Até mesmo o superconservador Banco Central do Brasil começa a admitir que as forças criadoras de inflação no Brasil estão em baixa.
Segue-se que a proteção contra a inflação (juros altos) pode ser abrandada. É o que, em síntese, pode ser aferido pela leitura da Ata do Copom ontem divulgada pelo Banco Central.
Mas isso não é tudo. Da reunião do Copom para cá, coisa importante aconteceu no salão. A ameaça global não é mais a inflação, mas o contrário dela, a deflação. E as operações interbancárias da moeda mais importante do mundo vão cobrar juros próximos do zero e isso sugere potencial desvalorização do dólar em relação às moedas fortes. Se essa reunião tivesse sido realizada com esse novo dado global, provavelmente a redução dos juros aqui já teria ocorrido.
A crise tem seu epicentro nos Estados Unidos. Por aqui, os bancos não caíram na lambança cometida pelos bancos americanos e europeus. Mas a desaceleração chegou de repente e com força por meio de três correias de transmissão acionadas de fora: pela trombose do crédito, pela queda do consumo e das importações globais e pela derrubada dos preços das commodities.
O estancamento do crédito externo cortou o acesso às exportações brasileiras lá fora. Além disso, vem impedindo ou está dificultando a rolagem de pelo menos US$ 60 bilhões anuais em empréstimos externos.
Isso leva o exportador brasileiro a correr ao crédito interno para seu capital de giro. E obriga o devedor interno em dólares a levantar recursos em reais para comprar moeda estrangeira ou a usar seu caixa para comprar os dólares e liquidar a dívida.
Apesar da injeção direta de recursos nos bancos (queda no compulsório) providenciada pelo Banco Central, tantos têm sido os elefantes a beberem da mesma cacimba interna que falta para os bichos mais miúdos. E o estancamento do crédito no País está derrubando o consumo.
A outra correia de transmissão é a queda do consumo global, especialmente nos Estados Unidos. É o que determina o aparecimento de sobras internas (encalhe) de manufaturados antes exportados e a queda dos preços das commodities. Os dois elementos estão reduzindo as receitas com exportações. E o resultado até agora foi a puxada dos preços do dólar no câmbio interno.
Do ponto de vista da inflação, esse efeito é ambíguo. O encalhe de produtos industrializados e a queda dos preços das commodities ajudam a conter a inflação. Mas a alta do dólar age em sentido oposto: encarece os produtos importados e as mercadorias produzidas internamente, mas cotadas em dólares.
A novidade do juro externo zero tende a enfraquecer o dólar em relação às demais moedas, inclusive em relação ao real. Falta saber se esse efeito será suficiente para contrabalançar o da escassez de dólares que advirá da rolagem da dívida externa.
Por outro lado, a retração do crédito, a queda da atividade econômica e a ameaça de perda do emprego já estão atuando para desacelerar o consumo, o que ficou mais evidente no setor de veículos (veja o gráfico).
E, se o principal argumento do Banco Central até aqui para puxar pelos juros (demanda excessiva) perde força, também fica claro que ele terá agora que afrouxar a política monetária.
Entenda
Não é tudo - No Brasil, as reclamações de analistas e de empresários dão a impressão de que basta derrubar os juros básicos (Selic) para que os problemas da economia desapareçam.
Na economia global, já se vê que nem juro zero garante o crescimento. E, aqui, nem o juro mais alto do mundo impediu (no terceiro trimestre) um crescimento de quase 7% ao ano.
Antes de serem a causa dos problemas econômicos do Brasil, os juros altos são conseqüência de mazelas crônicas: custos altos de produção, carga tributária excessiva, despesas do governo, falta de poupança interna e tanta coisa mais
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