Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, novembro 13, 2007

Escassez de energia



editorial
O Estado de S. Paulo
13/11/2007

Antes de entrar na Opep e convencer os parceiros a vender petróleo mais barato aos países pobres, cumprindo previsão do presidente Lula, promovido a xeque honorário por seu colega venezuelano, o Brasil terá de conseguir energia suficiente para mover a própria economia e sustentar um crescimento em torno de 5% ao ano. Não será uma tarefa simples. O País dependerá do gás até 2010 para garantir a produção de eletricidade, segundo projeção do governo, mas o gás continuará escasso pelo menos até 2011, de acordo com o consultor Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura (CBIE). Na previsão mais otimista divulgada nos últimos dias, a oferta de gás poderá ultrapassar a demanda já em 2010, mas isso dependerá das chuvas e do ritmo de execução de projetos de hidrelétricas.

Mais escaldados e menos dispostos a confiar na sorte, executivos da indústria preferem pensar em alternativas, como a geração de energia para uso próprio, ou congelam planos de expansão de suas indústrias.

Empresários do Pólo Cerâmico de Santa Gertrudes, no interior paulista, anunciaram a suspensão de investimentos enquanto esperam sinais mais claros de como ficará o suprimento de gás. A produção de cerâmica de revestimento vinha crescendo 10% ao ano, para atender aos mercados interno e externo. Também os produtores de vidro estão diante do risco de ficar sem um insumo essencial à sua atividade.

Simplesmente não há gás suficiente para as indústrias, para os táxis e para as termoelétricas, acionadas quando as hidrelétricas deixam de produzir a energia necessária por falta de chuva ou por qualquer outra dificuldade. Na semana passada, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva referiu-se ao miniapagão ocorrido poucos dias antes como um “probleminha” de gás no Rio de Janeiro.

Talvez fosse um “probleminha” para ele, mas não para a indústria com planos de investimento nem para os motoristas encorajados, tanto quanto os industriais, a usarem o gás natural em suas atividades. O encorajamento partiu do próprio governo federal e da Petrobrás, embora representantes da empresa e do Ministério de Minas e Energia tenham negado isso na semana passada. O Estado reproduziu no domingo palavras do atual presidente e então diretor-financeiro da Petrobrás, Sérgio Gabrielli, em 2003, sobre a meta de expansão do consumo de gás.

Exibindo muito otimismo, a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, anunciou na semana passada a confirmação de uma enorme reserva de petróleo e gás na Bacia de Santos. Embora tenha escalado a ministra para o primeiro anúncio da descoberta da reserva de Tupi, no Brasil, o presidente Lula acabou levando a sério as brincadeiras do colega venezuelano Hugo Chávez e admitiu a ambição de entrar na Opep e “brigar para baixar o preço” do óleo vendido aos países pobres. Mas a reserva descoberta na Bacia de Santos não resolve nenhum problema imediato.

Neste momento, o governo brasileiro tem de batalhar para garantir o abastecimento de gás - e um dos passos é a nova negociação com as autoridades bolivianas. A Bolívia precisa do Brasil como cliente e como investidor, mas o presidente Evo Morales continua a ditar, até com arrogância, os termos do jogo. O presidente Lula não só aceita reiniciar os investimentos e trabalhar pela industrialização da Bolívia, como ainda se dispõe a fazer tudo isso sem cobrar maiores garantias.

Que proteção terá o Brasil contra novos sustos na Bolívia? A essa pergunta, o assessor para Assuntos Internacionais da Presidência, Marco Aurélio Garcia, respondeu na semana passada: “As mesmas garantias que temos hoje e que não foram descumpridas em nenhum momento.” Tomada ao pé da letra, essa resposta indica a disposição do governo brasileiro de aceitar a repetição da experiência recente, quando o governo boliviano não se contentou com estatizar a riqueza mineral de seu país. Tomou instalações da Petrobrás pelas armas, desapropriou investimentos, arbitrou sem resistência um ridículo valor de indenização e acusou a empresa de violar as leis do país. Se dessa disposição depende a segurança energética do Brasil, é melhor cada um pensar nas próprias alternativas - incluída a acumulação de um estoque de velas.

Arquivo do blog