Entrevista:O Estado inteligente

domingo, agosto 20, 2006

MERVAL PEREIRA Qual a saída?

o globo
Ainda sem resposta, uma pergunta assombra os assessores e aliados do candidato tucano Geraldo Alckmin: o que fazer para descontar os 11 pontos percentuais que separam Lula de seus opositores na corrida presidencial, e lhe garantem a vitória no primeiro turno, de acordo com a mais recente pesquisa do Ibope? O mundo globalizado do marketing político está cheio de exemplos de campanhas dadas como perdidas que foram vencidas com o uso das ferramentas modernas de comunicação, assim como tem exemplos de uso errado de estratégia que levou a derrotas, momentâneas ou definitivas.

Uma das estratégias colaterais da campanha tucana é inflar a candidatura de Heloísa Helena, do PSOL, com o objetivo de que seu crescimento leve Alckmin ao segundo turno. Existem até mesmo comitês ligados ao tucano que ajudam campanhas locais do PSOL, na certeza de que, num eventual segundo turno, a maior parte dos votos de Heloísa Helena migrarão para Alckmin, e não para Lula, como já foi demonstrado em pesquisa do Datafolha sobre transferências de votos.

A campanha de Alckmin calculou o “potencial de captura” de cada candidato e descobriu que, proporcionalmente aos votos já consolidados, Heloísa Helena tem maior potencial do que todos os outros candidatos, sendo que, sobre os votos de Alckmin, esse potencial é duas vezes maior. Isso quer dizer que a candidata do PSOL vem crescendo em cima do eleitorado de Alckmin, que pode retornar a ele no segundo turno.

Mas, como ela mesma diz, se crescer mais, pode vir a disputar com Lula um segundo turno.

Temos aqui mesmo no Brasil um exemplo de como essa tática tucana pode dar errado. Na campanha para governador do Rio em 1982, o governo militar resolveu ajudar a candidatura de Brizola, até mesmo com financiamento por baixo do pano, para neutralizar a de Miro Teixeira, então líder das pesquisas pelo PMDB, e abrir espaço para Moreira Franco, candidato do antigo PDS.

Deu Brizola na cabeça.

Há também a discussão, dentro da coligação PSDB/PFL, sobre se a campanha de Alckmin deve ser mais agressiva contra Lula, levantando especialmente as denúncias de corrupção.

Um exemplo bem-sucedido de recente campanha propositiva é o filmete considerado o caso mais conhecido da estratégia de reversão comunicacional, estudado nas disciplinas de comunicação política via TV nas escolas americanas: chama-se “Aburrido” (Aborrecido), feito pelo famoso marqueteiro americano Dick Morris para a campanha de De La Rua à presidência da Argentina, em 2001.

Segundo o cientista político Silvério Zebral, que assessora a campanha de Alckmin, a idéia do trabalho é converter uma pretensa debilidade de imagem (a rabugice de De La Rua, advogado, católico, pai de família, tímido) em fortaleza eleitoral (a seriedade e sobriedade que a Argentina necessitava à época.). Funciona melhor quando esta característica pessoal contrasta com a do governante anterior (no caso, o bon vivant, espalhafatoso, festeiro, carismático condutor de Ferraris e namorador de misses, Carlos Ménen) ou mesmo do adversário direto (naquele caso, Eduardo Duhalde, um tipo vigoroso, decidido, com uma ficha corrida de alguns metros, sob orientação de Duda Mendonça).

Para Zebral, “é uma pequena mostra de como é possível usar o marketing político sem “vender gato por lebre”, viabilizar uma candidatura que em nada parece com a pretensa “cara de um povo”, mas que se ajusta perfeitamente à conjuntura política e às expectativas de uma maioria silenciosa.

Na Argentina em 2001, ou no Brasil em 2006”.

Ele destaca que uma pesquisa recente do Datafolha, que traça um perfil do eleitorado brasileiro, revela “o conservadorismo solidário que emerge da maioria silenciosa brasileira”, e indica que a campanha de Alckmin está no caminho certo.

Um caso de campanha de “desconstrução”, exigida por setores do PFL, que deu errado é um filmete chamado “Labestida”, também de Dick Morris. “A idéia era macular a imagem do candidato Labastida que, como as antigas lideranças do PRI, não primava pelos dotes intelectuais, usando o trocadilho “La bestida” (ou a besta)”, explica Zebral. Uma voz em off pergunta ao eleitor se ele “quer que o presidente do México se porte desta forma” — e mostra imagens de Labastida no debate ocorrido dois dias antes reclamando, nervoso, desequilibrado, que fora xingado pelos eleitores de Fox, e corta para Fox no mesmo debate: pose de executivo, altivo, assertivo, atacando o PRI de modo equilibrado. Os estrategistas do PRI identificaram, através de pesquisas, que havia espaço para vitimizar o próprio candidato, e o eleitorado ficou do seu lado. Fox perdeu três pontos percentuais com essa peça, embora tenha recuperado depois e vencido as eleições.

A ação globalizada dos marqueteiros, inclusive brasileiros que atuam na América Latina e nos países de língua portuguesa, é um fenômeno consolidado. A partir de Patrick H. Caddell, que nos anos 1970 do século passado passou a usar as pesquisas não apenas para mensurar a opinião do eleitorado, mas para entender suas motivações e interpretá-las, como uma ferramenta fundamental nas ações políticas, o conceito da “campanha permanente” tomou conta da política, fazendo com que questões ideológicas ou morais tenham menos importância do que a manutenção do poder ou sua conquista.

Saber o que o eleitor pensa para repetir nos programas eleitorais faz com que todas as campanhas pareçam iguais, como tem ressaltado o candidato a governador pelo PT do Rio, Vladimir Palmeira, o único que se dispõe a quebrar essa mesmice na propaganda, propondo um diálogo com o eleitor, sem truques nem mágicas.

Alckmin tem optado por permanecer dentro dos padrões estabelecidos pelos marqueteiros, que já o levaram a uma vitória impensável em 2002. Mas o tempo está contra ele

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