A economia brasileira continua dando seguidos sinais do bom momento que vive: as vendas aumentam, e as empresas aguardam um bom Natal. A política brasileira continua se afundando na indigência.
A economia internacional está instável, mas se afasta do pior cenário. A crise de energia continua à espreita. As estradas ainda estão péssimas, mas a boa notícia foi o sucesso da licitação de rodovias.
Caíram três helicópteros, um avião executivo e uma empresa aérea. E o governo reduziu os gastos com fiscalização aérea durante a crise. Foi encontrada soda cáustica no leite. O abastecimento de gás está ameaçado.
O desmatamento aumentou de forma assustadora no Pará e em Mato Grosso. Os sindicalistas lutam pelo imposto obrigatório, empresários pelo Sistema S e o governo pela CPMF. Nós outros? Continuamos pagando a conta.
Queria voltar falando do que li e vi de diferente nas férias, mas fica para outro dia. Os fatos acima não esgotam a coleção de más notícias das últimas semanas, mas mostram as permanências: a crise aérea continua, e ela não é assustadora apenas porque provoca desconfortos, atrasos, maustratos aos passageiros. A crise aérea mata. A falta de energia suficiente para o país pode estrangular a boa fase de crescimento que o Brasil atingiu. A crise gerencial do Estado vai continuar produzindo fatos estarrecedores.
Líderes empresariais e sindicais engrossaram o coro contra a CPMF. Pareciam defender o contribuinte.
Até que a ameaça foi em direção ao dinheiro que eles tiram do contribuinte.
A CUT surgiu na vida sindical brasileira dizendo que o imposto obrigatório só mantinha viva a representação pelega. Mudou de lado diante do projeto do deputado Augusto Carvalho.
Falou-se em acabar com o imposto que sustenta o sexagenário Sistema S e, imediatamente, uniram-se lideres empresariais e sindicais para defendê-lo. Não dão notícia de como vão sanar a gritante contradição: o Sistema S foi criado há 65 anos para qualificar o trabalhador brasileiro, e basta o país crescer um pouco que falta mão-de-obra qualificada.
As boas notícias são da consolidação do cenário de crescimento econômico este ano e no próximo. Os economistas Ilan Goldfajn e José Roberto Mendonça de Barros acham que o pior que pode acontecer é o país crescer um pouco menos no ano que vem, acompanhando uma piora do cenário externo. Ilan explica por que os ativos da bolsa se recuperaram tão rapidamente após o susto das subprime: — O que surpreendeu na última queda, após o estouro da crise, foi que os países emergentes escaparam do contágio. O Brasil foi visto como refúgio no qual valia a pena investir, o que é raro em nossa história. Nos Estados Unidos, continuam duas forças negativas: o mercado imobiliário em si e o mercado de crédito.
José Roberto, semanas atrás, passou alguns dias em Nova York.
— Lá eles diziam que era a hora de comprar commodities, e de comprar Brasil, o que significa comprar o Brasil duas vezes — conta.
A economia internacional passou raspando, diz José Roberto, pelo cenário de encerramento do atual ciclo de crescimento, que já dura seis anos.
— O mundo vai crescer menos, o quadro é menos benigno do que era, mas está se afastando o cenário de uma recessão na economia americana. O ritmo de crescimento dos Estados Unidos está em queda, muitos outros eventos vão surgir alimentando a instabilidade.
Não basta um ou outro banco reconhecer em seu balanço que houve perdas.
A dimensão inteira da crise, das perdas, do estrago no crédito ainda não conhecida. Certos dados parciais que saem assustam.
O Comitê do Congresso americano fala em US$ 400 bilhões. Isso é gigantesco — afirma José Roberto.
A alta do petróleo complicou mais a situação da economia americana, que já sofre pressão da contínua e forte depreciação cambial, num mercado muito dependente do produto impor tado.
— Com o petróleo a US$ 100, a inflação nos Estados Unidos pode deixar de ficar comportada — diz Ilan.
O pano de fundo ultrabenigno explica uma parte da grande melhora da economia brasileira nos últimos tempos, mas ele agora, claramente, está se deteriorando.
Por outro lado, grande parte do nível de atividade do Brasil, neste momento, é puxada pela demanda interna. As exportações de alguns setores estão caindo para atender ao mercado doméstico. A economia interna tem força para sustentar o crescimento, mas, obviamente, um cenário de deterioração externa afetará o Brasil.
O fato é que a economia a política têm andado descoladas no Brasil há muito tempo. A incapacidade de o presidente Lula administrar a coalizão, as sucessivas crises no Congresso, a discussão extemporânea da sucessão e a idéia estapafúrdia de um terceiro mandato aprofundam o impasse político.
A economia não pode continuar se sustentando durante muito tempo se o futuro for uma piora externa a crônica crise política.
Os políticos parecem ter feito um pacto suprapartidário para testar, no limite, o apoio da população às instituições. O escárnio diário e generalizado. O PSDB está empenhado em provar que ele pode cometer os mesmos desatinos do governo. Protege o senador Eduardo Azeredo e ofende inteligência do cidadão no caso Cunha Lima. O presidente Lula não quer governar o tempo que lhe deram, quer sempre o próximo mandato. Está já de olho na próxima eleição. Faria melhor se esquecesse 2010, parasse de desmentir o risco de crise energética, saísse, enfim, do palanque governasse o Brasil. Já está quase acabando o primeiro — e melhor — ano do segundo mandato.
Entrevista:O Estado inteligente
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