Entrevista:O Estado inteligente

sábado, novembro 10, 2007

Brechas e chicanas Zuenir Ventura

Para uma instituição como a Justiça, que já não goza dos favores da opinião pública, episódios como os ocorridos recentemente só pioram essa má impressão. Em poucos dias, ela sofreu afrontas e foi acintosamente desafiada por atitudes e gestos que não só comprometem a sua imagem como aumentam a descrença em relação à sua eficiência. Primeiro, foi o deputado e ex-governador Ronaldo Cunha Lima, réu confesso de um homicídio, a praticar o que o ministro do STF Joaquim Barbosa classificou de “escárnio para com a Justiça brasileira” (e que, para o senador Arthur Virgílio, “mostra o espírito grandioso” do colega tucano). Como deputado, Cunha Lima tinha direito ao foro privilegiado e, para escapar de uma eventual condenação, renunciou espertamente ao mandato às vésperas de ser julgado. Um deboche à nossa Suprema Corte, claro, mas da parte dela também uma lentidão absurda, pois chicanas e brechas na lei permitem empurrar com a barriga um processo por doze anos. Por meio da reação de alguns juízes, o próprio STF está procurando reverter a situação para tentar até produzir uma inédita condenação de autoridade.

Outro caso menos grave mostra como a nossa fama corre o mundo. Um dos três executivos de bancos suíços presos por evasão de divisas disse para o policial que o levava: “Quem tem dinheiro nesse país não fica preso.” O agente respondeu algemandoo, mas sabendo que ele tinha razão. O Rio não poderia estar fora, e compareceu a essa mostra com o episódio de maior estardalhaço: a libertação, com direito a comemorações com fogos de artifício, de 43 PMs acusados de envolvimento com o tráfico de drogas. O comportamento chocou a sociedade e irritou o governador Sérgio Cabral, que o classificou de “lesivo e desrespeitoso”. Há contra os suspeitos inúmeras gravações e outros indícios. Mas, para mandar soltá-los, o juiz alegou que a denúncia do Ministério Público não discriminava a atuação de cada policial nos crimes de que são acusados, como se a descrição de todos não valesse para cada um. O procurador-geral do MP, Marfan Vieira, reagiu classificando de “preciosismo jurídico” a decisão: “Ora, se os 43 PMs tiveram a mesma conduta, é preciso repetir 43 vezes a mesma coisa?” Além da festiva provocação, os PMs saíram ameaçando processar o estado por danos morais e materiais. Por essas e outras é que o deputado Paulo Maluf diz confiar na Justiça brasileira, que “é justa e séria”. Ele próprio está aí solto, apesar dos 30 processos de evasão de divisas, formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, corrupção passiva e improbidade administrativa. Maluf talvez não pense o mesmo do Judiciário americano, do qual é fugitivo. Se pisar nos EUA, será preso.

Parece que lá a impunidade não tem vez. Que o diga o casal de bispos, os Hernandez.

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