O Globo |
21/11/2007 |
Não é garantido que a CPMF será prorrogada, como quer o governo. Mas vai ser muito mais difícil do que se poderia supor num primeiro momento, depois que o PSDB decidiu assumir uma postura oposicionista mais rígida, fortalecendo a posição dos Democratas, que escolheram o tema "carga tributária" como principal mote de sua nova versão liberal. Com a postergação da decisão sobre o segundo processo contra o senador Renan Calheiros para dezembro, empurrou-se também a votação da CPMF, cuja segunda votação está prevista para o último dia de atividades legislativas deste ano, um calendário extremamente apertado e sujeito a chuvas e trovoadas. Com a chegada do ano eleitoral de 2008, a oposição começa a testar sua capacidade de enfrentar os candidatos do governo na eleição municipal, uma prévia da correlação de forças para a eleição presidencial de 2010. A maior alteração de imagem está sendo processada pelo Democratas, antigo PFL, que desde 2005 está se preparando para apresentar uma plataforma verdadeiramente liberal como alternativa para o desenvolvimento do país. O que os Democratas acreditam é que estaria na hora de tentar uma experiência liberal, com uma reforma do pacto federativo para diminuir o tamanho do Estado e reduzir a carga tributária. Ao contrário da tendência regional de uma política à esquerda, os Democratas acreditam que há um espaço no país para os liberais na política brasileira, pois os países mais adiantados, neste início do século XXI, estariam tendendo, politicamente, ao conservadorismo. A tentação é afastar-se do PSDB para fortalecer uma identidade própria, o que poderá ser inevitável caso os tucanos não apóiem a reeleição do prefeito Gilberto Kassab. Mas, dependendo das negociações em São Paulo, os interesses regionais dos dois partidos podem continuar firmes, e determinar o prosseguimento da união. Um dos principais apoios do prefeito Gilberto Kassab é o governador José Serra, que deixou na prefeitura grande parte de seus colaboradores. A idéia de apoiar Kassab na reeleição, dando como vice o secretário tucano Andréa Matarazzo, é a solução tentada pelo governador José Serra, com Alckmin concorrendo ao governo e ele, Serra, naturalmente, à Presidência. Resta combinar com o governador de Minas, Aécio Neves, e essa talvez venha a ser a tarefa mais sensível do futuro presidente do partido, Sérgio Guerra. Serra tem ainda no presidente da Associação Comercial, Afif Domingos, do DEM, um secretário importante, a quem designou um programa de desburocratização do Estado. A votação que Afif Domingos recebeu na eleição para o Senado em 2006, quase derrotando o favorito Eduardo Suplicy, dá aos Democratas a certeza de que trabalhar as questões do dia-a-dia da população, como a campanha contra os impostos, é um caminho para identificar o partido com a defesa dos interesses dos cidadãos. Os Democratas não chegam a se apresentar como "libertários", como querem os que se consideram verdadeiros "liberais". Esses preferem o termo "libertário" para evitar qualquer confusão com os "liberais" no sentido usado nos Estados Unidos, onde o termo identifica posturas mais à esquerda. E também para evitar acusações como as que são feitas tanto ao PT quanto ao PSDB, de se tratarem de partidos "liberais" ou "neoliberais". Mas a busca do "estado mínimo", deixando aos cidadãos empreendedores a iniciativa de quase tudo, é uma plataforma política liberal que os Democratas pretendem aprofundar na eleição presidencial, provavelmente apresentando candidato próprio, que hoje seria o governador de Brasília José Roberto Arruda. A carga tributária, que vem crescendo desde o governo de Fernando Henrique para financiar os gastos sociais, seria uma característica social-democrata tanto do PT quanto do PSDB na visão dos liberais do DEM. São essas políticas sociais, claramente assistencialistas, "uma rede de proteção social com objetivos claros de promoção social" distorcida com fins políticos pelo governo Lula, na definição dos tucanos, que forçariam o aumento da carga tributária e impediriam o crescimento econômico vigoroso do país, segundo os liberais. O aumento da arrecadação federal de 10%, entre janeiro e outubro deste ano, reforça a posição da oposição de que a CPMF pode ser extinta imediatamente. Só a CPMF rendeu ao governo no mesmo período 10% a mais do que no mesmo período do ano passado. Foi o ex-ministro da Fazenda e atual deputado federal Antonio Palocci quem definiu a próxima campanha presidencial como sendo a de um governo com programa, mas sem candidato, contra a oposição sem programa, mas com candidato. Mesmo que as bandeiras principais desse programa tenham sido quase todas "roubadas" da oposição, como as políticas sociais, a estabilidade fiscal, o controle da inflação e o crescimento econômico. São hoje bandeiras do governo Lula por culpa exclusiva dos tucanos, que não assumiram a defesa das reformas estruturais do Estado que começaram a realizar no governo de Fernando Henrique, especialmente as privatizações, como ficou demonstrado na campanha presidencial do ano passado. O PSDB tem os dois presidenciáveis, em tese, favoritos para a disputa presidencial de 2010, os governadores José Serra, de São Paulo, e Aécio Neves, de Minas Gerais, e precisaria firmar sua atuação política para voltar a ser uma alternativa a nível federal, sem limitar sua força ao nível regional. Mas a perspectiva de uma vitória faz com que os governadores tendam a apoiar a prorrogação da CPMF. Será uma derrota política grande se alguém da oposição votar a favor da prorrogação da CPMF com objetivos políticos a longo prazo. O PSDB corre o risco de perder sua identidade, hoje já não tão nítida, e perder, em conseqüência, a eleição presidencial. |
Entrevista:O Estado inteligente
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