O Estado de S. Paulo |
19/4/2006 |
Se todos protestassem como faz o MST, estaria revogado o Estado de Direito no País É esquisita, não obstante coerente com o padrão do movimento, a forma adotada pelo MST para marcar a passagem dos 10 anos do massacre de Eldorado dos Carajás e protestar contra a impunidade dos policiais responsáveis pela morte de 19 sem-terra no Pará em 17 de abril de 1996. O MST passou a segunda-feira exercitando suas atividades de sempre: saques, invasões e bloqueios de estradas. Ou seja, protestou contra a ausência de punição aos infratores do direito à vida agredindo a lei: roubando, ferindo a inviolabilidade da propriedade produtiva e agredindo o direito constitucional de ir e vir dos cidadãos. Uma facção do movimento havia feito o mesmo a pretexto de celebrar o Dia Internacional da Mulher, com a destruição de um laboratório da empresa Aracruz. Na ocasião, ainda houve reações contrárias, traduzindo vitalidade institucional. Agora, como a causa é justa, o silêncio geral soa a aprovação dos meios em função da nobreza dos fins. O governo considera tudo muito natural - dado que não reage -, segue qualificando o MST como movimento "social" e, segundo o ministro de Relações Institucionais, Tarso Genro, ninguém, nenhum partido, controla os sem-terra. Sendo movimento social, raciocina Tarso Genro, o MST deve ser tratado "dentro da lei, da ordem jurídica, da ordem constitucional". Faltou ao ministro expediente democrático para acrescentar, primeiro, que não apenas no tocante a movimentos sociais, mas todas as questões devem obrigatoriamente ser tratadas dentro da legalidade; e, segundo, deixou escapar o mais relevante em seu argumento: que ao MST caberia seguir o mesmo, e único aceitável, critério em suas ações. Quanto ao descontrole, o ministro termina por admitir a impotência - ou conivência - do Estado com saques, invasões, bloqueios. Uma injustiça, para não dizer agressão, ao público pagante (de impostos), pois, se sustenta os sem-terra com verbas públicas, algum controle o governo precisa exercer. Mais não seja, para garantir o cumprimento das leis no País. Dentro de sua lógica, Tarso incentiva a justificativa dos meios em nome dos fins. Sendo assim, por analogia não poderia impor reparos se porventura a população, revoltada com as absolvições de mensaleiros pela Câmara ou indignada com a indiferença de sua excelência maior em relação à denúncia do procurador-geral da República pedindo o indiciamento da "quadrilha" que montou um esquema "criminoso" para sustentar seu governo, resolvesse expressar sua revolta com invasões de prédios públicos - entre os quais o Congresso e o Palácio do Planalto -, bloqueios à Esplanada dos Ministérios e saques às instituições financeiras denunciadas como integrantes do bando. Se adotado o padrão - e de uma hora para outra pode surgir alguém reivindicando isonomia na tolerância a reações violentas e ilegais -, a conseqüência óbvia é a paulatina revogação, pela força da inércia, do Estado de Direito no Brasil.
Boa parte da oposição comemorou como vitória o adiamento, da semana passada para depois de amanhã, do depoimento do ministro da Justiça ao Congresso para explicar sua participação na quebra de sigilo do caseiro Francenildo dos Santos Costa. Os fatos já mostravam o contrário antes mesmo de a decisão ser ouvir Márcio Thomaz Bastos na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. Além de presidida pelo petista e advogado Sigmaringa Seixas, a CCJ da Câmara é ambiente muito mais risonho ao ministro do que seria o plenário ou o Senado. A ala oposicionista menos comprometida por laços de amizade e clientela (ou ambos) ao ministro ainda tenta levá-lo ao Senado, mas a outra, capitaneada pelos senadores Renan Calheiros e Antonio Carlos Magalhães, quer encerrar o assunto na Câmara mesmo. ACM deixou evidente sua preferência quando fez circular a versão de que teria dito ao amigo Bastos que a Câmara era um cenário hostil. Como na realidade é uma corporação amistosa se comparada ao Senado, tratava-se de mero disfarce do senador.
O indiciamento do ex-assessor de imprensa de Antonio Palocci por participação ativa na quebra e na divulgação do sigilo de Francenildo dos Santos Costa indica que destino semelhante aguarda o ex-ministro na Polícia Federal. A PF indiciou Marcelo Netto porque firmou convicção de culpa em virtude da presença do então assessor na reunião em que o extrato foi entregue a Palocci. Por mais razão, deve indiciar o destinatário, e beneficiário, do produto do crime.
A OAB disse a Lula que a decisão de pedir abertura de processo de impeachment passará ao largo dos partidos e dos políticos. Mas não pode fazê-lo sem o apoio deles. Entre outros motivos, porque o prosseguimento de um processo dessa natureza depende do Congresso. O presidente da Ordem só não produziu uma frase de efeito por carência do mesmo. |
Entrevista:O Estado inteligente
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