Entrevista:O Estado inteligente

sábado, abril 15, 2006

Arnaldo Jabor A pizza está na cara

O GLOBO
Publicado em 11 de abril de 2006    

   


Apizza molda os rostos. Podemos ler a História do Brasil na cara dos políticos. Meu Deus, como suas caretas são inatuais, de mau gosto, e nos mostram como será difícil modernizar esta terra.

Segundo Charles Darwin, os bichos se expressam pelo "princípio da antítese". Por exemplo, um cachorro demonstra amor ao dono por uma mutação corporal, balançando o rabo, amolecendo as costas para denotar ausência de agressividade. A gestualidade dos nossos políticos, ao contrário, visa a esconder o que sentem, pela negação de seus reais motivos. Assim, o canalha ostenta bondade, o ladrão apregoa honradez.

E, à força de tanto dissimular sentimentos, rostos e barrigas vão se esculpindo em deformações riquíssimas.

A política enfeia os semblantes, a política engraxa os cabelos de brilhantina, a política escolhe gravatas horrendas, a prática constante da vaselina dos fisiológicos lhes cobre a alma de furúnculos morais.

No passado, já sofri com as carrancas da ditadura. Primeiro o Castello Branco, como um "ET" verde-oliva, menor que o próprio quepe, depois a cara de bulldog de Costa e Silva, sob o riso deslumbrado de Yolanda, a Lady Macbeth brega que mandou baixar o AI-5, a cara de Garrastazu Médici, silencioso vampiro; sofri também com a visão das coxas e barriga de Figueiredo, fazendo ginástica de sunguinha para a nação ver, exibindo a genitália num strip-tease militarista.

E hoje, vejo que as sobrancelhas do Lula voltaram a se arquear — sinal de angústia e rancor. Sempre que ele detecta que está perdendo forças, sobe-lhe o sobrolho, uma leve vermelhidão matiza a sua bochecha, sorri com dentinhos à mostra sem alegria. A sobrancelha é um "ibope" ao contrário. Quando sobe, ele está caindo.

E os gestos e caras vão criando o painel caricato de nossa vida política. Mais que a dança do elefantinho que a Ângela executou, mais que a patusca bailarina, impressiona sua declaração: "Não pinto o cabelo, sou petista!". Genial. É a falta de vaidade revolucionária — não sou burguesa, minha gordura é a favor do povo!... Já Ideli Salvatti tem um fugaz sorriso que denota laivos sexuais nas folgas da militância. Ela defende o PT passionalmente como defenderia seu homem.

Já o Henrique Pizzolato (lembram? Anda esquecido, entre as dobras da Visanet...) parece um torresmo com cabelo, figura que ele mesmo evocou, se descrevendo. E o doce Heráclito Fortes, que parece tocar sempre um trombone imaginário? E Sarney, que vai embranquecendo por trás do bigode, firme, negro, fixo, enquanto ele se dissolve no tempo? Por falar nisso, onde andará o Greenhalgh? Escondido atrás do bigodão também? Tão escondido quanto o processo de Celso Daniel que ele ajudou a confundir? E o nariz de Márcio Thomaz Bastos? Está cada dia está mais longo, mais "pinóquio", reinando no rosto burguês deste carioca "mascarado" perdido no PT, com sua fleuma de criminalista a "serviço do povo"... E a cara e corpo de paralelepípedo do Buratti, a imagem do chumbo na alma, a bruta determinação da vingança pelos desencantos sofridos na casa da Mãe Joana... E o Delúbio, se desfazendo entre dentes tortos, sorrisos torpes entre barbas moles.

Ah... a volúpia das barrigas, os cachaços gordos, as narinas infladas de Garotinho e sua ambição malévola? E o governo do Rio de pernas para o ar, como as pernas gordas de Rosinha se despejando dentro do barco no Pantanal, como uma rã se suicidando?

E no meio das expressões fisionômicas das serpentes, o rosto plácido de Francenildo, a imagem do povo desvalido, bastardo, ignaro, fora da vida social e de repente arrojado dentro da História, o povo que veio atrapalhar o governo "do povo"... E o João Paulo Cunha, ícone puro da hipocrisia petista, que tenta imitar esta placidez proletária, fingindo que é puro? No entanto, nota-se um sorriso levíssimo em sua cara "inocente", quase nada, um tênue deboche por trás da falsa humildade de militante pobre. E a catadura de Mentor com sua voz fininha, e o Aldo Rebelo, tarefeiro, duro como uma espingarda, apelidado otimamente de "boneco do carnaval de Olinda", e a peruca do Bispo Rodrigues, e a cara do Okamoto se recusando a abrir o sigilo onde moram todas as verdades do Lula — Okamoto mentindo diante do verdadeiro petista, legítimo, o honrado Paulo Venceslau, que descobriu o pré-valerioduto há cinco anos em São José do Rio Preto e foi expulso por Lula, e o Garibaldi Alves (que eu adoro) com o sorriso do nordestino que tudo sabe, raposa zombeteira, encaracolado como uma cobra cínica, gozando a sordidez daqueles rituais, e a maravilhosa confissão daquele Poletto que se declarou um bêbado para defender o PT, que estava de porre quando falou dos dólares de Cuba, e o Gushiken, secando como um Ho Chi Min empalhado, e o Valério, careca como um pênis que a todos estuprou, o sedutor que deflorou o PT, sem um esgar, uma lágrima, com aquela cabeça de Brancusi, como a cúpula do Congresso que ele comprou, e o feixe de nervos de Bittar partindo para a porrada com o Delcídio de argênteos cabelos, deixando ver que ele e os seus petistas usam a "democracia" como um pretexto e ficam loucos quando ela prevalece, como foi no relatório magistral da CPI?

Se alguma coisa ficou variegada e polimorfa no país, foi a mentira — nossa tradição ibérica que essas caras todas honram e preservam. Já tivemos brados de honradez, socos nas mesas, babas indignadas nas negações em tribunais, hipócritas lágrimas de esguicho, punhos batidos no peito e clamores a Deus, mas hoje temos a maneira petista de mentir, que muito enriqueceu esse torto sentimento. Mentira para eles é uma tarefa revolucionária, apenas uma necessidade da ação e luta, mentir é um dever, quase uma honra, um pecadilho para a grandeza de sua missão. É uma mentira necessária dentro de uma mentira maior, em torno da qual o Lula orbita, como um astronauta populista, flutuando graças à ignorância da população.

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