Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, novembro 16, 2007

A Volta do Idiota, de Llosa, Mendoza e Montaner

Livros
Dentes, pra que te quero

Os ensaístas que dissecaram o idiota latino-americano
alertam para os perigos da nova esquerda carnívora

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Trecho do livro

Os jornalistas Plinio Apuleyo Mendoza, colombiano, Carlos Alberto Montaner, cubano, e Álvaro Vargas Llosa, peruano, tiveram uma felicidade rara na vida dos escritores. O trio cunhou uma expressão definitiva: "perfeito idiota latino-americano". Sob essa rubrica, abriga-se a barulhenta turma dos que atribuem ao capitalismo todos os males do mundo, dos que abominam os Estados Unidos e admiram o comunismo tropical de Cuba. Pouco mais de dez anos depois de O Manual do Perfeito Idiota Latino-Americano, a trinca reuniu-se novamente para barrar a marcha do socialismo – encarquilhado, ainda que com roupagem "do século XXI" – sobre este continente. A Volta do Idiota (tradução de André Pereira da Costa e Luciano Trigo; Odisséia; 240 páginas; 34,90 reais), que chega agora às livrarias brasileiras, é uma análise devastadora da nova onda de idiotia que vem afligindo a América Latina, com representantes vistosos na Venezuela, na Bolívia, no Equador. O livro também traz duas outras expressões que prometem se popularizar: esquerda carnívora e esquerda vegetariana. A primeira é representada por caudilhos autoritários como Hugo Chávez. Na sua versão vegetariana, a esquerda adaptou-se ao mundo globalizado e fez as pazes com os fundamentos da economia de mercado e do estado democrático. Michelle Bachelet, presidente socialista do Chile, é o melhor exemplo dessa corrente.

Incluído entre os vegetarianos, o presidente Lula é tratado com condescendência no livro. Seu compromisso com a responsabilidade fiscal é elogiado, com a ressalva de que o crescimento econômico do Brasil é pífio se comparado aos resultados de emergentes como China e Índia. A Volta do Idiota responsabiliza o "sistema político brasileiro" pela impossibilidade de aprovar reformas que aliviem a carga fiscal que pesa sobre as empresas – como se o governo que anda aí brigando para manter a CPMF tivesse algum desejo de maneirar a mordida tributária. Em uma perífrase desajeitada, os autores ainda afirmam que Lula "não combateu como deveria" a "corrupção do partido governista". Em entrevista a VEJA, Álvaro Vargas Llosa – filho do romancista Mario Vargas Llosa, que assina o prólogo de A Volta do Idiota – admite que o livro pega leve com Lula, por razões estratégicas: "Ele merece nosso apoio por ter se afastado, até agora, da tentação populista que assola a América Latina", diz.

As trapalhadas peronistas do argentino Néstor Kirchner, o indigenismo de fancaria do boliviano Evo Morales e os delírios nacionalistas do equatoriano Rafael Correa são devidamente destroçados em A Volta do Idiota. O melhor capítulo é dedicado ao ditador venezuelano Hugo Chávez, o tiranossauro rex da esquerda carnívora. A formação ideo-lógica de Chávez é examinada em detalhe – e revela uma inusitada parceira entre a esquerda carnívora e a direita mais feroz. O guru político de Chávez foi o fascistão argentino Norberto Ceresole, que chegou a ser conselheiro do general e ditador Viola. A partir das idéias fascistas de Ceresole, Chávez desenhou o caminho para a sua "revolução bolivariana", através da cooptação das Forças Armadas e da concentração de poder, com o progressivo enfraquecimento da democracia representativa. "Na Colômbia, no Peru, no México, Chávez tem financiado ilegalmente ONGs e movimentos políticos próximos ao seu populismo. É uma estratégia mais insidiosa, e portanto mais perigosa, do que as guerrilhas que Fidel Castro financiou nos anos 70", diz Llosa. O idiota mais perigoso é aquele que às vezes mostra esperteza.

DIVISÕES DO JURÁSSICO

Os líderes da esquerda latino-americana segundo
os autores de A Volta do Idiota

A ESQUERDA CARNÍVORA
O ditador da Venezuela, Hugo Chávez, não respeita princípios democráticos básicos como a liberdade de imprensa e o direito à propriedade. É um perigoso dinossauro carnívoro

A ESQUERDA VEGETARIANA
O presidente Lula foi carnívoro na oposição – mas, uma vez eleito, aderiu a regras fundamentais como a responsabilidade fiscal. Tornou-se um dinossauro herbívoro

A função social é um roubo

O socialista francês Pierre-Joseph Proudhon (1809-1865) deixou uma palavra de ordem famosa: "A propriedade é um roubo". Poderia ser um slogan para aquela esquerda que os autores de A Volta do Idiota chamam de "carnívora". Em Reflexões sobre o Direito à Propriedade (Campus/Elsevier; 214 páginas; 39 reais), Denis Lerrer Rosenfield, professor de filosofia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, faz uma defesa candente mas rigorosa do direito individual à propriedade. Se o direito à propriedade é relativizado, argumenta o autor, todos os valores do estado de direito democrático podem ruir. Restrições à propriedade com base em uma vaga "função social" só alimentam a sanha predatória de organizações como o Movimento dos Sem-Terra. O livro não se limita ao tema de seu modesto título: um de seus aspectos mais interessantes é a análise crítica da "democracia participativa" proposta por certas correntes de esquerda (dentro do PT, por exemplo, já surgiu a idéia brilhante de que o presidente deveria ser capaz de chamar plebiscitos nacionais sem a aprovação do Congresso). É por meio de plebiscitos e mobilizações de massa que a esquerda mais radical consegue minar a democracia representativa. "A subversão da democracia se faz hoje por meios democráticos", diz Rosenfield. É o processo que está em curso na Venezuela, onde a nova Constituição de Hugo Chávez, "democraticamente" aprovada por um Congresso submisso ao ditador, prevê que o governo pode expropriar qualquer tipo de bens por motivos de "interesse social".

Carlos Casaes/Ag. A Tarde
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