O Globo |
4/1/2008 |
Duas situações definem bem o espírito apequenado com que o governo lidou com a derrota parlamentar que levou ao fim da CPMF. Ao anunciar o pacote de medidas compensatórias, que inclui a quebra da promessa de não aumentar impostos, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, teve a pachorra de declarar em uma entrevista coletiva que a promessa fora feita em 2007, e portanto, aumentar imposto em 2008 não era quebra de compromisso. Ao mesmo tempo, sabe-se agora que o governo, através de uma medida provisória editada nos últimos dias de dezembro, autorizou o aumento da remuneração do Bolsa Família a partir deste ano, e incluiu entre os beneficiários os menores de 15 a 17 anos, numa mais que discutível ação para reduzir a criminalidade nessa faixa de idade. E por que a medida provisória ao "apagar das luzes" de 2007? Porque algum assessor esperto alertou o presidente de que uma legislação aprovada em 2006 ampliou o prazo de proibição de ações de governo que criem ou aumentem programas governamentais que possam influir na decisão do eleitor em um ano eleitoral. É claro que, mesmo aprovado no ano passado, este gasto adicional vai contra o espírito da legislação em vigor e poderá ser derrubado na Justiça, mas a oposição passará a ser apontada como inimiga dos pobres, pois impediu que o governo generosamente aumentasse os repasses do Bolsa Família. Por outro lado, para sorte da oposição e prejuízo do cidadão comum, ao aumentar o IOF para a mesma alíquota da extinta CPMF, o governo deixou claro que foi buscar um pedaço desse tributo extinto. E poderá ser acusado de não ter permitido que os benefícios do fim do imposto cheguem ao bolso do cidadão. Essa "esperteza" com que o governo lida com os prazos, antecipando-os ou dilatando-os de acordo com suas conveniências, mostra bem como não se sente responsável por acordos políticos que firma com a sociedade, que estava representada naquela noite pela oposição e os dissidentes do governo. Os cortes previstos não atingem gastos já existentes, mas apenas os novos, que estavam previstos no Orçamento de 2008 baseados na receita futura da CPMF, que encheria as burras do governo com um dinheiro extra que poderia financiar a continuação da gastança oficial, com novas contratações de funcionários públicos ou promessas de aumentos. O fim da CPMF foi um momento histórico, e não apenas no aspecto político, impondo limites à atuação majestática do Executivo. Pôs fim a quase quinze anos de aumentos de imposto. A oposição achava que em algum momento essa tendência teria que ser invertida, e se dispôs a dar um "basta", jogando a seta para baixo. Especialmente o novo Democratas, que encontrou um nicho de atuação junto à classe média urbana que promete dar frutos. Seus líderes admitem que passaram os últimos cinco anos tentando descobrir como fazer oposição a um governo popular - com exceção do período em que o mensalão esteve em evidência - e com a economia crescendo. A caneta cheia de tinta e os cofres abarrotados de dinheiro para os programas assistencialistas, e o microfone, são considerados pelos oposicionistas "as partes mais eficientes desse governo". Essa ligação direta com o "povão" faz com que ele seja sempre bem avaliado pessoalmente, e essa avaliação atinja por osmose o governo, cuja ineficiência fica em segundo plano. Mas, na visão oposicionista, o que seria "a agenda da sociedade" não está sendo cumprida porque o governo é incompetente. A análise oposicionista, sobretudo no DEM, é que a sociedade está sangrando na falta de um sistema de saúde eficiente, na insegurança, nos impostos, e quem conseguir se conectar com esse sentimento, independentemente de Lula ter aprovação altíssima, vai buscar o voto que interessa. Nessa análise, Lula não conseguirá transferir essa simpatia para outros candidatos, e esse é o grande ponto. "Não podemos errar por não fazer, ousar é a nossa palavra de ordem", é o lema das novas lideranças do Democratas, já classificados de "os maluquinhos do DEM" pela líder petista no Senado Ideli Salvatti. Tanto os democratas quanto os tucanos pretendem avançar na agenda da sociedade para formar essa nova maioria. Nessa visão oposicionista, o Brasil velho, caracterizado pelas políticas assistencialistas do governo Lula, vai até 2010. Eles acreditam que, com a CPMF, conseguiram fazer uma ligação entre o peso no bolso do cidadão comum e os festejos do governo de aumento de arrecadação cada vez maiores. Mostrando o efeito da carga tributária alta, que não favorece o cidadão em serviços essenciais e só tira seu dinheiro. Essa é a questão que esperam ver explodir na campanha eleitoral deste ano, especialmente nas cidades médias e grandes centros urbanos, onde as pessoas vão exigir que esse crescimento chegue na casa do cidadão. Diante do aumento dos impostos, a oposição vai fazer uma campanha para culpar o governo pelo fato de que o fim da CPMF não teve conseqüências na queda dos preços, especialmente dos serviços como água, luz, gasolina, onde o governo poderia interferir, ou mesmo as agências reguladoras, para obrigar as empresas a dar o desconto. Com a possibilidade de crise na economia americana, com prováveis reflexos no crescimento do mundo, e diante dos receios com a subida da inflação, os oposicionistas têm uma imagem que pode vir a se transformar em mote de campanha eleitoral. Comparam Lula à cigarra da fábula de La Fontaine, que só faz cantar no verão. Dizem que chegou a hora de Lula virar formiga e reduzir os custos do governo, pois já passou o verão e está chegando o inverno. |
Entrevista:O Estado inteligente
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