Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, novembro 06, 2007

A linguagem que Chávez entende



editorial
O Estado de S. Paulo
6/11/2007

O senador José Sarney não tem usado meias-palavras para se referir ao regime que o coronel Hugo Chávez está implantando na Venezuela. Para ele, a democracia de Chávez é uma “marca de fantasia”. De fato, um regime que permite a perenização do caudilho no poder, priva as minorias e a oposição das liberdades fundamentais e permite que o país seja governado sem que as necessárias garantias legais estejam em funcionamento é uma autêntica ditadura. Da mesma forma, um país que se arma até os dentes, sem que haja razões plausíveis para tal, constitui uma ameaça para seus vizinhos, por mais que o caudilho fale em fraternidade e solidariedade latino-americana.

Tivesse o coronel Hugo Chávez ficado na compra dos 100 mil fuzis Kalashnikov e se poderia acreditar que seu objetivo era, simplesmente, defensivo. Ou que ele, pensando em ficar no poder indefinidamente, estava armando milícias para impor o seu despotismo aos venezuelanos que não abdicaram de ser livres.

Mas o coronel está gastando cerca de US$ 6 bilhões na compra de aviões de ataque de grande performance, de helicópteros de combate, de navios de desembarque de tropas, de submarinos e de baterias de mísseis. Com esse tipo de equipamento não se mantém nem se restabelece a ordem interna, qualquer que seja. Além disso, o programa de aquisições militares de Chávez não se esgota com as encomendas que fez recentemente na Rússia. Há planos para a compra de novos e modernos equipamentos que podem ser utilizados em operações que os militares classificam de “projeção de poder” - como, por exemplo, mais 120 aviões de combate de última geração.

O coronel Hugo Chávez, que esta semana se tornou ditador (perpétuo) constitucional da Venezuela, com a aprovação de uma constituição liberticida, prepara-se para uma aventura militar. O general Alberto Müller Rojas, que assessorou Chávez na elaboração dos planos militares, garante que a Venezuela não está iniciando uma corrida armamentista e que não conta com recursos militares para se constituir em ameaça ao Brasil. Mas não é apenas o Brasil que é afetado pelo armamentismo chavista. É o equilíbrio estratégico de toda a região que é alterado.

É tão absurdo supor que as forças venezuelanas invadiriam o Brasil como não tem sentido imaginar que os Estados Unidos invadirão a Venezuela, simplesmente porque o coronel Chávez acha que o presidente Bush exala enxofre. Mas foi o próprio Chávez quem disse que poderá intervir militarmente na Bolívia, para sustentar o regime de Evo Morales, e é perfeitamente possível que venha a ocupar a região do Essequibo, na Guiana. Quanto à Bolívia, não se pode esquecer que está em vigor um tratado que permite à Venezuela manter bases militares em território boliviano; e que os helicópteros e aviões que Morales usa em seus deslocamentos são venezuelanos, como também o são os seus guarda-costas. E, desde que assumiu o poder, Chávez pôs o olho gordo no Essequibo, que considera território integrante de seu país, ilegalmente sob a soberania da Guiana.

Uma aventura militar nas nossas fronteiras obrigaria o governo brasileiro a uma enérgica tomada de posição - que não poderia se restringir a condenações retóricas nos foros diplomáticos multilaterais.

O ministro da Defesa, Nelson Jobim, nega que o governo brasileiro esteja preocupado com o que se passa na Venezuela. Noblesse oblige. Mas o fato é que nem o governo Lula, que há mais de quatro anos tem demonstrado uma incompreensível tolerância em relação às extravagâncias do caudilho Chávez, pode ignorar os efeitos políticos que a aceitação de uma ditadura no Mercosul causará nos meios internacionais - uma vez que isso significaria rasgar a Cláusula Democrática, coonestando um regime de exceção. O governo brasileiro também não poderá deixar de considerar que, a persistir o estado de sucateamento de nossas Forças Armadas, não disporá de nenhum recurso efetivo para dissuadir o coronel Chávez de suas veleidades expansionistas.

O Brasil não conterá o caudilho com palavras suaves e chamados à razão. Chávez só entende uma linguagem. Fará bem o governo brasileiro se, como foi anunciado há dias, acelerar o programa de reaparelhamento das Forças Armadas, dotando-as rapidamente dos meios necessários para a defesa nacional.

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