Além do batalhão de mulatas que sempre aparece nessa hora, faltava Pelé na festa em Zurique. Por falta de espaço na comitiva (e para dispensar a turma de explicar-se em casa), a CBF não levou à Suíça a evidência morena de que não há mulher mais sensual que a nascida aqui. Por falta de convite da CBF (e para deixar claro que quem manda nos terreiros da bola é Ricardo Teixeira, presidente da entidade), o maior jogador de todos os tempos ficou fora da lista de convidados para o carnaval temporão na Suíça.
Onde está Pelé?, espantou-se o francês Michel Platini. Onde está Pelé?, intrigou-se o alemão Franz Beckenbauer. Todos os gênios da bola repetiram a pergunta, amplificada em centenas de idiomas, dialetos e sotaques por milhões de torcedores perplexos. Se ali se comemorava a escolha oficial do anfitrião da Copa do Mundo de 2014, seria lógico exibir como estrela da festa o craque incomparável, o Atleta do Século 20, o maior dos deuses dos estádios, o único brasileiro conhecido (e venerado) em todo o planeta.
Como o Brasil não é lógico, os festeiros de Zurique decidiram que a interrogação coletiva nem merecia resposta. Além de Ricardo Teixeira, presidente do País do Futebol, sorriam no desfile na Suíça o presidente da República, ministros de Estado, a ala suprapartidária de governadores, os campeões mundiais Romário e Dunga e outros passistas. Estava lá, portanto, a pátria de chuteiras.
Se houvesse adversários a vencer, Teixeira decerto pediria socorro a Pelé: todas as disputas organizadas pela Fifa, nos gramados ou em salas com ar-condicionado, recomendam times formados por nativos bons de bola. A candidatura única permitiu ao chefão da CBF manter fora de campo (e longe da festa) o Rei Pelé. A seleção só incluiu brasileiros bons de conversa.
A equipe convocada para esse jogo de palavras não precisava golear ninguém. Bastava driblar as dúvidas derradeiras do suíço Joseph Blatter, presidente da Fifa. Já no primeiro minuto, Ricardo Teixeira matou no peito a fantasia de que o país anda muito perigoso. Passou a bola para Lula, que bateu de trivela: "Vamos fazer uma Copa pra argentino nenhum botar defeito", mirou no ângulo o meia-direita do timaço da Granja do Torto.
Um tanto aturdido com o estilo ofensivo da equipe brasileira, Blatter limitou-se a ressalvas ligeiras. O Maracanã, balbuciou, precisa de reformas profundas. Não precisa, devolveu de bico o governador Sérgio Cabral, para quem bastam alguns retoques para deixar novinho em folha o estádio que, até recentemente, o zagueirão Teixeira planejava implodir.
Blatter também registrou que um trem-bala ligando o Rio e São Paulo será muito bem-vindo. Confrontados com o desafio, o fluminense Cabral e o paulista José Serra exibiram o sorriso de quem só espera o apito do maquinista para erguer um brinde à viagem inaugural. Mas ambos sabem o que Blatter ignora: na melhor das hipóteses, o trem-bala entrará em operação só em 2015, um ano depois da Copa.
Deus, como todos sabemos, é brasileiro. Também é provável que o Pai se tenha comovido com a mobilização nacional para transformar o Filho no Corcovado numa das maravilhas modernas. Mas nem quem construiu o mundo em sete dias poderá construir em sete anos um trem-bala no Brasil.
[ 07/11/2007 ]