Entrevista:O Estado inteligente

segunda-feira, novembro 05, 2007

Falsa expectativa- George Vidor

5/11/2007

A Petrobras tem boa dose de responsabilidade por essa mini crise de abastecimento de gás natural porque criou uma falsa expectativa ao anunciar, logo depois da descoberta do campo de Mexilhão, que haveria um salto considerável na produção nacional em prazo relativamente curto. O anúncio foi precipitado, pois os testes posteriores não revelaram a vazão prevista.

E somado a isso veio o conflito com a Bolívia, que inviabilizou investimentos programados pela estatal brasileira no país vizinho.

A Bacia de Santos certamente será no futuro uma grande produtora de gás natural. Mas isso dependerá do desenvolvimento de campos descobertos em águas profundas e ultra profundas, bem distantes da costa do Rio e de São Paulo, para os quais será necessário vencer desafios tecnológicos.

Na melhor das hipóteses, essa produção começará a se concretizar em meados da próxima década, quando o Brasil já terá realizado sua Copa do Mundo de futebol (e quem sabe se preparando para sediar uma edição dos Jogos Olímpicos).

Até 2010, é esperado algum incremento de produção por conta do campo de Golfinho no norte do Espírito Santo e das novas plataformas que entrarão em operação na Bacia de Campos. Mexilhão continua sendo uma incógnita. Os 15 milhões de metros cúbicos diários que tinham sido anunciados são por enquanto passarinhos voando. O que se tem garantido mesmo é uma vazão de quatro milhões de metros cúbicos, e mesmo assim, para se assegurar viabilidade econômica ao investimento, o campo receberá reforço de poços abertos em campos vizinhos, já na parte do litoral do Rio.

A Petrobras tentou, de todas as maneiras, montar às pressas um sistema baseado na importação de gás natural liqüefeito (GNL). Embora custe muito caro, essa seria mesmo a melhor saída, se houvesse oferta de GNL disponível no mercado mundial. Mas não há. Quando ficar pronta a primeira unidade flutuante conversora de gás natural arrendada pela Petrobras (que ficará ancorada na Baía de Guanabara), a Petrobras terá de comprar GNL no mercado livre, pois pelos próximos dois anos os produtores estão comprometidos com contratos de longo prazo assinados antes de 2005. E ainda assim enfrentará dificuldade para encontrar transportadores de GNL.

Ou seja, nessa altura do campeonato o cenário que está vigorando é o religioso. São Pedro precisa voltar a colaborar com chuvas suficientes para encher os reservatórios e evitar que o preço da energia gerada em hidrelétricas continue a subir (essa foi realmente a razão de as termoelétricas que queimam gás terem sido agora acionadas, causando o desequilíbrio no abastecimento dos demais consumidores).

Esse problema não estaria acontecendo se no final do governo Fernando Henrique ou no início do primeiro mandato do presidente Lula as autoridades tivessem tomado a decisão de retomar as obras de Angra 3. A usina estaria no momento quase pronta e em condições de gerar 1.350 megawatts, energia equivalente ao que as térmicas a gás estão injetando no sistema interligado.

Políticos costumam fugir desse tema como o diabo da cruz, mas o governador Sérgio Cabral parece disposto a alimentar a polêmica e enfrentar críticas ao manifestar publicamente preocupação com o descompasso entre as taxas de crescimento demográfico nos diferentes estratos sociais da população do Rio e do país. Embora as pesquisas do IBGE revelem uma contínua queda nos índices de fecundidade das mulheres brasileiras, a análise dos números por nível de renda ou escolaridade ainda revela enorme distância das taxas de crescimento demográfico entre os mais pobres e os mais ricos.

No caso da cidade do Rio, por exemplo, enquanto a população mais pobre que vive em favelas cresce a um ritmo estimado de 2% a 2,6% ao ano, nas camadas mais ricas esse índice é de 0,3% ao ano. Então a diferença é de sete a oito vezes, o que não é nem um pouco desprezível. Para que esses índices convirjam para a média, além das iniciativas nas áreas de educação e melhoria de renda (cujos efeitos são mais de longo prazo), programas de planejamento familiar voluntário com apoio oficial são fundamentais.

Até porque a média esconde fatos alarmantes, como é o caso da gravidez precoce (a única faixa etária em que houve aumento da taxa de fecundidade no Brasil foi a das mães adolescentes). Entre as adolescentes que compõem a faixa de renda dos 10% mais pobres da população, o número de meninas e moças que engravidam chega a ser de 150 por mil. Na faixa de renda dos 10% mais ricos, essa relação cai para 10 por mil. A diferença é de 15 vezes!

Então não adianta tapar o sol com a peneira e cabe aos políticos, sim, enfrentar essa difícil questão, com toda as suas implicações morais, éticas, religiosas e econômicas.

Entre o risco hipotético de inflação e o risco concreto de a economia americana entrar em parafuso, o Federal Reserve ficou com a segunda opção e baixou os juros básicos nos Estados Unidos. Uma lição que o Comitê de Política Monetária (Copom) deveria considerar em suas próximas reuniões aqui no Brasil, quando estará diante também de um risco hipotético de inflação e de uma bomba relógio que vem sendo armada pela valorização excessiva do real.

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