Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, agosto 02, 2006

Mercado persa (Lucia Hippolito) Blog do NOBLAT





Que o Congresso Nacional se tenha transformado num enorme mercado persa não é surpresa para ninguém.


Há muito tempo, ali se negocia de tudo: mais um ano de mandato para Sarney, votos para a aprovação da emenda da reeleição, adesão à base aliada de Lula, mensalões, mensalinhos, troca-troca partidário, convites para as festas com as alegres "meninas" da dona Jeanny Mary Córner (que nome, meu Deus!), convocações e dispensas de convocação de depoentes em todo tipo de CPIs, CDs com depoimentos de delegados paulistas em sessão secreta de CPI.


Além dos lobbies dos mais variados, desde as notórias e generosas empreiteiras, passando por verbas de publicidade, ambulâncias, computadores, ônibus escolares, monopólio na exploração dos restaurantes da Câmara, passagens aéreas que suas Excelências recebem de graça (de graça, uma ova! Pagas com o nosso dinheiro). Vai ver, vai ver, negocia-se até cartão prá-pago de telefone celular.


E um dos principais instrumentos de negociação são as hoje tristemente famosas emendas individuais apresentadas pelos parlamentares ao Orçamento da União.


Em princípio, não há nada de errado em um parlamentar apresentar emenda para destinar recursos a uma obra em sua região. Isto acontece em praticamente todos os parlamentos do mundo democrático.


O Estado preocupa-se com os grandes programas, as grandes obras. Mas às vezes uma escola, um posto de saúde ou mesmo uma entidade de assistência a deficientes, por exemplo, nada disto é contemplado no Orçamento. Daí a emenda.


A Constituição de 1946, a mais bem elaborada de todas as constituições brasileiras, exigia que a emenda individual fosse precedida de um projeto que a justificasse. Assim, o dinheiro não era liberado "a seco".


 Foi durante a ditadura que bateu o "liberou geral" das emendas. Os militares prenderam e cassaram parlamentares e retiraram várias prerrogativas do Congresso.


Mas para manter a atividade política minimamente atraente e representar a mímica da democracia, a ditadura deu aos parlamentares várias mordomias. Além disso, extinguiu a exigência de projeto para a aprovação das emendas individuais. A aprovação passou a ser automática.


A partir daí, a emenda virou moeda de troca nas mãos do Executivo e instrumento de chantagem entre ele e o Legislativo. Um só libera os recursos das emendas se o parlamentar se comportar direitinho e votar sempre com o governo. O outro ameaça votar com a oposição se o Executivo não liberar os recursos das emendas.


No governo Lula, este conluio promíscuo e perverso atingiu seu ponto mais agudo. Com o contingenciamento do Orçamento nas mãos de ferro do Ministério da Fazenda, a liberação de emendas passou a ser instrumento de controle absoluto do governo Lula sobre a base aliada.


A rebelião da base teve muito a ver com o mensalão, mas também teve muito a ver com o não cumprimento das promessas do governo àqueles partidos: esquartejamento da máquina pública entre os aliados - o PT fez 17% da Câmara, mas ocupou 82% dos cargos federais! - e a liberação das emendas individuais.


Agora, com mais um escândalo na praça, pode-se entender por que não se vota nada há muitos meses. O esfacelamento da base aliada, que atendia pelo nome de crise do mensalão, agora atende também pelo sugestivo nome de sanguessugas.


Pelo menos neste escândalo, os partidos da base aliada não estão sozinhos na roubalheira. Conquistaram o auxílio luxuoso dos principais partidos da oposição.


Ninguém é inocente.

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