Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, agosto 17, 2006

CELSO MING Cigarro e juros bancários

ESTADO

celso.ming@grupoestado.com.br

Ao longo do século 20, a indústria tabagista tentou convencer o mundo de que o cigarro não faz mal à saúde. Depois da perda de muito dinheiro, acabou por se render às evidências.

O bancos no Brasil têm algo que lembra a indústria de cigarros. Sempre tentam explicar por que cobram juros tão altos, mas não convencem ninguém. Um dia serão obrigados a se render às evidências.

A criação do crédito consignado (empréstimo para desconto direto na folha de salários) ajudou a derrubar o custo do crédito. Mas há muito a fazer. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, está anunciando estudos para derrubar o spread (diferença entre custo de captação e juros cobrados ao tomador de empréstimos) e, assim, ajudar a reduzir o custo de produção para as empresas brasileiras.

Em grande parte, o problema decorre da oligopolização do setor. Como está na tabela, ao final de 1994, os cinco maiores bancos detinham 45,2% dos ativos. Dez anos depois, já eram 61,0% e, no ano passado, 61,2%.

Porque dominam o mercado, acabam por cobrar o que querem. Uma política de redução do spread não pode fugir de uma política de aumento da concorrência. Há providências administrativas que podem reverter a situação. Algumas delas já foram antecipadas pelo ministro Mantega. Confira:

Doc reverso - É o mecanismo pelo qual qualquer cliente pode autorizar um banco a retirar de conta corrente (ou de aplicação financeira) em outro banco um certo volume de recursos. Isso é diferente do Doc convencional porque este consiste na transferência que um cliente faz para a conta de outra pessoa.

Salário em qualquer banco - Hoje, o empregador exige que o salário dos seus funcionários seja feito no banco com o qual tem acordo. Quando puder determinar a conta bancária onde receber o salário, o poder de barganha do funcionário crescerá. Isso deve começar pelos salários dos funcionários públicos que não precisarão ser depositados no Banco do Brasil ou em outra instituição estatal.

Cadastro positivo - Os bancos cobram os mesmos juros em cada modalidade de empréstimo, qualquer que seja o cliente. Não faz sentido que o bom pagador tenha de pagar mais para ajudar a cobrir a inadimplência dos outros. É preciso que o banco trabalhe como as seguradoras. Se não há sinistro no histórico do cliente, não há razão para ele pagar mais pela cobertura.

Incentivo a empréstimos - Para derrubar o spread, os bancos pedem redução do depósito compulsório, o dinheiro dos depositantes a ser recolhido ao Banco Central. Inadimplência e juros altos são gema e clara do mesmo ovo: o juro é tão alto que a prestação não cabe no salário do tomador de empréstimos. Que tal começar por reduzir o compulsório para os bancos que mais emprestarem para pequenas e médias empresas ou, então, para os que atingirem baixos graus de inadimplência?

Isenção de CPMF - Não haverá aumento da competição no mercado se o cliente não puder mudar de banco. Isso pressupõe isenção de cobrança de CPMF, um dos obstáculos.

Advertência: Cobrar juros escorchantes faz mal à saúde econômica do País.

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