Entrevista:O Estado inteligente

sábado, novembro 10, 2007

FERNANDO GABEIRA

O avanço do mar

A SEMANA veio em ondas. Comecei nas praias da área metropolitana de Recife. O mar tem avançado nas quatro cidades que visitei. Não se pode dizer que seja o aquecimento global, mas tudo que aprendermos ali pode nos ajudar no futuro. Daí nosso esforço de aprender com os holandeses.
Espero um dia ver soluções mais permanentes. As tentativas improvisadas de proteção já foram desfiguradas pelo avanço do mar. No avião, tive de me ajustar ao debate da semana: prostituição. O projeto de legalização rolava havia cinco anos. Fiquei surpreso com sua entrada na agenda. Era aproveitar a chance, embora, no fundo, fosse pessimista quanto ao resultado. Se a esperada derrota viesse, que pelo menos fosse o mais pedagógica possível.
A Copa do Mundo na Alemanha não só levou muitos brasileiros para lá como suscitou reportagens aqui sobre a prostituição legalizada. Novelas também, à sua maneira, levaram a pensar sobre o tema.
Tudo isso ajuda, mas a verdade é que, de lá para cá, a correlação de forças mudou. Há sempre os mesmos apelos para a família, religião, mas a tese abolicionista ganhou um pouco mais de corpo. Agora, colocam o fim da prostituição como um objetivo. A seu favor, informo que nenhum deles chegou a determinar um prazo.
Houve quem comparasse o tema com tráfico de órgãos, cuja existência não implica em tolerância. O único tráfico de órgão que associo à prostituição é a orelha de Van Gogh. Mesmo assim, aquilo foi uma doação.
Mas houve também muitos argumentos que precisam ser levados em conta, como um balanço real das experiências na Holanda e na Alemanha -e agora na Austrália. É preciso mais proximidade com os grupos que lutam contra a prostituição infantil para articular com leis que vêm de uma comissão que estudou o assunto.
Os discursos por aqui deixam sempre no ar a hipótese de um limite até onde a maioria pode chegar. É preciso encontrá-lo, construí-lo com cuidado. Estamos numa maré bem conservadora, o que significa mais trabalho e aplicação para resultados modestos.
Um projeto desse tipo, ideal para a demagogia de alguns adversários, nos faz relembrar a delicadeza de remar contra a maré.
O mar continua avançando nas praias do Nordeste. Pelo menos aí, na proteção contra o mar, espero aprovação para uma saída holandesa.
A semana foi apenas o que os aviadores chamam de janela -um momento para voltar aos projetos permanentes.
Sinais da crise na aviação, turbulências no campo energético. O fluxo dos acontecimentos vai nos dar uma nova folga?


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