos". Não dá para entender essa contagem regressiva direito e ninguém pode comemorar sete mil assassinatos! Ele deveria ter dado um número forte, significativo e de vidas poupadas. Mesmo assim, os ataques do PCC criaram na população um aumento do medo e uma compreensível sensação de agravamento da crise de segurança.

Contra essa percepção só se pode lutar mostrando que no futuro pode ser diferente, por meio de um plano coerente e realizável. O presidente Lula também tem um passivo na área por não ter cumprido o que prometeu. O melhor nesse campo é cada candidato mostrar para a população que sabe como enfrentar o problema; que ter um plano de ação contra os criminosos é possível. Neste fim de semana, como disseram os especialistas ouvidos pelo jornal O GLOBO, o crime subiu $patamar. Ao seqüestrar jornalistas, os criminosos igualam o Brasil a países que consideramos símbolos de violência, como a Colômbia. Estamos na era do medo. Briga entre candidatos numa hora dessas só alimenta a descrença na democracia.

Os outros dois candidatos que representam partidos com bancadas no Congresso também têm seus pontos fracos. Heloísa Helena precisa medir melhor sua participação em entrevistas para não ficar com a imagem — na área da comunicação, bem entendido — de Maluf da esquerda. Maluf afogava os repórteres com uma fala compulsiva, sobre o assunto que queria, ignorando as perguntas. Isso costuma dar aflição no telespectador que quer ouvir uma entrevista: ou seja, perguntas e respostas.

Cristovam Buarque já corrigiu o erro de ser o candidato de uma nota só, como definiu este jornal. E começou a falar de segurança também. Na educação, cometeu erros nas suas respostas. Um exemplo: Bonner mostrou que ele prometeu acabar com o analfabetismo em quatro anos, mas no tempo em que foi ministro da Educação o país continuou com os mesmos 14 milhões de analfabetos com 15 anos ou mais. Cristovam disse que em um ano e quatro meses no ministério alfabetizou três milhões de brasileiros, mas que o índice de analfabetismo não caiu porque "há uma torneirinha" em que outros entram na estatística. Para isso ser verdade, a "torneirinha", ou seja, o número de analfabetos completando 15 anos — e entrando na estatística — teria que ser de três milhões. Mas em 2003 havia 68 mil brasileiros de 14 anos analfabetos. Há uma torneirinha sim, mas ela está minguando, felizmente. A conta de Cristovam não faz sentido.

Os candidatos, a partir de hoje, terão de tentar convencer o eleitorado que tem mais dúvida: as mulheres. E elas estão pensando, comparando e trocando de candidato. São delas os votos decisivos.

Veja, por exemplo, a diferença do voto por sexo na CNT Sensus em julho e em agosto. Lula tinha 51,7% de votos masculinos e 36,8% dos femininos em julho. Uma diferença de 14,9 pontos. Em agosto, melhorou muito. Dos homens passou a ter 52,6% e das mulheres, 43,4%. A diferença caiu para 9,2 pontos. Alckmin caiu nos dois, mas despencou entre as mulheres. Tinha 26,3% dos homens e 28,1% das mulheres e passou a ter 20,9% e 18,5%. A queda de Alckmin junto às mulheres foi de quase 10 pontos. O apoio das mulheres a Heloísa Helena subiu 40% neste período. HH tinha 4,4% da preferência dos votos e passou para 8,2%. Ela tinha 6,2% das mulheres e passou para 10,2%. O campo de batalha é o voto feminino.

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