Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, novembro 02, 2005

ZUENIR VENTURA Onde a violência é pior?

O GLOBO


No dia em que saiu publicada a pesquisa da Fundação Getulio Vargas com o ranking das melhores e piores capitais do país em qualidade de vida, eu estava em São Paulo, 11 colocada, com 18,91 pontos acima da média nacional, logo abaixo do Rio (20,50), em 10 lugar, ambas muito distantes da campeã Brasília (113,52). Em seguida, ainda com base no ICV (Índice de Condições de Vida), vinham as outras 24 cidades pesquisadas: Vitória, Curitiba, Belo Horizonte, Palmas, Goiânia, Florianópolis, Campo Grande... até as últimas, Belém e Rio Branco.


De lá também assisti pela tv à mais um lance da interminável guerra da Rocinha, a da morte do traficante Bem-Te-Vi (sem falar nos desdobramentos). Só por essas imagens — gente em pânico correndo do tiroteio, carros fugindo na contramão — achei que o quase empate foi injusto com São Paulo. Embora a violência lá possa ser maior até do que a carioca em termos estatísticos, nunca soube de algo parecido com o que tem acontecido no Rio, nada na escala das nossas batalhas campais.

Na avaliação geral, a FGV levou em consideração 12 itens, entre os quais violência, vandalismo, poluição, serviços. O mais curioso da pesquisa é que o resultado revela menos o que as cidades são e mais o que os habitantes acham que elas sejam. Acima dos problemas, procurou-se medir a percepção deles por parte dos que nelas vivem, ou seja, o grau de satisfação, ou de insatisfação, com o lugar onde moram.

Mas isso significaria que o fenômeno da violência é menos visível no Rio, onde está por toda a parte, do que em São Paulo, onde a periferia fica na periferia, o que parece impossível. Talvez se possa avançar outra hipótese, a de que o carioca, apesar dos pesares, tem com os problemas e mazelas de sua cidade uma paciência e uma tolerância maiores do que as dos paulistas com a sua. Ou amor incondicional, bairrismo à toda prova, inclusive à prova de bala. Ou será resignação? Será que já ultrapassamos a fase da indignação, do protesto, da raiva para cairmos no desânimo, na apatia, na anestesia, enfim?

De qualquer maneira, é triste constatar a que ponto chegamos. Houve um tempo em que as duas maiores capitais brasileiras discutiam para saber qual era a melhor. A rivalidade produziu bons momentos de humor, como o de Vinicius de Moraes dizendo que o problema de São Paulo era que, por mais que se andasse, não se chegava a Ipanema. Ou o de Bussunda, respondendo à pergunta: "Qual o lugar mais estranho onde você já fez amor?" Quando se esperava que ele dissesse, como outros entrevistados, "em cima da pia da cozinha", "no meio de uma escada", ele respondeu: "São Paulo."

Hoje se discute para saber qual é a pior.

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