Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, novembro 18, 2005

EDITORIAIS DE O GLOBO

Memória curta


Sejam quais forem os desdobramentos da crise política e o futuro do ministro Antonio Palocci, está colocada definitivamente na agenda de discussões a proposta de um ajuste fiscal de longo prazo. Queiram ou não setores do PT, da esquerda e do governo Lula, a realidade da economia brasileira impõe o tema, mencionado com o destaque devido pelo ministro no depoimento prestado quarta-feira no Senado. A questão já ganharia relevância por ser o motivo do choque entre Palocci e a chefe da Casa Civil, ministra Dilma Rousseff, contrária à austeridade fiscal. Mas o tema é importante por si mesmo, devido à situação limite em que se encontram as contas públicas.

O governo Lula — a que não se pode deixar de creditar o mérito de um corajoso ajuste que evitou o descontrole da inflação — testemunha o esgotamento de um padrão de administração fiscal lastreado no aumento das receitas tributárias e no corte dos investimentos públicos. Tudo por não haver redução nos gastos de custeio e ganhos de eficiência nas despesas. Desde a estabilização da moeda, com o Plano Real, em 94, o equilíbrio e o ajuste das contas públicas têm sido feitos por essa via.

Foi assim que a carga tributária, do início da era FH em diante, passou de 28% para 37% do PIB — de longe a mais elevada no bloco das economias emergentes — enquanto os investimentos encolheram 0,5% do PIB (de 1,1% para 0,6%). Até autoridades reconhecem que o modelo chegou ao fim. Se Brasília tentar ampliar essa carga, será inexorável a disseminação da informalidade e da sonegação. O que acontecerá, como bem alertou Palocci, se as despesas públicas correntes não financeiras continuarem a inflar sem controle. Por uma série de razões ---- a Previdência, o custo da máquina, gastos sociais desmesurados, dispositivos constitucionais etc. --- essas despesas têm crescido mais que a economia. De 1994 a 2005, subiram 6% do PIB.

O bom senso aconselha Executivo e Congresso a levarem a sério o assunto. O ministro acenou para o risco de mais impostos se esses gastos não forem contidos. Há outro: inflação. Mas há no governo quem não considere isto um problema, esquecendo-se dos perigos da reindexação, ante-sala de um novo ciclo de inflação em alta, com todas as mazelas sociais decorrentes da elevação dos preços. É curta a memória de parte da elite brasileira.


Arquivo do blog