Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, maio 02, 2008

Talvez agora reclamem das agências de risco


Artigo - ALEXANDRE SCHWARTSMAN
Folha de S. Paulo
2/5/2008

A ELEVAÇÃO da avaliação de risco do Brasil a grau de investimento pela agência S&P não surpreende. Era, creio, um dos eventos mais esperados do ano e, em particular, já em maio de 2007 meu colega Cristiano Souza publicou trabalho no qual afirmava ser muito alta a probabilidade de que pelo menos uma das agências promoveria o país a essa categoria ainda na primeira metade de 2008.
Há pelo menos duas conseqüências importantes que deverão resultar desse fato, mas, antes de me aprofundar nelas, permita-me uma breve reflexão sobre o caminho que nos trouxe ao tão desejado grau de investimento. Da forma como o vejo, é o resultado da persistência, ao longo de dez anos, de uma política econômica coerente, baseada no tripé responsabilidade fiscal, câmbio flutuante e metas de inflação.
Não que a execução desse regime tenha sido exemplar. A responsabilidade fiscal tem sido guiada pelo objetivo parcial de redução da dívida pública (que foi essencial à recente promoção), mas presta pouca atenção à questão do gasto público, em especial o gasto corrente, cujo principal efeito é limitar a capacidade de crescimento de longo prazo do país.
No entanto, o foco das agências de risco não é o crescimento, ou o bem-estar da população, ou mesmo uma análise completa de todos os aspectos da economia de um país. Trata-se tão-somente de uma avaliação acerca da probabilidade de que o país pague aquilo que deve, e, nesse aspecto, a melhora da economia brasileira é visível e dois fatores merecem especial atenção.
Em primeiro lugar, a política econômica atual é vista como sustentável, ou seja, capaz de ser mantida, pois, além de implicar estabilidade, mostrou-se coerente com a retomada de um ritmo de crescimento mais forte, desmentindo os críticos que viam na busca da estabilidade o abandono do crescimento. Em segundo lugar, a promoção foi obtida em meio a séria crise internacional, mostrando que os esforços pela melhora da capacidade de resistência da economia a choques (como a acumulação de reservas) valeram a pena.
Isto dito, a primeira grande conseqüência da promoção do país deve ser uma redução adicional do custo de capital para os setores público e privado. Grandes investidores internacionais que, por motivos regulatórios, enfrentavam limites à ampliação de seus investimentos no Brasil agora poderão fazê-lo, trazendo ao país recursos antes inacessíveis. A principal implicação desse fenômeno deverá ser uma aceleração suplementar do investimento e, portanto, do crescimento, ampliando os dividendos da estabilidade.
A outra grande conseqüência é o reforço à continuidade dessa política. Uma vez obtido o grau de investimento, será muito custoso perdê-lo, o que gera incentivos poderosos à manutenção (e, com um pouco de sorte, aprofundamento) do atual regime de política. Aventuras populistas e idéias exóticas deverão ter menor respaldo, empurrando nossos keynesianos de quermesse cada vez mais para as margens da formulação de política.
Claro que haverá protesto. Em linha com a valorização dos ativos brasileiros, a moeda deverá se apreciar, gerando choradeira por parte dos suspeitos de sempre, que ainda se recusam a ver a ligação entre a melhora do país e a apreciação da moeda, bem como o efeito do gasto público sobre a taxa de câmbio. Talvez agora reclamem das agências de risco...

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