Entrevista:O Estado inteligente

domingo, agosto 20, 2006

Isto é entrevista Saulo de Abreu Filho


ISTOÉ – Por que o sr. se irrita quando o governo federal oferece a ajuda do Exército para São Paulo?

Saulo de Abreu Filho – Porque essa oferta não é séria. Primeiro o presidente oferece o Exército e depois diz que São Paulo não precisa do Exército. É inacreditável. Se ele sabe que é assim, por que oferece as tropas? Porque é um desonesto intelectual. Ele sabe que não é verdade, antecipadamente, e de uma forma maquiavélica vai procurando nos desgastar. Na verdade, ele não está sendo desonesto apenas com São Paulo. Isso serve para o Pará, para o Rio Grande do Sul, serve para o País inteiro. O Lula, quando diz o que está dizendo, está sendo desonesto com o País. Em todos os sentidos, está faltando honestidade a ele.

ISTOÉ – O sr. pode ser mais específico?

Saulo – Nós temos o Fundo Constitucional de Segurança, com recursos de todos os Estados, administrado pela União. É um dinheiro importante, porque a segurança gasta muito. Mas São Paulo recebeu zero centavo desse fundo, apesar de termos R$ 380 milhões em projetos lá. Mesmo recursos pequenos, que estávamos recebendo desde 2002, foram estancados. A gente vai ao Siaf e vê assim: “Em análise.” Mas como em análise se estávamos recebendo? Quando eu pergunto a verdadeira explicação, me falam em superávit primário.

ISTOÉ – O que mais está errado? Saulo – O presidente da República tem exclusividade constitucional para mudar a legislação penal e processual penal no Brasil. Mas nada foi feito nessa área. O presidente nunca tratou a segurança como uma política pública, porque de iniciativa dele nessa área nunca houve nada, nenhum projeto. Nem o conceito do que é crime organizado ele definiu. No caso do ministro da Justiça, isso é ainda mais grave.

ISTOÉ – Em que aspecto?

Saulo – Na questão da videoconferência entre os presos e o juiz. Isso é uma unanimidade no Judiciário, no Ministério Público, na OAB. Com a videoconferência, nós teríamos cinco mil policiais a mais nas ruas. Esse é o contigente que temos de mobilizar em São Paulo para escoltar os presos, o dia inteiro, das cadeias até os fóruns. Mas o ministro mandou um projeto de lei proibindo a videoconferência. Não é razoável. Hoje nós temos a videoconferência, mas porque nós fizemos o lobby contra a intenção do ministro.

ISTOÉ – O presidente e seu ministro não entendem de segurança pública, é isso? Saulo – O ministro parece ser um tradicionalista, que defende leis da década de 1940. O presidente é um desonesto intelectual. Em lugar de oferecer o Exército, se ele acha a situação tão gritante assim, que declare o Estado de Defesa e faça a intervenção. Eu não sei o que está por trás disso. Às vezes acho que o presidente usa a retórica da empulhação. Sabe quem faz a segurança do presidente quando ele vem a São Paulo? Vinte e quatro dos nossos policiais militares. E isso porque é a PM que conhece quem são os bandidos, as esquinas, as situações perigosas daqui. Não é o Exército. Já há uma movimentação de oficiais superiores meio que revoltados em relação a essa intenção do governo federal. Eu mesmo recebi uma carta de um general da ativa com fortes críticas a isso.

ISTOÉ – Uma insubordinação?

Saulo – Seria, mas é um texto enviado a poucos amigos, sem a intenção dele em torná-lo público. Eu diria, se quisesse brincar com as palavras, que o presidente tem de ser mais sóbrio ao tratar desse assunto. O presidente não está sendo honesto com o País, com a Constituição, com as pessoas. Por que essa história de intervenção aqui em São Paulo? No sábado, quando a sua revista sair, essa questão já estará desmoralizada. As pessoas já estão começando a questionar isso.

ISTOÉ – A crise do PCC passou?

Saulo – Não temos nada, nenhuma informação em nossa rede de que haverá mais ataques. Aposte, isso sim, no surgimento de uma terceira força dentro dos presídios. O PCC já está desfalecendo. Você acha que não há criminosos que hoje estão nos contando como as coisas funcionam? Eles perderam as expectativas, tanto que a idade de quem está cometendo atentados é cada vez menor. Já há até serviços terceirizados. Prendemos um garoto que tocou fogo num ônibus e confessou ter recebido R$ 1 mil para fazer aquilo. Os bandidões ou foram presos ou foram mortos.

ISTOÉ – O sr. disse no passado que São Paulo não tem bandido famoso, mas hoje todos sabemos que é Marcola.

Saulo – Mas ele está preso. Qual o problema?

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