Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, agosto 16, 2006

MERVAL PEREIRA Lustrando a imagem O Globo

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 A propaganda eleitoral no rádio e televisão começou sem grandes novidades, com os candidatos “lustrando” suas imagens, apresentando-se ao eleitorado, em movimentos artificiais e estudados. A insistência com que o presidente Lula vem atacando os parlamentares, desde o final da semana passada, como justificativa para defender a reforma política que virou sua bandeira mais recente, tem o único objetivo de reforçar junto à população a idéia de que a crise institucional que vivemos, com políticos mensaleiros seguidos de sanguessugas, é generalizada e não pode ser debitada a seu governo.

No mesmo dia em que começaram a surgir renúncias de deputados envolvidos no esquema das ambulâncias superfaturadas, para evitar um processo de cassação que pode ser iniciado pela Comissão de Ética da Câmara, o presidente Lula usou seu primeiro programa eleitoral gratuito na televisão para generalizar a crise que, segundo ele, seria “de todo o sistema politico, e não apenas de alguns partidos ou de determinadas pessoas”.

É notável que o presidente Lula tenha feito essa análise depois de uma reunião de seu conselho político, do qual participa o deputado Jader Barbalho, acusado diretamente por ele de ladrão em outros tempos. Ou que tenha feito críticas ao sistema político depois de dividir um palanque com o exgovernador mineiro Newton Cardoso, a quem também já tachou de ladrão.

Tamanha distância entre o falar e o agir tem se tornado marca registrada de seu estilo de governar, mas, no campo político, essa característica vem se acentuando à medida que vai consolidando a idéia de que o grande eleitor não está muito ligado nesses valores éticos ou morais, mas na conseqüência prática de ações do g o v e rn o .

Se não é verdade que a Corregedoria Geral da União, a CGU, foi criada em seu governo, ou se ficou claro na entrevista ao “Jornal Nacional” que ele sabia que seu amigo Paulo Okamotto pagara a dívida que o PT lhe cobrava, isso não tem a menor importância na ordem geral das coisas, pois o que importa mesmo é que, pelo menos no momento e possivelmente até o final da eleição, a situação econômica continuará favorável.

Dificilmente a mensagem da oposição sobre corrupção será ouvida ou entendida pelos que compõem o núcleo duro de seu eleitorado: os menos escolarizados, os de menor renda, que foram beneficiados por políticas assistencialistas como o Bolsa Família, ou por uma política de aumento real do salário-mínimo e controle da inflação que lhes proporcionou ganhos verdadeiros.

Fica para depois, sem espaço para discussão em uma campanha eleitoral que mais do que nunca será marcada pelo artificialismo do marketing político, a questão crucial: este modelo de transferência de rendas é compatível com uma política de desenvolvimento sustentável? O equilíbrio fiscal resistirá até quando diante do aumento dos gastos correntes do governo? Como é possível a algum candidato contestar os aumentos salariais e o do salário-mínimo que farão com que o gasto do governo simplesmente dobre, de R$ 13 bilhões este ano para R$ 26 bilhões em 2008? Sem o contraditório, Lula volta a aparecer nos programas eleitorais como o candidato “paz e amor”, e não o de cenho fechado e acuado diante da possibilidade de ser desmentido em pleno “Jornal Nacional”. Mas também o candidato tucano Geraldo Alckmin usará os mesmos truques marqueteiros para se vender ao eleitorado brasileiro como uma alternativa.

Ele já mostrou que é bom mesmo de televisão, mas não espontaneamente.

Enquanto a candidata do PSOL, Heloísa Helena, aproveitou a exposição diária no “Jornal Nacional” para chegar no patamar de 15%, um índice inimaginável no início da campanha, Alckmin perdeu tudo, ou quase tudo, que ganhara com o programa oficial no PSDB com a aparição diária no “Jornal Nacional”, que revelou um político sem vigor, com uma linguagem empolada, que não alcançou o eleitor.

Certamente vai corrigir esses erros no programa de televisão, e teremos uma competição, não de candidatos verdadeiros, mas de candidatos montados em oficinas de criação de imagem política. A grande discussão é se os marqueteiros prejudicam ou ajudam os candidatos. Se a política ficou artificial com as novas técnicas, ou elas ajudam o eleitorado médio a compreender melhor a situação política.

Essa discussão coloca em confronto “puristas” e “realistas”.

O ex-governador Mario Covas, guru de Alckmin, costumava dizer que campanha política é uma questão de “caráter”. Alckmin prefere dizer que é “um embate de personalidades”. O cientista politico Silvério Zebral, que trabalha na campanha de Alckmin, define assim a situação: “A sociedade moderna é mais imagem, menos palavra”.

A comunicação política serviria “para estabelecer uma conexão com cidadãos que não estão escutando ou que não são escutados. Por isto, é cada vez mais pesquisa, estratégia, gerência. Cada vez menos marketing, cada vez menos intuição”. Ele admite que o marketing político produz a simplificação da mensagem, mas diz que “é assim que o eleitor médio processa a informação: simples, direta, baseada em imagens, emocional — mas fundada em sua razão e motivos próprios”.

A decisão de voto é mesmo, no fundo no fundo, emocional, analisa Zebral, e obedece a três fases: a) o eleitor identifica o candidato como candidato (identificação), b) identifica-se com ele e manifesta sua preferência (intenção) e c) racionaliza a escolha, procurando argumentos que a justifiquem (aprofundamento).

O debate de idéias fica para a fase final da decisão de voto do eleitor.


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