O Globo |
6/11/2007 |
O embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, secretário-geral do Ministério das Relações Exteriores, justificou ontem, de maneira indireta mas muito enfática, a chamada "democracia plebiscitária" em curso em alguns países da América do Sul, especialmente a Venezuela. Falando para uma platéia lotada na Universidade Ricardo Palma, em Lima, na conferência da Academia da Latinidade, ele fez uma análise histórica da democracia na região, chegando à conclusão de que a grande influência econômica sobre o processo político dificulta a participação das camadas excluídas da população, o que causa grandes tensões sociais e faz com que surjam iniciativas "para transformar o sistema político, para dar mais voz às camadas excluídas da população, através de referendos, plebiscitos, para que participem efetivamente do sistema politico". Ele foi contestado, também indiretamente, pelo secretário-geral da Academia, o cientista político brasileiro Candido Mendes, que defendeu a tese de que a democracia será mais profunda quando respeitar o trinômio "direitos humanos, minorias e pluralismo". E também pelo ministro das Relações Exteriores do Peru, José Antonio Garcia Belaúnde, que disse que adjetivar a democracia como "popular" ou "plebiscitária" era "cair na tentação dos atalhos" diante do processo democrático, que é mesmo demorado. Para Pinheiro Guimarães, "as dificuldades que muitos governos democráticos têm para resolver o grande problema das sociedades, que é a fragmentação social, é algo que prejudica permanentemente a vitalidade da democracia". A influência do dinheiro nas campanhas eleitorais, cada vez mais caras, transforma a democracia, segundo o secretário-geral do Itamaraty, "em plutocracia, o governo do dinheiro, através de seus representantes, aqueles que são eleitos para votar. Isso cria permanente tensão, enorme tensão política e social". Ele justifica a convocação de plebiscitos e referendos como uma maneira de fazer os excluídos participarem do processo político, o que não acontece, na sua opinião, apenas no ato de votar a cada quatro ou cinco anos: "Uma coisa é votar, outra é participar do sistema político". Para ele, o problema é descobrir "que tipo de democracia é necessário para enfrentar a maior inimiga da democracia, que é a divisão social". Samuel Pinheiro Guimarães diz que, com a influência do dinheiro nas campanhas eleitorais, "alguém pode se eleger presidente com grande maioria, mas tem que enfrentar o processo legislativo para elaborar os programas. Então há uma enorme dificuldade". A visão do processo eleitoral revelada por Samuel Pinheiro Guimarães em sua fala de abertura surpreendeu a muitos. O sociólogo argentino Torcuato di Tella disse-lhe depois, rindo, que nunca vira um diplomata ser tão antidiplomático em público. Segundo Pinheiro Guimarães, como a maioria da população de qualquer país sabe o que quer, "o discurso dos candidatos têm que ter uma retórica populista, porque, se não, não receberá votos. Tem de ter um discurso distributivista, a favor da saúde, da educação, e assim por diante, do contrário não será jamais eleito". A questão, segundo ele, é que, após eleitos com esse discurso, "têm que enfrentar a outra face do poder, que é o Congresso, os parlamentos, onde estão representados os interesses dos setores. No meu país, por exemplo, há uma bancada ruralista; há uma bancada dos donos de hospitais; assim por diante, que estão lá para defender os interesses de setores, há uma bancada sindicalista". Na análise do secretário-geral do Itamaraty, uma característica do processo de desenvolvimento da América do Sul é a exclusão social, a partir da escravidão, dos africanos e dos povos indígenas originários, no Brasil e nos outros países, "o que gerou uma fratura social, um processo muito forte de exclusão, que corresponde a um processo de concentração de poder político e econômico enorme em todos os países da América do Sul". Ele vê essa concentração de poder econômico e político como um problema do ponto de vista da democracia. "Como se dá o processo de transformar o poder econômico em poder politico?". Na sua concepção, no Brasil, a questão era resolvida de forma censitária: votavam no sistema politico os que tinham o poder econômico. "Isso tornava mais fácil a elaboração da legislação que vai disciplinar a vida em sociedade, tanto do ponto de vista econômico quanto do ponto de vista cultural", comentou. Com a ampliação do voto para os analfabetos, esse controle ficou mais difícil, e Pinheiro Guimarães atribui aos meios de comunicação o papel de controlar os excluídos "pela distração". Segundo ele, hoje "todo esforço é pelo culto da personalidade, não política, mas desportiva, do mundo da moda, do mundo artístico. Há todo um esforço de desmobilização da massa, então se discute onde vai ser a Copa do Mundo, o que fez uma grande artista de televisão. No Brasil, todos sabem o nome da filha de Xuxa, que é Sasha". Samuel Pinheiro Guimarães atribuiu "à mídia", essa entidade mítica que atormenta o governo Lula, a tarefa de "permanentemente desmobilizar a população, o que permite essa conformação, esse controle". Segundo ele, "o que ocorre na América Latina está estreitamente vinculado ao que acontece no mundo, não há como separar as coisas. O que ocorre na América Latina é resultado de um processo histórico e da participação da região num processo econômico e sobretudo político internacional. O que ocorre hoje é um processo entrelaçado com o que ocorria no passado". |
Entrevista:O Estado inteligente
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terça-feira, novembro 06, 2007
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