Entrevista:O Estado inteligente

sábado, agosto 19, 2006

André Petry Tributo à tolerância

VEJA


"Juiz autorizou um casal gay a registrar
o filho
adotivo numa certidão em que
não houvesse menção a 'pai' ou a 'mãe'.
É uma decisão notável"

Faz bem ouvir depoimentos como o do governador mineiro Aécio Neves. Numa sabatina promovida pelo jornal Folha de S.Paulo, o governador disse que é um defensor do casamento homossexual. "Não me oponho à união civil entre homossexuais. Não coloco nenhuma objeção ao fato." Aécio Neves disse que o país tem demonstrado tolerância ao casamento entre pessoas do mesmo sexo e defendeu a idéia de que a lei contemple esse avanço.

Parece que disse pouco, mas é bastante.

Os políticos profissionais não gostam de externar posições claras sobre temas aparentemente controvertidos. No caso do casamento gay, têm receio de deflagrar a fúria da Igreja Católica, talvez a instituição mais intolerante do mundo à liberdade sexual, e sobretudo de perder o voto do eleitorado mais conservador. O comportamento esquivo dos políticos explica por que o casamento homossexual nunca é votado no Congresso Nacional, ainda que o tema circule por ali há mais de uma década. Explica, ainda, por que já houve tanto projeto apenas prevendo a convocação de plebiscito sobre o tema – pois é uma forma de agradar à comunidade gay sem afrontar os conservadores.

O casamento homossexual é uma realidade no Canadá e em alguns países da Europa, inclusive na católica Espanha, e será uma realidade no Brasil – mais cedo ou mais tarde. Trata-se de um avanço inevitável, como aconteceu com o divórcio ou o tabu da virgindade. Para quem tem dúvidas, basta conferir algumas decisões judiciais recentes:

Em julho, o juiz Rômolo Russo Junior, de São Paulo, determinou que o Instituto de Previdência do estado pagasse pensão ao companheiro de um servidor que falecera havia cinco anos. Em sua sentença, escreveu que o direito existe para que "o homem alcance o justo meio das coisas".

No mesmo mês, a juíza Mariângela Meyer Pires Faleiro, de Belo Horizonte, tomou decisão idêntica, ainda que a lei não preveja benefício previdenciário a casais homossexuais. Escreveu: "A Justiça não pode seguir dando respostas mortas a perguntas vivas".

Ainda em julho, a juíza Adair Julieta da Silva, de Cuiabá, reconheceu a união estável de um casal homossexual – antes que qualquer um morresse. O casal passou, assim, a ter benefícios previdenciários, direito a pensão alimentícia ou a herança, como qualquer casal heterossexual.

Outra decisão, também do mês passado, é ainda mais notável: o juiz José Antônio Cezar, de Porto Alegre, autorizou um casal homossexual a registrar o filho adotivo numa certidão em que não houvesse menção a "pai" ou a "mãe".

Quem sabe isso tudo – a declaração de Aécio Neves quebrando o padrão de hipocrisia dos políticos e as decisões judiciais dando exemplo de grandeza – ajude a desbloquear a legalização do casamento gay. Faria bem ao país. Ensinaria, aos socialmente conservadores, aos religiosos que identificam liberdade sexual com sinal do apocalipse, que a legalização do casamento homossexual é apenas uma reverência à diversidade e um triunfo da tolerância. Não faz mal a ninguém.

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