Entrevista:O Estado inteligente

domingo, novembro 20, 2005

DORA KRAMER A palavra do presidente

OESP

 

A cada entrevista, discurso ou referência que o presidente da República faz sobre assuntos de interesse nacional, segue-se um jogo de adivinhações pelo qual se busca interpretar nas entrelinhas o real significado de suas palavras.

Por exemplo, o que teria querido dizer Luiz Inácio da Silva quando, na entrevista a emissoras de rádio na sexta-feira, falou em "consertar para melhor" a política econômica?

Teria dito que vai alterar seus rumos e abrir a porta para a saída de Antônio Palocci do Ministério da Fazenda ou foi só uma força de expressão para ganhar tempo e preparar alguns ajustes de forma a desanuviar o ambiente eleitoral?

A celeuma instalou-se e cada um interpretou a frase como quis. Uns achando que não muda nada, outros apostando em alterações significativas.

Conclusões, convenhamos, meramente impressionistas, pois as observações feitas por Lula a respeito das divergências internas não orientaram certezas. Ao contrário, lançaram mais interrogações no ar.

Disse Lula: "Por enquanto eles estão debatendo. Quando terminarem o debate trarão à minha mesa e, junto com a Comissão de Política Econômica do Congresso, pegaremos essa tese, transformaremos numa política pública de governo e aí a Dilma, o Palocci, o ministro do Planejamento, o presidente Lula, o ministro da Agricultura, a ministra do Meio Ambiente, todos passarão a defender a política defendida pelo governo."

Quando, como, onde e sob quais critérios pretende arbitrar sua "política pública de governo", visto já viver o último ano de seu mandato, o presidente não esclareceu, limitando-se a considerar o embate de idéias "salutar".

Como dinâmica dialética não resta dúvida, é saudável e democrático, mas ao presidente impõe-se a necessidade de dizer claramente o que pensa a respeito das questões em pauta, sejam elas de natureza econômica ou política.

Se não o faz, tem a vantagem de evitar comprometimentos e cobranças posteriores, mas contrata para si a desvantagem da perda de credibilidade como governante.

Ao tentar se preservar do prejuízo de uma tomada de posição, Lula acaba solapando seu capital de confiabilidade absolutamente primordial para que se apresente ao eleitorado em condições de reivindicar a renovação de seu mandato.

Quando se dedicava exclusivamente ao exercício da oposição, na hora da disputa eleitoral Lula tinha o benefício da dúvida, a prerrogativa dos que ainda não foram testados. Em 2006, será examinado à luz dos quatro anos passados no governo.

Precisará ser digno de crédito e é justamente este atributo que Lula agride quando, como presidente, opta pela ambigüidade em detrimento da precisão.

Sabe-se que na vida sindical e partidária de Lula a dubiedade no manejo de posições divergentes sempre foi sua marca e, em boa medida, o segredo de seu sucesso.

No PT, por exemplo, atuou sempre de forma a evitar a arbitragem explícita e, com isso, foi sobrevivendo incólume na função de líder acima das querelas das tendências.

Nos momentos cruciais, aqueles que antecediam a decisão da candidatura à Presidência, apresentava seu programa mínimo de exigências para representar o partido na eleição e obtinha o pretendido com apoio de moderados e radicais.

Foi assim em 1994, quando impôs a preliminar da aprovação da política de alianças ao arrepio da posição das correntes mais à esquerda e, de novo, em 2002 impôs suas condições: a profissionalização da campanha e a abertura da coalizão para parceiros de centro-direita.

Como presidente, Lula tenta atuar na mesma lógica, mas não leva em conta a diferença abissal entre uma situação e outra. Um governante cujas palavras não merecem fé pode até dispor da prerrogativa de dizer qualquer coisa sem com isso provocar maiores prejuízos, mantendo até níveis razoáveis de popularidade.

Hoje em boa medida ocorre isso com Lula. Ele fala e o País não o leva ao pé da letra, já acostumado com a ausência de uma relação de causa e efeito entre ação e pensamento.

O problema será mais à frente quando, no palanque da reeleição – se houver –, o candidato vier a ser examinado não pela ótica da popularidade, mas pela percepção de confiabilidade.

Time estadual

Na convenção do PSDB, sexta-feira, o ex-ministro da Educação Paulo Renato de Souza transitava no salão em campanha aberta para ser candidato ao governo de São Paulo. Na pasta, o material básico que ia entregando a quem encontrasse: uma publicação com currículo, realizações no ministério, coletânea de artigos e uma carta aberta ao "prezado companheiro tucano".

Nela, apresenta-se como candidato e, a título de aval, reproduz elogios feitos a ele por Fernando Henrique Cardoso no prefácio do livro que escreveu sobre o período no ministério. Paulo Renato dedica-se à candidatura em tempo integral. "Já percorri o Estado quase todo."

O outro postulante, vereador José Aníbal, também circulava em figurino de Palácio do Bandeirantes, mas bem mais discreto.


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