Entrevista:O Estado inteligente

segunda-feira, janeiro 07, 2008

Sem educação não haverá solução



Artigo - Marco Antonio Rocha
O Estado de S. Paulo
7/1/2008

Se ainda subsiste alguma sombra de dúvida nos meios políticos e nas autoridades públicas sobre a íntima relação entre a qualidade do ensino num país e seu nível de desenvolvimento - entendido não apenas no sentido econômico do termo, mas englobando o aspecto cultural, político, social, artístico, etc. -, esta vai sendo eliminada pela presença cada vez mais importante, no cenário internacional, de países emergentes com a característica comum de terem adotado e implementado, desde a segunda metade do século passado, políticas firmes de melhoria planejada da qualidade do ensino em todos os níveis.

Os resultados que tais políticas exibem, como impulsionadoras de um desenvolvimento de qualidade, em países como Coréia, Taiwan, Tailândia, Índia, etc., e que já haviam sido notados há muito mais tempo em relação ao Japão - um país do qual se pode dizer ter sido resgatado da Idade Média pela educação -, não deixam espaço para mais tertúlias sobre se se deve ou não formular e pôr em prática um programa estruturado, de médio e longo prazos, de melhoria da qualidade do ensino brasileiro em todos os seus níveis.

Neste momento, até o presidente Lula - que, para muitos, é prova de que o sucesso pode ser alcançado sem muita bagagem educacional e, do ponto de vista da escalada pessoal, como a dele, isto até é verdade, como também nos casos de muitos homens de negócios bem-sucedidos - deve estar convencido de que para uma nação, uma sociedade humana, a máxima correta é: sem educação não há mesmo solução! Haja vista a falta de gente capacitada para tocar bons projetos com que luta o seu governo.

Como a qualidade do ensino tem início no bê-á-bá, isto é, no ensino fundamental, e uma vez que este é atribuição principalmente das prefeituras, é muito importante que neste ano de eleições municipais o tema faça parte dos debates nas praças públicas, nas farmácias de quarteirão, nos mercados municipais, nas estações rodoviárias e ferroviárias, onde quer que candidatos a vereadores e prefeitos estejam pedindo a atenção de eleitores - e mesmo entre estes.

É com essa esperança que recomendamos a quem tenha acesso à internet a leitura de um estudo da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), divulgado em novembro último, feito sob encomenda do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (Etco), sobre a “qualidade do gasto público no Brasil: sugestões para melhorar o resultado de políticas públicas, sem aumento de impostos”. E nele o capítulo escrito pela professora Maria Dolores Montoya Diaz sobre a “qualidade do gasto público em Educação, no Brasil”.

Há mais de 40 anos, em 1966, como nos diz ela, teve início um debate sobre a efetividade dos recursos aplicados no ensino suscitado por um relatório divulgado nos EUA sobre Equality of Educational Opportunity, que ficou conhecido como Coleman Report. O relatório indicava que os fatores mais importantes para explicar o desempenho escolar dos estudantes eram, em primeiro lugar, a família, em seguida, os colegas, ficando a escola propriamente dita com um papel insignificante.

Daí surgiu a indagação que ainda hoje preside certos conclaves sobre o tema, e também certas decisões de governos: para melhorar a qualidade do ensino, o que valerá mais, mais dinheiro ou uma melhor gestão das escolas, com maior entrosamento com as famílias dos estudantes e outros fatores?

Surpreende um pouco a assertiva da professora Maria Dolores de que “apenas recentemente se verifica a chegada desta discussão ao Brasil”.

E, de fato, o que qualquer eleitor brasileiro pode testemunhar é que nos discursos dos candidatos de qualquer nível, municipal, estadual ou federal, há sempre a menção ou a promessa de mais recursos para a educação, sem nenhuma, ou quase nenhuma, referência a uma verdadeira política de ensino ou a um programa de ensino objetivando a melhoria da sua qualidade.

E o problema, visto sob o ângulo da quantidade de dinheiro, ganhou até maior destaque, recentemente, segundo observa a professora Maria Dolores, com as manchetes que noticiavam, em setembro do ano passado, o relatório anual da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) sobre educação. A do Estado dizia País segue em último no investimento em educação e a da Folha, Brasil é o que menos investe em educação. Referiam-se, todavia, ao gasto médio anual por aluno, uma das estatísticas do relatório. Mas no gasto em educação como porcentagem do PIB a posição do Brasil até surpreende, pois, numa escala de 3,7% até 8% do PIB, entre 31 países, o gasto do Brasil corresponde a 6,6% do PIB e é maior do que o da média da OCDE, de 6,3% (dados de 2003).

Deixando de lado a importante metodologia desenvolvida pela professora - que não seria possível esmiuçar neste espaço -, o que interessa é que ela procura relacionar os gastos municipais por aluno em diversas cidades brasileiras com o resultado escolar medido pelo Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), um indicador de qualidade educacional elaborado pelo Ministério da Educação.

E qual a conclusão? Que o simples aumento porcentual dos gastos com educação não garante automaticamente a melhoria da qualidade do ensino. O que não quer dizer que a melhoria seja possível sem recursos. O importante é que, antes de elevar gastos a esmo, é preciso saber quais são, em cada cidade e escola, os fatores que efetivamente respondem pela melhoria e quanto de recursos é necessário para influir sobre eles.

Em suma, o estudo avaliza algo que já estava no relatório anual da OCDE, mas não recebeu o devido destaque, ou seja, que o gasto é um pré-requisito para se prover ensino de alto nível, mas ele apenas não é suficiente para alcançar altos níveis de resultados, que só são possíveis com um uso eficaz e bem direcionado dos recursos.

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