Entrevista:O Estado inteligente

sábado, janeiro 19, 2008

Homicídios caem nas capitais e sobem no interior

Os oásis estão acabando

Os homicídios diminuíram nas capitais. No interior,
porém, o bangue-bangue aumentou


Naiara Magalhães

Agnaldo Lima


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Mudar-se para o interior, a fim de escapar da insegurança das grandes cidades, deixou de ser uma boa idéia. Hoje, segundo estudo do sociólogo Julio Waiselfisz, ao menos no que diz respeito aos homicídios, a geografia da criminalidade se inverteu. Segundo o "Mapa das mortes por violência", divulgado no mês passado, o número de assassinatos por 100 000 habitantes vem se mantendo inalterado nas capitais e subindo no interior já há quase uma década. O crescimento da taxa de homicídios nas regiões metropolitanas despencou de 6,1% (média registrada entre 1994 e 1999) para 0% (de 1999 a 2004). Enquanto isso, o índice de assassinatos no interior subiu, na média, quase 5% entre os anos de 1999 e 2004. Em alguns municípios, como Coronel Fabriciano, em Minas Gerais, a taxa de homicídios chegou a aumentar 35 vezes. O "Mapa das mortes por violência" foi feito com base no "Mapa da violência dos municípios brasileiros", também de autoria do sociólogo.

A queda dos assassinatos nas capitais deve-se, em boa parte, à criação, em 2000, ainda no governo Fernando Henrique Cardoso, do Fundo Nacional de Segurança Pública. Destinado a financiar projetos de prevenção e repressão à criminalidade, ele beneficiou prioritariamente as cidades mais populosas e com altas taxas de homicídios. Por causa desses critérios, as capitais e regiões metropolitanas acabaram recebendo mais recursos do que as cidades do interior (que, no início da década, ainda apresentavam baixas taxas de assassinatos). Assim, puderam investir mais em inteligência e equipar e treinar melhor seus policiais. Os resultados são os que se vêem agora: em capitais como São Paulo, Vitória, Manaus e Cuiabá, as reduções nas taxas de homicídios, desde 1997, variam de 22% a 26%.

W Valente/AE

A interiorização da violência, por seu turno, também está ligada a um aumento de recursos – mas não de origem governamental. O fato é que, nos últimos anos, muitos municípios do interior se tornaram pólos de desenvolvimento econômico, sem que o crescimento da riqueza fosse acompanhado de medidas efetivas de prevenção e punição à criminalidade. "A riqueza atrai contingentes populacionais em busca de oportunidades. Se a segurança não acompanha esse crescimento, o aumento da violência é certo", afirma Waiselfisz. Macaé, no Rio de Janeiro, é um caso exemplar. A cidade, a 182 quilômetros da capital fluminense, desenvolveu-se a partir da exploração de petróleo e gás. Em 1997, uma mudança na legislação aumentou o pagamento de royalties aos municípios produtores dessas matérias-primas e permitiu que empresas privadas passassem a operar no setor, o que aqueceu enormemente a economia local: o PIB per capita da cidade cresceu quase seis vezes e chegou a incríveis 120 000 reais em 2004 – oito vezes o da capital paulista. A taxa de homicídios, por sua vez, cresceu duas vezes e meia desde 1997. Em 2004, 110 em cada 100 000 macaenses foram assassinados – mais do que o dobro do número registrado no Rio de Janeiro no mesmo ano. O aumento da violência no interior não vem ocorrendo apenas em municípios com PIBs impressionantes como o de Macaé. Em Santa Cruz do Capibaribe, no agreste pernambucano, a taxa de homicídios subiu 69% na última década. Embora a cidade tenha índices econômicos bem mais modestos que os do município fluminense, ela também registrou um forte incremento na economia nos últimos anos (nesse caso, resultante do desenvolvimento das fábricas de confecção de roupas da região).

Quando Waiselfisz constatou a interiorização da violência pela primeira vez, com base nos dados produzidos até 2002, não podia assegurar que não se tratava de casualidade. "Só com a análise das últimas estatísticas é que ficou claro que essa é, de fato, uma tendência", diz. Um novo mapeamento do crime no Brasil, a ser divulgado no fim do mês, não aponta mudança de rota. A continuar nessa toada, portanto, em breve, as casas de janelas sempre abertas do interior vão ser só uma lembrança.

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